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Universidade Federal de Goiás
Sandramara no Pensar Direitos Humanos

Seminário destaca necessidade de se rebelar contra injustiças

Em 13/09/19 16:04. Atualizada em 13/09/19 17:11.

Abertura de seminário e simpósio discutiu cidadania e resistência política em tempos de ameaças a direitos

 

Gustavo Motta

O auditório da Biblioteca Central da Universidade Federal de Goiás (BC/UFG), localizada no Câmpus Samambaia, recebeu na última quarta (11) a programação inicial do X Seminário Internacional Pensar Direitos Humanos e da quinta edição do Simpósio da Faculdade de Ciências Sociais (FCS), eventos independentes que estão ocorrendo conjuntamente neste ano. A mesa de abertura, composta por representantes dos dois encontros acadêmicos e de organizações parceiras, deu início às atividades que se estendem até essa sexta-feira (13).

A mesa de abertura contou com a participação da diretora da FCS/UFG, Izabela Maria Tamaso, e da coordenadora do Programa de Pós-Graduação Interdisciplinar em Direitos Humanos (PPGIDH/UFG), Helena Esser dos Reis, juntamente com o vice-coordenador, João da Cruz Gonçalves. A banca foi complementada com a participação do professor Ulisses Terto, que faz parte da comissão organizadora local, e do coordenador do Programa de Pós-Graduação em Sociologia, Dijaci David de Oliveira.

Representando entidades parceiras, a banca de abertura foi composta por dois juristas - a professora do Instituto Brasiliense de Direito Público, Eduarda Toscani, e o diretor da Ordem dos Advogados do Brasil (Seção de Goiás), Roberto Serra. A mesa também contou com a participação da Vice-Reitora da UFG, Sandramara Matias Chaves, que parabenizou a comunidade acadêmica envolvida na realização do evento e o intuito de se discutir Direitos Humanos na atual conjuntura do país.

Sandramara no Pensar Direitos Humanos
Diante de auditório lotado, Vice-Reitora Sandramara Matias Chaves (detalhe à esquerda): "governos passam e a Universidade fica" (Fotos: Carlos Siqueira)

Mesa

“Existe uma esforço pela precarização do ensino público superior, no entanto, é importante frisar que governos passam e a Universidade fica”, apontou a Vice-Reitora. Destacando o papel da UFG na promoção da cidadania, Sandramara pontuou: “Em 2008 fomos os primeiros a criar políticas de inclusão, e contamos atualmente com uma resolução pioneira no combate ao assédio moral, sexual, violência e todas as formas de preconceito”, afirmou, se referindo à Resolução do Conselho Universitário (Consuni) 12/2017.

“Defendemos a liberdade de opinião, expressão, e a liberdade de cátedra”, destacou o professor Ulisses Terto, se referindo ao princípio que assegura a pluralidade de ideias no âmbito das discussões acadêmicas e a autonomia de pensamento e expressão nas instituições de ensino. Representando a organização responsável pelo Simpósio da FCS/UFG o professor Luiz Mello de Almeida perguntou ao público presente quem não fazia parte da comunidade universitária, o que resultou em poucas pessoas levantando as mãos. 

“Nós precisamos quebrar nossa bolha acadêmica e trazer as pessoas à Universidade, pois grande parte da sociedade desconhece o que se produz e se discute aqui”, alertou, frisando que, em especial, os Direitos Humanos precisam ser abordados em todos os espaços públicos. “É conjuntamente com toda a sociedade que precisamos buscar soluções para os problemas socioeconômicos que privam as pessoas de ter acesso aos seus direitos”, adicionou o professor Dijaci de Oliveira.

Desigualdades

Em seguida à mesa de abertura, foi realizada uma conferência com o nome “Macroprocessos e Microrresistências: Direitos Humanos em tempos neoliberais e anti-humanistas” com a participação da professora Luciana de Oliveira Dias, que faz parte do grupo docente do PPGIDH, e o convidado Sólon Annes Viana, professor pela Universidade do Vale do Rio dos Sinos (Unisinos), no Rio Grande do Sul. “Essa é uma Instituição extremamente inclusiva e a diversidade está bem representada nesse espaço”, observou Luciana, se referindo ao público. 

“No entanto, eu ainda sonho com o dia em que as mesas de eventos em ambientes acadêmicos também reflitam a mesma diversidade”, refletiu, recebendo aplausos da plateia. Isso porque, embora a abertura tenha contado com a participação de oito pessoas, nenhuma delas era negra. Assim, Luciana Dias apontou que o Brasil é um país marcado por desigualdades sociais, sendo que as populações que mais sofrem com a ausência de direitos, como o não-acesso à educação superior, são majoritariamente negras e periféricas.

Riscos

“O atual cenário político do país acentua essas desigualdades e coloca o acesso a direitos sob risco”, alertou. Nesse sentido, a professora elencou três medidas do atual governo que ameaçam a garantia dos Direitos Humanos no Brasil. “Primeiramente, elenco aqui o Projeto de Lei Anticrime, que propõe alteração no Artigo 23 do Código Penal” apontou, citando uma das 14 mudanças em legislação propostas pelo projeto apresentado em fevereiro pelo Ministro da Justiça, Sérgio Moro.

Luciana Dias acredita que essa alteração pode permitir que sanções penais aplicadas a policiais sejam atenuadas. “Isso atinge especialmente a população negra, pobre e periférica das grandes cidades, que lida diariamente com abusos de autoridade e práticas de violência policial”. Além disso, a convidada teme que as discussões atuais sobre flexibilização quanto ao uso de armas, junto com a manutenção da atual política de enfrentamento às drogas possam acentuar o quadro de violação dos Direitos Humanos nas periferias.

Outra medida apontada pela professora que pode ameaçar o acesso a direitos - em particular, a formação superior - é a proposta do Ministério da Educação (MEC) apresentada em julho com o nome Future-se, que propõe a captação de recursos privados pelas Instituições Federais de Ensino Superior (Ifes). “Essa entrega das universidades à iniciativa privada pode representar o fim de políticas para inclusão e permanência, o que atinge a população mais pobre”, alertou.

A proposta do MEC é alarmante, especialmente quando políticas de inclusão e permanência são pensadas com objetivo de reparar desigualdades sociais históricas. Na UFG, 75% dos estudantes de graduação são de baixa renda (com renda familiar de até 1,5 salário mínimo por indivíduo), enquanto 54% são negros, conforme dados regionais da V Pesquisa do Perfil Socioeconômico e Cultural dos Estudantes de Graduação das Universidades Federais, realizada pela Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior (Andifes).

“Além dos Projetos Anticrime e Future-se, é perceptível que o atual governo tem enfraquecido o funcionamento de órgãos regulamentadores e demarcadores de terras indígenas e quilombolas”. Entre medidas do Executivo Nacional, está a transferência da responsabilidade por demarcação de terras que pertencia ao então Ministério da Justiça para a atual pasta de Agricultura, Pecuária e Abastecimento, uma ação política que representa o avanço das pautas ruralistas sobre as questões ambientais e os direitos de comunidades originárias e tradicionais.

Luciana Dias
Professora Luciana Dias: Projeto Anticrime, Programa Future-se e demarcação de terras indígenas sob controle de Ministério da Agricultura são medidas de governo que ameaçam direitos

Panorama

Retomando histórias da mitologia clássica e relatos históricos da Europa Ocidental, o professor Sólon Annes Viana destacou a importância da rebelião diante das injustiças - o direito que as pessoas têm de se rebelar. “O universo que move os Direitos Humanos em nosso tempo é formado por pessoas que lutam por igualdade e justiça social”, pontuou. Nesse sentido, o convidado realizou um breve panorama histórico sobre os Direitos Humanos, desde a instituição das repúblicas laicas europeias até o advento do neoliberalismo, no fim do século 20.

“Esse sonho de uma sociedade pautada pelos Direitos Humanos entrou em crise no século passado, especialmente com as Guerras Mundiais”. Enquanto o primeiro conflito (1914-1918) deixou cerca de 9 milhões de mortos, a Segunda Guerra, entre 1939 e 1945, ocasionou a morte de aproximadamente 80 milhões de pessoas, “além de ter nos deixado o trauma do nazi-fascismo, com sua opressão e violação da liberdade e dignidade humana”. Foi diante dessa herança histórica que se formalizou a Declaração Universal dos Direitos Humanos, proclamada em 1948 pela Assembleia Geral das Nações Unidas.

“Atualmente, mais de 70 anos depois, ainda vemos os direitos garantidos por esse documento sendo ameaçados, como no atual cenário político do país”, lamentou, adicionando que tal cenário carrega influência do neoliberalismo, uma tendência originária na década de 1960. “Após assumirem a hegemonia sobre o mundo capitalista, os Estados Unidos perceberam que seu sistema de produção poderia enfrentar uma crise aguda, caso o controle dos trabalhadores sobre as máquinas e o processo de produção não fossem minimizados”.

Assim, o controle do trabalhador sobre seu meio produtivo, ferramentas e a própria carreira têm sido colocados em xeque. No âmbito internacional do neoliberalismo, o professor afirmou que “o Brasil têm perdido o controle sobre suas riquezas, as entregando ao capital estrangeiro e se colocando na condição de colônia”, o que afeta o bem-estar da população, além de privar condições para qualidade de vida e a liberdade dos indivíduos.

Sólon Annes Viana
Sólon Annes Viana: a rebelião contra injustiças é um direito

Fonte: Secom/UFG

Categorias: Direitos Humanos Institucional