A economia e a vida em tempos de COVID-19
Carta escrita por professores do curso de Ciências Econômicas da UFG sobre a falsa contradição entre economia e a vida
Após as primeiras semanas de isolamento social (a medida concreta adotada pelos governos para diminuir a propagação do corona vírus e seus impactos por recomendação de autoridades de saúde e cientistas nacionais e internacionais) apareceu no debate público uma falsa contradição entre a economia e a vida.
Pressionados por necessidades individuais e pela lógica de mercado, diversos agentes atuam para boicotar esta ação coletiva de proteção de todos, especialmente dos mais vulneráveis. Esse falso trade-off entre economia e vida brota tanto do desconhecimento de todos os agentes sobre a função da economia em uma sociedade, quanto de seus interesses imediatos em um ambiente de pânico que os impedem de enxergar a coletividade em que estão inseridos. Dessa forma, tal contexto gerou um suposto dilema, o de que estaríamos diante de uma escolha entre salvar vidas ou salvar a economia. A verdade é que a economia existe para garantir a vida.
A pandemia atual, assim como outras pandemias vividas no passado (ex. a gripe espanhola em 1918, a gripe H1N1 em 2009) e qualquer crise de ordem natural como uma seca ou um período de chuvas excessivas em determinada região, perturba o sistema econômico. Contudo, é preciso lembrar que reproduzir materialmente a vida é condição essencial de qualquer sistema econômico. As pessoas parecem não se dar conta que a maior parte dos nossos esforços produtivos e a maior parcela dos produtos que geramos não são essenciais para a nossa reprodução orgânica, ainda que sejam para a nossa reprodução social, cultural e financeira. A maior parcela dos esforços é voltada para atender necessidades que vão além do suprimento básico de garantia da vida, o que mostra que temos capacidade de sobra para superar a crise atual fazendo um ajuste temporário. Tudo depende de nossa união e organização.
Todos estão preocupados legitimamente com seus próprios interesses materiais. Garantir dinheiro a empresários e famílias é a condição primordial. Os empresários precisam receber dinheiro para a sobrevivência de seus negócios e deverão dar contrapartidas. As famílias precisam receber dinheiro com urgência e sem burocracias para manter o circuito do consumo essencial. Isso resolve um lado da equação, o de evitar um desarranjo econômico que comprometa a vida. Este deve ser o papel do Estado neste momento, garantir as condições de funcionamento da economia por meio de medidas que se traduzam em sobrevivência para as famílias e para as empresas, especialmente as micro e pequenas. Para isso, precisamos ter um planejamento efetivo do Estado, envolvendo empresários, sindicatos e sociedade civil organizada, para a definição de metas e operacionalização destas medidas.
Fundamental é organizar a economia para o provimento do básico para todas as pessoas: alimentação, moradia, saneamento, remédios, serviços de saúde, comunicação, educação, água e segurança. Diversas políticas econômicas podem ser adotadas para viabilizar esse módulo de sobrevivência da economia. Embora os detalhes delas possam ser discutidos, não há dúvidas de que podemos superar esse momento com a troca de ideias de modo civilizado no interesse de toda Humanidade, sem apelar para um falso trade-off, já que a economia deve estar a serviço da vida e nunca o contrário.
Goiânia, 30 de março de 2020.
Assinam os seguintes docentes do Curso de Ciências Econômicas da FACE/UFG:
(lista atualizada em 01/04/2020)
Adriana Ferreira Silva - Profª. Efetiva - Drª. em Economia (Esalq/USP)
Andrea Freire de Lucena - Profª. Efetiva - Drª. em Relações Internacionais (UnB)
Antônio Marcos de Queiroz - Prof. Efetivo - Dr. em Economia (UFU)
Claudia Regina Rosal Carvalho - Profª. Efetiva - Drª em Ciências Ambientais (UFG)
Cleidinaldo de Jesus Barbosa - Prof. Efetivo - Dr. em Ciências Ambientais (UFG)
Cleyzer Adrian da Cunha - Prof. Efetivo - Dr. em Economia (UFV)
Débora Chaves Meireles – Profª. Efetiva – Drª. em Economia (UFJF)
Edson Roberto Vieira - Prof. Efetivo - Dr. em Economia (UFU)
Everton Sotto Tibiriçá Rosa - Prof. Efetivo - Dr. em Economia (UNICAMP)
Felipe Queiroz Silva – Prof. Efetivo – Dr. em Economia (UFRJ)
Flávia Rezende Campos - Profª. Efetiva - Drª. em Geografia (UFG)
Larissa Barbosa Cardoso - Profª. Efetiva - Drª em Economia (UFRGS)
Marcos Eduardo de Souza Lauro - Prof. Substituto - Ms. Economia (UFG)
Pedro Henrique Evangelista Duarte - Prof. Efetivo - Dr em Economia (Unicamp)
Sandro Eduardo Monsueto - Prof. Efetivo - Dr. em Economia (Universidad Autónoma de Madrid)
Sérgio Fornazier Meyrelles Filho - Prof. Efetivo - Dr. em Economia (CEDEPLAR/UFMG)
Suellen Mara de Lima Couto - Profª. Substituta - Ms. Sociologia (UFG)
Tiago Camarinha Lopes - Prof. Efetivo - Dr. em Economia (UFU)
Waldemiro Alcântara da Silva Neto - Prof. Efetivo - Dr. em Economia (ESALQ/USP)
Fonte: Secom UFG
Categorias: Humanidades Face