
INTEGRIDADE ACADÊMICA
Conferências predatórias, o que tem a ver comigo?
Tatiana Duque Martins*
Esses tempos que vivemos estão nos tornando insensíveis às más condutas acadêmicas. Sim, em geral e de uma forma irreversível. Todos os dias somos inundados por informações divulgadas sem responsabilidade e, pela emergência, muitas vezes internalizamos essas informações sem os devidos cuidados de checagem.
Todo mundo é exigido a ter opinião. Admiro as pessoas que ainda hoje ouvem mais e falam menos, pois consideram suas opções, analisam, mesmo que por um momento, o que chega a elas e emitem uma opinião baseada em análise. Quando isso significa apressar uma resposta científica a um problema emergencial, as consequências dessa comunicação sem verificação são desastrosas.
No meio acadêmico, o espaço que temos para discussões de respostas científicas são os congressos e as conferências. Nesse último ano, muitas conferências ocorreram de forma remota, para que tivessem uma opção para ocorrer. Apesar de louvável, essa situação possibilitou a disseminação de um problema velho conhecido: as conferências predatórias. Exigidos a “mostrar trabalho” em um país que ignora os benefícios permanentes de se levar a sério a ciência, muitos de nós optamos por participar do maior número de conferências que pudéssemos arcar.
O fato é que, não sendo presenciais, os encontros em que discussões únicas sobre os trabalhos científicos não foram ofertados e as conferências se resumiram a apresentações para um público invisível. Percebendo isso, as conferências predatórias tomaram um impulso e fomos invadidos por convites e oportunidades de participar de um sem número de conferências que prometem espaço para discussões e divulgação de nossos trabalhos. Muitas delas se tornaram apenas janelas para o nada, com o véu da atividade remota a encobrir o que realmente eram. Com taxas altas e uma “avaliação” por pares ágil, essas conferências não cumpriram com seu papel, que é promover o progresso da ciência. E a ciência sofreu mais esse ataque.
O que não percebemos é que, mesmo nos tempos de isolamento, o preparo para uma conferência deve ter o mesmo cuidado de quando ela é presencial e os tempos da revisão por pares, bem como os de construir um programa e uma agenda de conferências, devem ser respeitados. Precisamos ter em mente que, se nos querem ouvir, é porque temos algo a dizer. Eventos apressados são nada mais que caça-níqueis e temos a obrigação de saber disso, não nos deixemos levar por vaidade, pois o pesquisador fica, sua real contribuição para o bem da ciência é que se perpetua.
Então, fica aqui uma dica: não ceda a pressões, analise bem o que precisa dizer e diga aquilo que pode sustentar. A cobrança virá e será na forma de responsabilidade.
*Tatiana Duque Martins é professora da UFG e coordenadora do Comitê de Integridade Acadêmica - UFG
O Jornal UFG não endossa as opiniões dos artigos, de inteira responsabilidade de seus autores.
Fonte: Secom-UFG
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