Icone Instagram
Icone Linkedin
Icone YouTube
Universidade Federal de Goiás

ARTIGO: Ainda são todos cigarros!

Em 24/07/14 11:47. Atualizada em 24/11/14 14:13.

Logo Jornal

Publicação da Assessoria de Comunicação da Universidade Federal de Goiás 
ANO VII – Nº 66 – Agosto – 2014

Ainda são todos cigarros!

Texto: Renan Neves Urzeda¹, Jane Mary Rosa Azevedo¹, Marcelo Fouad Rabahi ²

Fumar é um vício antigo, assim como o conhecimento das consequências nocivas das inúmeras substâncias presentes no tabaco para o organismo. Durante muitos anos, o tabagismo esteve vinculado a vantagens sociais, romances, aventuras, inteligência e beleza. Um ideal construído e vendido pela Indústria do Tabaco, por meio de propagandas, filmes e celebridades.

Ao longo da história, o que era hábito transformou-se em vício, e inúmeros estudos reforçam os efeitos maléficos à saúde. Fumar se tornou uma ação intolerável e condenável em ambientes públicos, pois provoca problemas de saúde tanto no indivíduo que fuma, quanto no fumante passivo. Várias são as doenças relacionadas ao tabagismo: neoplasias, problemas cardiovasculares, doença pulmonar obstrutiva crônica, alterações da saúde bucal, incapacidades funcionais, imunossupressão e agravamento de doenças infecciosas, entre diversas condições de saúde que culminam na piora da qualidade de vida e na redução dos anos de vida.

Diante do esforço realizado pelas Organizações Governamentais e de Saúde de diversos países, no intuito de conscientizar as populações sobre os perigos do cigarro, o consumo desse produto vem reduzindo e, no Brasil, o número de fumantes segue em queda desde 2006, atingindo 11,3% da população maior de 18 anos, em 2014, segundo o Ministério da Saúde. No Brasil, o governo federal limita o consumo do cigarro por meio de impostos e leis e ampliação do acesso à informação e ao tratamento do tabagismo.

A partir desta situação, em que o cigarro vem sendo duramente combatido, a Indústria do Tabaco tenta se manter lucrativa, por meio de produtos inovadores e desvinculados ao cigarro tradicional, adotando, por vezes, o discurso do auxílio e incentivo à cessação, de forma despretensiosa e irresponsável. Como exemplo dessa política de sobrevivência, encontramos os cigarros eletrônicos.

Tais cigarros são dispositivos que imitam o cigarro tradicional, porém sem a necessidade da queima. Funcionam por meio de uma bateria, um nebulizador e uma lâmpada led que lembra a brasa, liberando doses diversas de nicotina e outras substâncias químicas e produzindo um vapor inodoro e incolor. Esse produto inovador é vendido em diversos formatos, cores e sabores, prometendo auxílio na cessação do ato de fumar, entrega de menor quantidade de nicotina e inofensividade do vapor para o fumante passivo. E é dessa forma que o produto é apresentado pela Indústria Tabaqueira.

Infelizmente, nem todas as promessas estão sendo cumpridas, de modo que a agência reguladora norte-americana Food and Drug Administration (FDA) não aconselha a utilização do cigarro eletrônico, alegando que faltam estudos que comprovem os efeitos das doses de nicotina e outras substâncias presentes nele, além de questionar se existe de fato algum benefício em seu uso como dispositivo auxiliar para a cessação do ato de fumar.

A Indústria do Tabaco aposta na liberação de percentuais menores de nicotina, com cartuchos de diferentes doses, declarando que esse fator é primordial na luta pela cessação, mas se esquece de promover campanhas reais com esse propósito. Pelo contrário, a indústria investe pesado em propaganda e não exerce nenhuma atitude para controle das vendas. Por outro lado, Raquel Grana, cientista da Universidade da Califórnia, já demonstrou que a dosagem de cotinina, produto do metabolismo da nicotina, presente na saliva de indivíduos que fumam, está mais relacionada à quantidade de tragadas realizadas pelo indivíduo, do que aos percentuais de nicotina entregues nos diferentes tipos de cartuchos de cigarros eletrônicos.

Outra questão posta em xeque por estudos científicos é a relação do cigarro eletrônico com o fumante passivo. Fuoco e colaboradores demonstraram, por meio do estudo da concentração e do tamanho de partículas de cigarros tradicionais e eletrônicos no ambiente, que a diferença não foi significativa para a quantidade de partículas exaladas. Fator reforçado pelo estudo de Flouris e colaboradores, que constataram que a quantidade de cotinina sérica em fumantes passivos de cigarros tradicionais e de cigarros eletrônicos também não foi estatisticamente diferente.

A partir da opinião de especialistas e de pesquisas sobre esse produto, é que a Organização Mundial de Saúde planeja classificar os cigarros eletrônicos assim como os cigarros tradicionais, controlando as vendas e propagandas, para evitar que a população seja ludibriada por um novo produto que fornece velhos problemas de saúde.

No Brasil, a comercialização de cigarros eletrônicos é proibida pela Resolução da Diretoria Colegiada, número 46, de agosto de 2009, por considerar a inexistência de dados científicos que comprovem a eficiência e a segurança para o manuseio desse dispositivo. Espera-se que o posicionamento do governo brasileiro resista às investidas da Indústria Tabaqueira e que esse novo produto, de características chamativas e glamorosas, seja envolvido pela realidade de que a nicotina e outras substâncias químicas presentes ainda provocam milhares de mortes, pois, afinal, são todos cigarros.

1 Alunos do Programa de Pós-Graduação em Ciências da Saúde - UFG
2 Professor da Faculdade de Medicina - UFG

 

 

Nesta Edição

Categorias: artigo Indústria do Tabaco tabagismo cigarros eletrônicos

Arquivos relacionados Tamanho Assinatura digital do arquivo
66 P14 PDF 203 Kb 297b874b6e35e579d3edae2b7abea69e