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Universidade Federal de Goiás
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Entrevista com Zeca Baleiro

Em 13/07/10 08:47. Atualizada em 21/08/14 11:45.
Sempre simpático, o cantor e compositor maranhense recebeu a equipe da UFG para um bate-papo sobre vida na estrada, mundo digital, crise fonográfica, e claro, sobre seus 13 anos de carreira

Ousado, Zeca Baleiro gosta de fugir dos clichês. Enquanto todos comemoram 10 anos de carreira, ele lança as comemorações de seus 13 anos no cenário musical brasileiro – o primeiro disco, Onde Andará Stephen Fry?, foi lançado em 1997. Para marcar a data, intensificou seu frenético ritmo de produção: lança, em 2010, dois discos (Concerto e Trilhas), dois livros (Bala na Agulha – reflexões de boteco, pastéis de memória e outras frituras e Vida é um Souvenir Made in Hong Kong – Livro de Canções), um programa de rádio (Biotônico, na rádio UOL) e um musical infanto-juvenil (Quem tem medo de curupira?).

 

Mas a verdade é que os fãs não esperavam menos desse maranhense que lançou 10 discos autorais em 13 anos, participou de diversos discos de outros artistas brasileiros e de projetos no exterior. Simpático, bom de conversa, Zeca Baleiro concedeu, antes do show realizado quarta-feira (30), uma entrevista exclusiva à equipe da UFG. Confira!

 

 

Por Agnes Arato

Fotos: Vinicius Batista

 

Zeca, você é presença constante em festivais pelo interior do Brasil, em shows gratuitos, e em projetos com ingresso a baixo custo, como o Música no Câmpus da UFG. É intencional? Você se preocupa com a democratização do acesso à cultura?

 

Sim, também me preocupo. Eu acho que quando se entra nesse mundo profissional da música, abrem-se muitas portas e possibilidades, e aí se vai fazendo ao longo do tempo as suas próprias escolhas. Tem gente que só toca em casa de espetáculos chiques, tem gente que só toca em locais superpopulares... E eu, na verdade, gosto de transitar entre todos esses espaços, pois acho que ainda que você tenha suas ideologias, seu modo de ver o mundo, sua filosofia, seria mesquinho demais fazer música só para uma determinada classe social, ou um determinado segmento. Eu faço música para a humanidade: quanto mais gente puder ouvir, melhor, não importa se rico ou se pobre, se preto ou se branco. Obviamente eu tenho meu próprio modo de pensar e de ver o mundo do show business. Então, eu faço muita coisa dessa natureza por opção: shows gratuitos, vou muito a rincões do Brasil – e eu sei que muita gente de minha geração não vai – porque há uma disposição minha de fazer isso. Eu gosto disso, desse contato. É óbvio que, com o tempo, você vai ficando mais velho e mais cansado (risos), o ritmo passa a ser outro, e você passa a querer diminuir um pouco a correria. Mas eu gosto disso, e acho importante que o artista faça (esse tipo de projeto) também. A música também tem essa função, digamos, de utilidade pública, e se eu puder atingir mais pessoas por meio de ingressos populares, shows gratuitos, eu acho bacana.

 

 

Tem alguma coisa que você não faça – algum tipo de programa, de evento?

 

Política! Show para político, jingle para político, isso eu jamais faria. Nunca misturei. Quando  fiz foi por militância, por acreditar. Me empenhei na campanha do Lula em 89, contra o Collor. Cheguei a fazer músicas, subi em palco para cantar, mas era uma coisa, à época, completamente espontânea. Não recebi nada, e não aceitaria nada para defender nenhum político. De resto, pode me chamar pra tocar em qualquer lugar que eu vou, com o maior prazer.

 

Você consegue conhecer as cidades onde faz shows?

 

É sempre muito corrido. Além disso, do início da minha carreira para cá, o ritmo se intensificou, as condições em que eu viajo são outras... Havia um tempo em que eu viajava com antecedência, passava dois dias na cidade, mas hoje, com essa crise toda, já não dá: é tudo muito rápido. Viajo num dia, passo som, faço o show, volto e acabo usufruindo menos da cidade, convivendo menos com as pessoas do lugar – que eu acho que é o melhor jeito de você conhecer uma cidade. Mas em Goiânia eu já vim muitas vezes nesses treze anos, e já tive oportunidade de conhecer a cidade, passear, de provar a comida daqui que eu acho maravilhosa. Já estive em outros lugares do interior, em Goiás, em Pirenópolis duas vezes. Então, já tive a oportunidade de conhecer um pouco. Mas não dá pra fazer turismo e trabalhar ao mesmo tempo, é complicado.

 

Você lançou seu primeiro disco em 1997, no ano anterior ao início da grande crise da indústria fonográfica brasileira. Ainda assim, lançou 10 discos autorais nesses 13 anos, e vem aí mais dois, lançados por selo próprio. A crise não o atingiu?

 

Essa coisa da crise do disco já vem sendo decantada há muito tempo. E existe de fato, já que não é só uma crise financeira, tem a ver com avanço tecnológico: ficou muito fácil consumir música. Meus discos estão em muitos sites de busca – o que eu acho normal, mas também acho que o artista tem de se preocupar com a preservação do direito de autor e isso vem sendo bastante discutido, porque o grande patrimônio do artista é sua obra, e se ele der aquilo que produz então não sobra nada para vender. Eu tenho tentado fazer uma coisa meio equilibrada: faço os discos físicos, mas também ponho algumas músicas para download no site. Desse último disco, que é um álbum duplo (O Coração do Homem Bomba) eu botei, do primeiro disco, a música "Toca Raul", e depois outras três músicas do disco dois. Desse próximo disco eu pretendo disponibilizar uma ou duas músicas. Vou jogando nas duas frentes. Agora, pessoalmente, eu quero que o disco permaneça. É claro que é uma coisa muito particular, que é o meu gosto pessoal, de ouvinte, porque eu sou muito apaixonado pelo disco. Eu coleciono vinis até hoje. Tenho essa ligação afetiva com o disco, que vem da minha infância, e não gostaria de ver o disco morrendo... Na verdade acho que não vai morrer e sim virar outra coisa, um nicho de mercado, pois a mágica do disco permanece. E a gente vai sobrevivendo. Eu continuo a vender disco – claro que não mais como antes – mas tem um público comprador, de pessoas geralmente com mais de 30 anos (porque jovens e adolescentes não compram mais) e é para essa gente que continuo fazendo disco.


 

Fale um pouco sobre os livros que você está lançando.

 

Essa foi uma experiência que comecei em 2005, no meu site, em uma seção que se chamava Bala na Agulha. Sempre tive vontade de escrever pequenos artigos, sem maiores pretensões, impressões minhas sobre os assuntos mais variados: futebol, música, literatura, gastronomia... Acumulei vários artigos ao longo desse tempo,e as pessoas começaram a insistir que eu publicasse em livro. A princípio eu resisti, mas acabei aceitando. Demorou porque revisamos cuidadosamente todos os textos e, como a internet é muito dinâmica, às vezes passam alguns erros de pontuação, coisas assim, e eu sou muito chato com isso. Acrescentei algumas coisas novas e estou lançando agora em agosto. O livro vai ter o nome da sessão, Bala na agulha, e o subtítulo é: Reflexões de boteco, pastéis de memória e outras frituras. Porque são reflexões e divagações sobre esses assuntos todos, mas também tem umas memórias sentimentais, memórias da infância, da adolescência, da minha vida no interior do Maranhão e todas essas coisas. E o outro é um songbook, um livro de canções, que vai ser editado pela Universidade Federal de Goiás. É uma seleção de letras minhas, ilustrada por um artista gráfico muito talentoso, que é o brasiliense Roger Mello.

 

Paixão por livros e discos... Zeca, você é um cara analógico?

 

(Risos) Meu coração é analógico. Claro que eu uso as tecnologias que estão por aí. Quem trabalha com música não pode escapar da tecnologia. Por mais que o trabalho seja, na origem, analógico, orgânico, na hora de transpor isso ninguém vai mais trabalhar com aquelas fitas de rolo. Até existem alguns românticos que ainda trabalham com aquilo, que acham que aquele som é inigualável, que tem uma quentura, um calor, que o computador não tem, mas isso é um pouco de romantismo demais... Hoje todo mundo trabalha com tecnologia. Agora não sou um infomaníaco, que quer sempre comprar a última novidade. Não tenho iPhone, estou resistindo! Não quero ter o poder da onipresença, não quero ter de responder email a qualquer hora. É uma escravidão. Não tenho twitter (não me sigam que eu não sou novela), eu quero ter um pouco de paz. Até para compor, porque compor é uma coisa que requer um pouco de introspecção, e o mundo hoje não favorece isso. É tudo pra fora. Então eu não sou um seguidor de todas as tendências, não. Mas também não sou um cara nostálgico: eu uso, mas como eu acho que tem de ser, com limites.

 

Já escreveu um livro, já teve filho... já plantou uma árvore?

Já! (risos) Só faltava o livro!

 

 

Fonte: Ascom/UFG