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Universidade Federal de Goiás
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Políticas para a juventude ainda são um desafio

Em 14/07/10 08:20. Atualizada em 21/08/14 11:45.
Mesa-redonda discutiu a realidade vivida pela juventude brasileira e a formulação de políticas públicas específicas para essa parcela da população

A mesa-redonda promovida pelo Jornal UFG e Rádio Universitária discutiu, em sua última edição, a realidade vivida pela maioria dos jovens brasileiros. Ainda hoje, o Brasil ainda é um país composto majoritariamente por jovens. Segundo dados divulgados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), são mais de 51 milhões de jovens entre 15 e 29 anos e, de acordo com especialistas, essa é a parcela da população mais vulnerável a problemas como desemprego, violência, uso e tráfico de drogas e exclusão social.  Apesar dessa realidade, a formulação de políticas públicas específicas para a juventude parece ainda não haver entrado de fato na agenda governamental.

 

Foram convidados para a discussão o coordenador do Centro de Apoio Operacional da Infância e Juventude do Ministério Público, promotor Everaldo Sebastião de Sousa; o professor da Faculdade de Ciências Sociais da UFG, Flávio Munhoz Sofiati; a diretora do Centro Integrado de Aprendizado em Rede da UFG, Miriam Fábia Alves, e o estudante Paulo Winícius Teixeira de Paula, representando o Diretório Central dos Estudantes (DCE).

 

Quais as demandas recebidas pelo Ministério Público em relação à juventude?

Everaldo de Sousa – Recebemos muitas demandas relacionadas à área educacional, não só no que diz respeito à universalização do ensino, mas também à qualidade desse ensino. Infelizmente, isso se tornou um problema crônico das escolas públicas. Há o problema da evasão escolar, que também é crônico. Em algumas escolas da rede estadual chegamos a ter 60% a 70% de evasão no ensino médio, o que é uma situação alarmante. Há o problema das drogas. Recebemos diariamente, nas diversas promotorias da capital e do Estado, mães e famílias desesperadas ou o próprio jovem buscando um local específico para tratamento. Infelizmente, algumas vezes não encontramos respostas e, às vezes, nem com intervenção judicial nós conseguimos de pronto. Há o problema da inclusão em programas de aprendizado, primeiro emprego. De foram generalizada, o Ministério Público é hoje procurado na busca da implementação dessas políticas. Fico feliz com a discussão sobre a aprovação do Estatuto da Juventude, porque certamente teremos mais um “norte” na busca da implementação desses direitos. Nossa sociedade, e isso é uma questão cultural, há tempos não entende que a simples condição humana já é suficiente para o aferimento de todos esses direitos.

 

Então, só a criação de normas, leis e estatutos não é suficiente?

Everaldo de Sousa – Temos uma Constituição Federal muito descritiva, uma das mais extensas do mundo, que procura descrever com detalhes todos esses direitos. Criamos leis específicas para diversas faixas da sociedade, como os Estatutos da Criança e do Adolescente, do Idoso, e um possível Estatuto da Juventude, como se isso fosse a garantia de que será efetivamente implementado. Muito mais do que de normas, precisamos de uma mudança cultural, no sentido de entender que são direitos caros, são direitos humanos e que devem ser compartilhados por todos. Eu costumo dizer que no Brasil, hoje, nós temos uma condição econômica satisfatória, que não tínhamos algum tempo atrás, mas somos um país rico com a maioria da população pobre. Então, o mais importante nesse contexto é que nós democratizemos oportunidades. Essas demandas que o Ministério Público atende, diariamente, na verdade são mais relacionadas com essa população excluída da qual faz parte a grande massa das nossas crianças, adolescentes e jovens. Os serviços oferecidos, quando o são, são de qualidade bastante duvidosa, não dão uma condição democrática para a competitividade desses jovens na fase adulta.

 

Flávio Sofiati: Creio que as normas são importantes, mas é fundamental que haja vontade política para mudar a realidade. Temos como exemplo o programa criado pelo governo federal e que foi definido como carro-chefe das políticas públicas para a juventude. Refiro-me ao Pró-jovem, que tentava resolver um problema emergencial para depois pensar programas mais eficientes. No processo, ele demonstrou que não era eficiente. O problema é que 53% dos jovens com o perfil definido para o Pró-jovem Urbano, que é uma modalidade do programa, encontram-se nas cidades com até 200 mil habitantes. E o Pró-Jovem Urbano é implementado nas capitais. Isso demonstra uma dificuldade tremenda que o Estado tem na implementação desses programas. Projetos mal formulados e inseridos na sociedade de forma isolada não constituem políticas públicas. O Pró-jovem urbano deveria atender, até 2010, quatro milhões e duzentos mil jovens no Brasil inteiro. No final de 2009, apenas 800 mil haviam sido atendidos. É uma ineficiência do governo. Há também uma disputa entre os ministérios, que não integram os programas. Há uma ineficiência pedagógica no processo de como lidar com a juventude excluída. Grande parte dessa juventude não tem acreditado que esses projetos vão ajudar nas suas vidas, o que provoca uma evasão enorme dos programas.

 

E sobre o programa do primeiro emprego, podemos considerá-lo uma iniciativa interessante?

Flávio Sofiati – Seria, se fosse feito como é estabelecido. Mas o que se vê é que grande parte da juventude vai para esses órgãos para atender telefone, tirar cópia. O primeiro emprego deveria ser o espaço para a formação e qualificação, mas acaba não tendo essa função. Há uma visão de que o jovem não tem competências, tem dificuldade para assumir responsabilidade e isso não é verdade. Toda vez que a juventude é chamada para a ação com condições para que ela se forme, se qualifique, ela tem dado boas respostas.

 

Paulo Winícius – Não é possível fazer política social no Brasil sem investimentos. Defendemos, no movimento estudantil, que, para além de uma lei de responsabilidade fiscal, precisamos de uma lei de responsabilidade social. Deveríamos primeiro investir em saúde, moradia, para depois pensarmos na dívida externa. Temos pessoas morrendo todos os dias. Não é possível manter programas como o Pró-jovem, que tem uma lógica definida de cima para baixo.

 

Miriam Fábia – Nós temos um modelo de Estado que, na hora de escolher entre a sociedade e o capital, escolhe o capital. Para o social resta apenas o que sobra. A escolha primeira do Estado não tem sido o humano. O emprego é um desses dramas atuais. Não temos trabalho para todos. Mesmo que os jovens vivam a experiência do primeiro emprego, se todos tivessem nível superior de primeira qualidade, o que faríamos? Onde trabalharíamos? Não há emprego para todos nós. Com a reestruturação produtiva do capital nas últimas décadas, menos empregos temos. Então, sobra a guerra em torno dos postos de trabalho. O jovem já entendeu. Aquele discurso da mãe de que, se ele não estudar vai ser pobre como ela, já não cola mais. O jovem sabe que ele pode estudar, ter uma boa formação, mas isso não é garantia. Quando o Estado escolhe como prioridade o capital em detrimento do humano, ele vai descobrir o emprego, a segurança e, por isso, teremos o extermínio de pobres no Brasil inteiro.

 

Da esquerda para a direita: o coordenador do Centro de Apoio Operacional da Infância e Juventude do Ministério Público, promotor Everaldo Sebastião de Sousa; o professor da Faculdade de Ciências Sociais da UFG, Flávio Munhoz Sofiati; o estudante Paulo Winícius Teixeira de Paula, representando o Diretório Central dos Estudantes (DCE), e a a diretora do Centro Integrado de Aprendizado em Rede da UFG, Miriam Fábia Alves.

 
Veja o conteúdo impresso no Jornal UFG, aqui.

 

Fonte: Ascom/UFG