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Universidade Federal de Goiás
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Projeto Adoce é institucionalizado no Judiciário Goiano

Em 28/01/21 15:15. Atualizada em 28/01/21 15:47.

Fruto de pesquisa da UFG, o projeto mostrou aumento do número de conciliações nas audiências em que era oferecido suco de uva

 

Uma pesquisa realizada na Universidade Federal de Goiás (UFG) deu origem ao Projeto Adoce, institucionalizado recentemente no âmbito do Poder Judiciário do Estado de Goiás, conforme Decreto Judiciário nº 184/2020, com publicação nesta quarta-feira (27), no Diário da Justiça Eletrônico – Edição nº 3160 – Seção I. O presidente do Tribunal de Justiça do Estado de Goiás (TJGO), desembargador Walter Carlos Lemes, instituiu o projeto idealizado pela magistrada Aline Vieira Tomás, da 2ª Vara de Família e Sucessões da comarca de Anápolis, após a constatação de que a iniciativa impacta no aumento de acordos alcançados pelo Centro Judiciário de Soluções de Conflitos e Cidadania (Cejusc). 

Suco de uva foi a bebida escolhida para realização da pesquisa (Fotos: Wagner Soares)

A pesquisa foi realizada pela magistrada Aline Vieira Tomás, no mestrado em Direito e Políticas Públicas da Universidade Federal de Goiás em 2019 (veja a matéria completa do Jornal UFG e TV UFG)Sob o nome “Projeto Adoce: Acordos após ingestão de Dextrose Observados em Conciliações Judiciais (processuais) e Extrajudiciais (pré-processuais)", o experimento consistiu no oferecimento de glicose/dextrose (suco de uva) aos jurisdicionados e advogados submetidos a conciliações no 2º Cejusc de Anápolis. A proposta de instituir o Adoce como política pública de conciliação do TJGO foi apresentada pela juíza Aline Vieira Tomás após a apuração dos resultados da pesquisa, que demonstrou um aumento de 31,03% no número de acordos alcançados. Esse impacto reflete no cumprimento de metas do Plano de Gestão do TJGO e também do Conselho Nacional de Justiça (CNJ).

De acordo com o plano geral do projeto, o planejamento inclui replicar o experimento com o oferecimento de suco de uva nas audiências de conciliação nas varas de Família e Sucessões do Estado de Goiás, de forma gradativa, iniciando em 24 unidades judiciárias. A escolha das comarcas foi feita com base na movimentação processual e na localização geográfica no Estado, compondo o eixo Goiânia, Anápolis e Entorno de Brasília.

Autora do estudo Aline Vieira Tomás defendeu a dissertação em 2019 na UFG



O Projeto Adoce recebeu duas premiações – na 10ª edição do prêmio Conciliar é Legal do CNJ, na categoria juiz individual (Justiça Estadual), e no 8º Prêmio AMAERJ Patrícia Acioli de Direitos Humanos, na categoria Trabalhos dos Magistrados. A prática idealizada pela juíza Aline Tomás integra o banco de boas práticas do 17º Innovare.

Por que suco de uva?

Aline explica que o “segredo” do suco de uva está em um de seus componentes: a glicose. Ela se amparou em estudos de glicobiologia que demonstram que a substância atua no sistema límbico, responsável pelas emoções e pelos comportamentos sociais. “A glicose é o principal combustível do cérebro humano e uma das formas possíveis de se acionar o sistema de recompensa cerebral, desencadeando sensações de bem-estar e satisfação. É comum as partes comparecerem às audiências com o sistema de punição ativo, caracterizado por comportamentos combativos e de conflito. De sorte que a glicose pode propiciar a transição do sistema de punição para o de recompensa, permitindo que o sentimento de raiva dê lugar à abertura para comunicação, facilidade de negociação e melhor aptidão para ouvir o outro, que é justamente o que precisamos para que uma conciliação seja efetivada”, afirma a juíza.

Amparada por uma endocrinologista, metabologista e uma psicóloga, Aline buscou uma forma de possibilitar a ingestão de glicose durante as audiências. O suco – que poderia ser de qualquer sabor – mostrou-se adequado por sua forma líquida ser de rápida absorção e por conter a concentração necessária de glicose, além de ter baixo custo (R$ 2,90 por audiência) e ser socialmente aceito.

A validação dos dados está garantida pelo método científico. Além da amostra significativa, as audiências analisadas tinham o mesmo teor, sempre relacionadas ao direito de família, como divórcio, pensão alimentícia, guarda de filhos, união estável, entre outras. Elas foram realizadas por um grupo de quatro conciliadores experientes que não sabiam que a pesquisa estava sendo realizada, justamente para não interferir no resultado. A disposição das salas também foi idêntica tanto no grupo de controle quanto no experimental e a oferta de suco limitou-se a um copo (cerca de 200 ml).

Outro ponto interessante foram os resultados obtidos apenas no grupo experimental. Isso porque, nesse conjunto de audiências, apesar de o suco ter sido oferecido aos participantes, eles poderiam aceitá-lo ou recusá-lo. Mais uma vez, as análises mostraram que o índice de conciliação foi maior entre os que fizeram a ingestão.

Aline conta que a ideia surgiu ao ter conhecimento de uma pesquisa realizada com juízes criminais de Israel. O estudo, publicado no periódico científico Proceedings of the National Academy of Sciences of the United States of America, analisou 1.112 decisões judiciais e concluiu que a taxa de probabilidade de decisões em favor dos réus aumentava até 65% quando eram proferidas logo após o juiz ter realizado pausas para refeições.

Comportamento humano

Responsável pelas análises estatísticas da pesquisa, o professor da Faculdade de Administração, Ciências Contábeis e Economia (Face) da UFG, Marcos Severo, explica que os resultados corroboram os estudos da Economia Comportamental. “No marketing, por exemplo, a Economia Comportamental tenta orientar o comportamento humano em direção ao consumo, obviamente obedecendo princípios éticos. Essas ferramentas também estão sendo aplicadas na administração pública”.

Marcos acrescenta que o procedimento não altera o comportamento de uma pessoa, mas atua em favor de um determinado comportamento, que no caso de uma ação judicial pode ser o menos desgastante para as partes.

Agilidade e economia

Atualmente, o Código de Processo Civil estabelece as audiências prévias de conciliação e mediação como etapa obrigatória de todos os processos cíveis. O índice de conciliação também é usado pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) como indicador de eficiência do judiciário brasileiro. “A lógica da administração pública é melhorar a vida das pessoas. Então em vez de optar por um processo longo, que gera custos e trava o judiciário, por que não incluir um elemento que possa atuar favoravelmente em busca de um acordo?”, reforça Marcos Severo.

Para Aline Tomás, a pesquisa vai ao encontro dos novos paradigmas da justiça. “Quando as pessoas constroem suas próprias decisões, ainda que um pouco diferentes do ideal que buscavam, elas saem mais satisfeitas que em situações em que, por uma decisão judicial que lhes é imposta, apenas um ganha e o outro perde”. Diante dos expressivos resultados alcançados, a juíza propôs um projeto regulatório ao Tribunal de Justiça de Goiás, denominado Projeto Adoce, a fim de que a nova prática seja replicada gradativamente nas varas de família de Goiás, sobretudo por representar um custo muito baixo para o Estado.

Mais informações:

Veja aqui a matéria sobre a pequisa realizada na UFG (Jornal UFG e TV UFG)

Veja matéria do Tribunal de Justiça sobre o Projeto Adoce aqui. (Centro de Comunicação Social do TJGO).

Fonte: Secom UFG (com informações do Tribunal de Justiça de Goiás)

Categorias: Humanidades FCS FACE FD