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Universidade Federal de Goiás
Histórias escritas com sangue

Machismo contribui para assassinatos de mulheres

Em 20/11/20 11:37. Atualizada em 20/11/20 11:38.

Livro feito a partir de pesquisa realizada na UFG relata lógica patriarcal na solução de assassinatos de mulheres em Goiás entre 1970 e 1980

Kharen Stecca

Uma pesquisa realizada no Mestrado do Programa de Pós-graduação da Universidade Federal de Goiás pela historiadora Neide Barros deu origem ao livro “Histórias escritas com sangue - Uma análise de processos judiciários de assassinatos de mulheres em Goiânia (1970-1984)” lançado recentemente pela editora Brasil Publishing. A pesquisa realizada com a autorização do Tribunal de Justiça de Goiás e apoio do CNPq,  analisa processos judiciais de assassinatos de mulheres nas décadas de 1970 e 1980 em Goiânia, Goiás. Neide Barros foi orientada pela professora Ana Carolina Soares, coordenadora do Grupo de Estudos e Pesquisas em Gênero (GEPEG), da Faculdade de História - UFG.

Neide Barros
Neide Barros escreveu o livro a partir de sua pesquisa na UFG

 

Segundo a autora Neide Barros, o livro fala sobre os movimentos sociais/feministas regionais, de como as instituições do judiciário lidavam com tais questões, e sobre as lógicas patriarcais de um poder masculino, que por meio da violência se apropriava do corpo (através da vida e da morte) das vítimas.  A autora analisou processos criminais (homicídio ou tentativas) arquivados no depósito judicial do Tribunal de Justiça de Goiás. A pesquisa se focou em crimes cometidos por homens contra mulheres. “Era muito comum o homicídio seguido de suicídio, dos casos analisados (foram 14 no total) mais da metade passaram por este processo, mostrando que a masculinidade tóxica e machismo é perigoso e violento contra homens e mulheres”, ressalta a pesquisadora.

Por outro lado, a pesquisa mostra que os maiores apoios das mulheres que sofriam violência eram outras mulheres (considerando que no contexto não havia nenhum tipo de programa de proteção do estado), “em um grande espírito de sororidade”, como ressalta a autora. “Tivemos relatos de irmãs e mães que enfrentaram fisicamente os agressores”, conta.

Outra característica muito comum e que nos remete ao caso Mariana Ferrer, ocorrido recentemente no Brasil, era que o histórico da vítima era colocado em questão durante o processo e o inquérito, como, por exemplo, sua conduta e vida sexual pregressa, considerando uma forma de amenizar e justificar a ação violenta do homem: “Há inclusive o uso de frases como “perdido de amor ele cometeu o crime", numa clara romantização da violência”, afirma Neide.  

Sobre a ação do judiciário ela explica que nenhum dos casos que tiveram acesso chegou a ir a Júri (julgamento típico de crimes dolosos contra a vida) pois o processo era interrompido ou encerrado por causa do suicídio do assassino. “Verificamos que em alguns houve um grande esforço do delegado responsável pela investigação para localizar o criminoso, porém havia mistura de falta de estrutura e de interesse social na solução de tais crimes que tornava tudo mais complicado”, explica. Ela conta que parte dos assassinos fugiam, não eram mais localizados e ficava por isso mesmo. 

“De todos os casos avaliados apenas um deles foi preso, e por outro motivo que não o assassinato. Porém acredito que havia um certo esforço para que houvesse a punição, especialmente por parte da polícia civil. Em alguns casos que o delegado ia atrás, escrevia até para o secretário da saúde para localizar o criminoso hospitalizado, mas mesmo assim não conseguia resolver o caso”, conta Neide.

Avanços

Neide Barros ressalta que infelizmente o número de assassinatos de mulheres ainda é alarmante no Brasil, porém, graças aos movimentos feministas hoje há uma estrutura do Estado (ainda que com falhas) para proteger essas mulheres. Como lugares de acolhimento, delegacias da mulher, lei Maria da Penha, tipo penal do feminicídio. Ou seja, hoje há uma rede de proteção para as mulheres vitimizadas. “ Mas o problema é profundo, toca nas estruturas culturais onde os homens ainda são educados para se sentirem donos dos corpos femininos, e é daí que surge este tipo de violência, não só o feminicídio, mas também o estupro. As leis e organizações são importantes, mas precisamos rever a educação, desconstruindo o machismo. Acredito que o judiciário é fundamental nesta caminhada, porém sem a participação da sociedade através da educação formal (discutindo estas questões na escola) e informal (através das mídias) não iremos resolver o problema”, avalia a autora.

Histórias escritas com sangue

Livro

O livro já foi lançado pela editora Brasil Publishing (Curitiba-PR) e está disponível no site https://aeditora.com.br/. Ainda não há data para lançamento oficial em Goiânia devido a pandemia. Mais informações pelo Instagram @neidecbarros .O livro também estará disponível na livraria Palavrear em Goiânia a partir de dezembro.

Fonte: Secom UFG

Categorias: Humanidades FH