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Universidade Federal de Goiás
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É possível dar relevância à bioeconomia na Amazônia e preservá-la

Em 01/03/21 15:40. Atualizada em 02/03/21 15:59.

Em aula magna na UFG, professor Carlos Nobre mostra a importância de manter a floresta em pé e ainda assim explorá-la economicamente

Luciana Santal

A Amazônia exerce papel central no ciclo do carbono mundial, tem a maior biodiversidade do planeta e está muito próxima de um ponto de não retorno, iniciando um processo de savanização que irá repercutir em todo o planeta. Para dar início ao ano letivo do sistema de pós-graduação da Universidade Federal de Goiás (UFG), a Pró-reitoria de Pós-graduação (PRPG) realizou a Aula Magna “A Amazônia está próxima de um ponto de não retorno: a urgente necessidade de uma nova bioeconomia de floresta em pé, um Amazon Green Deal”. O convidado especial do evento, transmitido pelo canal UFG Oficial, foi o cientista Carlos Nobre, membro titular da Academia Brasileira de Ciências e ex-presidente da CAPES. Carlos Nobre é Doutor em Meteorologia pelo Massachusetts Institute of Technology (MIT-EUA) e pesquisador titular do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE).

Aula Magna Carlos Nobre
Aula Magna marca o início do semestre na UFG

 

Importância - Carlos Nobre iniciou sua fala com apontamentos sobre o tema, que foi dividido em cinco tópicos: Amazônia como uma entidade regional do sistema terrestre; desmatamentos e queimadas na Amazônia; Amazônia próxima de um tipping point; busca de um inovador paradigma sustentável – Terceira Via Amazônica; e Projeto Amazônia 4.0. Carlos explicou que, algumas décadas atrás, a Amazônia era considerada o inferno verde para cientistas e população em geral. Mas para os indígenas, era o paraíso verde: o valor ético, espiritual, cultural e o bem-estar de todas essas populações é a floresta.

O cientista enumerou características da Amazônia que fazem com que ela transborde sua importância para além das fronteiras físicas: exerce papel central no ciclo global de carbono, pois armazena entre 100 a 120 bilhões de toneladas de carbono na biomassa; possui uma poderosa hidrologia – procede dela 15% da água doce que chega nos oceanos; tem a maior biodiversidade do planeta, com 16 mil espécies de árvores e mais de 5.500 espécies de vertebrados; é imprescindível para a estabilidade climática do planeta, devido ao volume anual de chuvas e a transferência de calor para a atmosfera; mantém a diversidade cultural e étnica, já que abriga cerca de 400 grupos indígenas. “Nós da ciência, hoje podemos dizer com muita certeza, que a Floresta Amazônia também é um paraíso verde para todo o planeta”, ressaltou.

Aula Magna Carlos Nobre
Algumas dos benefícios da floresta Amazônica para o planeta

 

Modelo desenvolvimentista - Carlos Nobre explicou que o modelo desenvolvimentista dos anos 1970 não via valor nenhum na floresta, considerada um obstáculo ao avanço econômico. Então, o governo militar, para ocupar a região, incentivou centenas de milhares de migrantes à criação de gado. Somadas a isso, as construções de estradas e rodovias também contribuíram para aumentar o desmatamento a partir de 1984. Outra preocupação atual é a degradação da floresta ocasionada pelo fogo e desmatamento, causada pela exploração madeireira e que pode ser vista em toda a Amazônia. As consequências disso são muitas, como o aumento da vulnerabilidade ao fogo e o risco de desastres socioambientais e de saúde.

Ponto de não retorno - Ele mostrou vários resultados científicos que comprovam que a Amazônia está próxima de um ponto de não retorno, ou seja, se o desmatamento ultrapassar o índice de 20-25% do total da Amazônia, grande parte da floresta desaparecerá de forma irreversível. Já em 1989, o cientista publicou artigos sobre a hipótese da savanização, em que se discutiu se o clima após o desmatamento permitiria a manutenção da floresta. E a resposta foi não, pois temporadas prolongadas de seca são típicas de outra vegetação, a savana. A ideia do artigo reunida a dados mais recentes e tecnologias mais sofisticadas mostraram, em projeções computacionais de modelos climáticos, que 50 a 60% da floresta desapareceria em 2050. O que mais preocupa, segundo Carlos Nobre, é que fatores globais já iniciaram esse processo, que ele chama de “Tipping point da savanização”. São eles: o derretimento de gelo no Oceano Ártico e na Groelândia, que modificam as circulações oceânicas com aumento de temperaturas que causam seca na Amazônia; e o próprio desmatamento regional na floresta, que a torna menos eficiente em reciclar água, aumenta a temperatura e os períodos de seca.

Terceira via Amazônica - Saindo um pouco da explanação dos problemas, Carlos direcionou sua fala para "a busca de um inovador paradigma sustentável”, que seria a Terceira Via Amazônica. “Nós precisamos realmente passar para o território das soluções. Nós todos da comunidade científica não podemos mais sermos só cientistas naturais, que analisam tudo que está acontecendo e alertam sobre os riscos. A urgência é tão grande que não podemos esperar a próxima geração de cientistas, precisamos realmente nos envolver muito na busca de soluções. E eu sei que muitos cientistas da Universidade Federal de Goiás estão também buscando soluções”, apontou.

Para Carlos, algumas perguntas que se deve fazer em relação à Amazônia é: podemos evitar o ponto de não retorno? É impossível o desenvolvimento econômico da Amazônia sem desmatamento/fogo/degradação? A resposta levantada por ele seria uma alternativa aos dois modelos históricos de usos da terra na Amazônia: a primeira via, que enfatiza a proteção legal de grandes áreas territoriais, como as reservas indígenas e unidades de conservação; e a segunda via, que persiste há 50 anos e se configura como o avanço do uso intensivo da terra para produção agropecuária, mineração e exportação de energia elétrica. Ele defende que reforçar a conservação e melhorar a eficiência da produção de commodities são condições necessárias mas não suficientes para assegurar o desenvolvimento econômico sustentável da região. Seria preciso se pensar numa via que, além dessas ações, também priorizasse o desmatamento zero e a restauração florestal. É o que ele chama de “Terceira Via Amazônica: um novo paradigma de desenvolvimento sustentável baseado na bioeconomia de floresta em pé e rios fluindo”.

Amazônia 4.0 - A aplicação desse novo paradigma já está em curso por meio do Projeto Amazônia 4.0, uma iniciativa que combina o mundo dos valores biológicos e biomiméticos da biodiversidade com as avançadas tecnologias num círculo vicioso. Carlos Nobre apresentou dados que mostram que produtos da biodiversidade amazônica cultivados em sistemas agroflorestais podem ser mais rentáveis que as monoculturas existentes. Dois exemplos são o açaí e o cacau, que podem ser sete vezes mais lucrativos que a soja e a pecuária, respectivamente. Outro aspecto que ele ressalta é que o novo paradigma tem que pensar num modelo de desenvolvimento distribuído para beneficiar toda a população. “O projeto Amazônia 4.0 é uma demonstração da viabilidade dessa nova bioeconomia”, enfatizou Carlos Nobre.

As atividades iniciais do projeto foram pensadas como estratégias de desenvolvimento das capacidades na Amazônia. São elas: Laboratórios Criativos da Amazônia (LCA), instalados em tendas ou plataformas flutuantes para experimentação inovadora em comunidades amazônicas e o Rainforest Business School, que tem o objetivo de criar negócios baseados na bioeconomia da floresta em pé.

Laerte e Carlos Nobre
Professor Laerte destacou o papel do professor na formação de uma geração de cientistas brasileiros

 

Papel para a pós-graduação -  A live contou com a mediação do professor Laerte Ferreira, pró-reitor de Pós-graduação da UFG, que, ao pontuar as contribuições de Carlos Nobre para a ciência, explicou que o cientista também teve uma participação muito importante na criação e consolidação de vários programas de pós-graduação nas Região Norte e Centro-Oeste do país antes de ocupar a presidência da Capes. “Um de seus projetos, o Programa de Grande Escala da Biosfera-Atmosfera na Amazônia (LBA), foi responsável pela formação de uma enorme quantidade de toda uma geração de cientistas ligados à Meteorologia, Modelagem Ambiental, Ciências Ecossistêmicas e Ciências Naturais como um todo”, exaltou. O pró-reitor acrescentou ainda que a pós-graduação, no Brasil e no mundo, caminha na direção de ser mais interdisciplinar e focada nos grandes temas da atualidade, como o enfrentamento das mudanças ambientais globais.

O reitor Edward Madureira também esteve presente na abertura do evento e afirmou ser um grande privilégio contar com o cientista Carlos Nobre para proferir a aula magna. “Essa palestra, sem dúvida, enriquece a todos nós”, enalteceu. Edward falou sobre a importância da ciência no momento atual e também lamentou que, num país com uma das maiores produções científicas do mundo em COVID-19, não sejam destinados recursos suficientes para  a manutenção de todo o sistema de pesquisa e pós-graduação, que é ancorado especialmente nas universidades públicas.

A palestra proferida por Carlos Nobre representou a fala de Laerte sobre a interdisciplinaridade na pós-graduação. O cientista e gestor de projetos científicos reuniu, em sua exposição, uma aula sobre a Amazônia vista sob diversos aspectos, geográfico, histórico, social, econômico. Todo esse conteúdo imperdível e também o bloco de perguntas está disponível no Canal UFG Oficial, é só clicar e assistir.

Fonte: Secom UFG

Categorias: Institucional Aula Magna Amazônia PRPG