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Universidade Federal de Goiás
protocolo

HC-UFG/Ebserh lança Protocolo Clínico de Atenção às Mulheres em Situação de Violência

Em 11/11/22 17:28. Atualizada em 11/11/22 17:32.

Protocolo é o primeiro passo para a certificação do HC-UFG/Ebserh como serviço de referência em Goiás no atendimento de mulheres em situação de violência

Evento de lançamento do Protocolo Clínico de Atenção às mulheres em situação de violência.jpg
Lançamento do Protocolo de Atenção às Mulheres em Situação de Violência foi realizado no dia 04/11, na sala de aula da Maternidade do HC-UFG/Ebserh
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A médica sanitarista do HC-UFG/Ebserh, Marta Silva, falou sobre a importância do protocolo para o atendimento dessas mulheres na instituição
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Promotora de Justiça titular da 44ª Promotoria de Justiça da Comarca de Goiânia, com atribuição no 1º Juizado de Violência Doméstica, Emiliana Rezende de Souza, esteve presente ao evento e enfatizou o papel da Universidade dentro do processo de atenção às mulheres em situação de violência
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O Chefe da Divisão de Gestão do Cuidado, Johnathan Santana de Freitas, destacou a importância do protocolo para um hospital escola como o HC-UFG, que todos os anos forma profissionais de saúde de diversas áreas
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A médica ginecologista e obstetra Ana Carolina Ximenes abordou como deve ser a conduta dos profissionais no atendimento de mulheres em situação de violência sexual, conforme o protocolo
Foto - equipe da Unidade de Saúde da Mulher no lançamento do protocolo.jpg
Equipe da Unidade de Saúde da Mulher no lançamento do protocolo

A violência contra a mulher é um grave problema de saúde pública, responsável pela morbidade e mortalidade de muitas mulheres, que são vítimas, na maioria das vezes, por pessoas da própria família (companheiros e ex-companheiros). Diante dessa realidade, o Hospital das Clínicas da UFG, vinculado à Rede Ebserh, como unidade de saúde integrada à Rede Intersetorial de Atenção e Proteção às Mulheres em situação de violências, lançou, no dia 04 de novembro, o Protocolo Clínico de Atenção às Mulheres em Situação de Violência. O evento foi realizado na sala de aula da Maternidade do HC-UFG e contou com a presença de profissionais de saúde da Unidade de Saúde da Mulher do HC-UFG e da Promotoria de Justiça da Comarca de Goiânia – MP/GO.

“Estima-se que 4,4 milhões de mulheres sofreram violência física nos últimos dozes meses, sendo que, em 61% dos casos, os autores da violência são conhecidos dessas mulheres (companheiros, ex companheiros, namorados e ex namorados), conforme Relatório Mundial de Violências da Organização Mundial de Saúde (OMS), do ano de 2014, e Fórum de Segurança Pública, do ano de 2016”, afirmou a médica sanitarista do HC-UFG/Ebserh Marta Maria Alves da Silva, que coordenou o projeto de construção do Protocolo juntamente com a Unidade de Saúde da Mulher do HC-UFG/Ebserh, durante o evento de lançamento.

O Protocolo tem como objetivo auxiliar os profissionais de saúde do HC-UFG na identificação e conduta de situações de violência cometidas contra mulheres durante o atendimento nas unidades e serviços do Hospital das Clínicas. “Nós não somos policiais, mas sim profissionais de saúde, então nosso papel é identificar e cuidar”, ressaltou Marta Silva.

Segundo ela, o protocolo inclui o atendimento de mulheres em situação de violência em todos os seus ciclos, ou seja, desde mulheres adolescentes até mulheres idosas. “A maternidade do HC recebe adolescentes de 12, 14 anos grávidas em decorrência de estrupo, por isso elas também foram incluídas no protocolo, e há ainda os casos de mulheres idosas que sofrem violências cometidas pelos seus próprios filhos”, pontuou Marta Silva.

O Protocolo traz em sua estrutura conceitos, objetivos, justificativa e o marco legal para a sua implementação no HC-UFG bem como tudo o que envolve a atenção integral a essas mulheres, como a vigilância, notificação e atribuições de todos os profissionais envolvidos no atendimento em saúde. O protocolo descreve ainda os tipos de violência (física, sexual, psicológica, negligência, financeira e autoprovocada) que podem ser cometidos contra as mulheres, os fluxos para atendimento dessas mulheres no HC-UFG, o monitoramento e o encaminhamento para a Rede de Atenção e Proteção às Mulheres em situação de violências. O protocolo aborda também sobre educação permanente, cita as referências bibliográficas e histórico.

Presente ao evento de lançamento do Protocolo, a Promotora de Justiça titular da 44ª Promotoria de Justiça da Comarca de Goiânia, com atribuição no 1º Juizado de Violência Doméstica, Emiliana Rezende de Souza, destacou a importância do trabalho “em conjunto” entre os vários órgãos envolvidos no atendimento dessa mulher. “Nós sabemos que a mulher que é vítima de violência doméstica adoece mais, ela tem vários problemas psicológicos, problemas sociais, ela não tem capacidade de se inserir no mercado de trabalho, porque ela tem que cuidar dos filhos e não tem como se qualificar e, mesmo após a denúncia, ela volta para casa e encontra o agressor. Por isso, percebemos que se continuarmos trabalhando de forma isolada, com a justiça num canto, assistência social em outro, psicologia e equipe médica também isoladas, nós não vamos conseguir ajudar essa mulher. Eu acredito que a Universidade é o melhor local para trabalharmos com a mudança social, pois a violência doméstica é um problema social e precisamos mudar a mentalidade das pessoas em relação à questão da violência. Eu penso que é quem trabalha no ambiente acadêmico, professores e estudantes que vão conseguir fazer essa mudança”, pontuou.

Representando a Superintendência do HC-UFG/Ebserh, o Chefe da Divisão de Gestão do Cuidado, Johnathan Santana de Freitas, corroborou com a fala da promotora Emiliana e destacou o papel da Universidade. “A Universidade tem esse papel de produzir ciência e devolver para a sociedade nossa produção científica. E isso é muito importante. Esse protocolo é algo que foi sonhado e planejado por tantos profissionais, como psicólogos, enfermeiros, assistentes sociais e médicos, com base em suas vivências diárias no atendimento destes casos. Então, o protocolo vem para tirar dúvidas e para que esses atendimentos não sejam feitos de forma isolada, mas sim de forma padronizada. E como hospital escola, precisamos lembrar que todos os anos recebemos novos profissionais, que precisam ter conhecimento desse protocolo para levar para a sociedade todo o conhecimento aprendido”.

O protocolo está disponível na intranet do HC-UFG/Ebserh, dentro da pasta “Documentos Institucionais” e pode ser acessado por todos os profissionais de saúde da instituição.

 

Consequências da violência na vida da mulher

“Precisamos entender que muitos adoecimentos de mulheres são multicausais, mas podem ter por trás as violências. Então, a violência não é necessariamente a fratura, o olho roxo, mas todas as consequências que vêm dessa violência”, afirmou Marta Silva ao destacar que a violência pode causar vários impactos na vida dessas mulheres. “Essa realidade é a nossa grande justificativa para a criação deste protocolo, pois tudo isso causa impactos na saúde física e psíquica da mulher, além de invalidez, sofrimento, suicídio e o feminicídio”.

O estupro, segundo Marta Silva, é uma das principais causas de estresse pós-traumático em mulheres. “Muitas vezes a gente vê mulheres tentando se matar ou que não conseguem ter um relacionamento, pois um simples toque de uma pessoa no seu corpo faz ela reviver tudo o que ela passou na infância”, afirmou. Já a violência física tem um agravante em relação à letalidade, pois o risco de morte é muito grande, seja por arma de fogo ou por arma branca.

“Como consequências na vida da mulher, responsável pelo adoecimento e morte de muitas delas, a violência pode levar à depressão, ansiedade, pânico, dores pélvicas crônicas, doenças cardiovasculares (hipertensão e outras), infecções sexualmente transmissíveis e Aids, tentativas de suicídio ou mesmo o suicídio e o feminicídio”, destacou Marta Silva.

 

Estrutura do Protocolo

Segundo Marta Silva, o protocolo foi construído com base em evidências científicas, tendo como referência inicial o Relatório Mundial de Violências da OMS (Organização Mundial da Saúde), de 2002, que traz os conceitos de violência, que não se resumem somente à força física, mas também à força simbólica, como o assédio moral. “A violência pode se dar pelo uso da força física ou do poder real ou em ameaça, podendo ou não causar lesão, morte, danos psicológicos ou deficiências de movimento ou privação. Então, as consequências são muito amplas e nem sempre há uma lesão visível”, destacou.

O protocolo trabalha com os dois tipos de violência definidos pela OMS: a interpessoal e a autoprovocada. Nas violências interpessoais está incluída a violência doméstica, praticada por familiares com vínculos consanguíneos ou por pessoas com vínculos afetivos, como companheiros, e a violência extrafamiliar ou comunitária, que pode ser praticada por uma pessoa conhecida ou desconhecida. As violências autoprovocadas são as automutilações e as tentativas de suicídio. “Muitas vezes quando vemos uma mulher sendo atendida no ambulatório de psiquiatria para tratar uma depressão, porque ela se automutilou ou tentou o suicídio, ao fazermos uma investigação, acabamos descobrindo que ela foi vítima de uma violência sexual na infância ou foi abusada durante anos pelos parentes”, descreve Marta Silva.

Ainda segundo Silva, conforme definição da OMS, as violências são classificadas conforme a sua natureza: violência física (inclui beliscões, chutes, tapas, socos, murros, esganaduras, ferimentos por armas brancas ou armas de fogo, queimaduras); negligências ou abandonos, principalmente com mulheres idosas; violências psicológicas ou morais; violência financeira ou patrimonial; e as violências autoprovocadas (inclui as automutilações, tentativas de suicídio e o próprio suicídio).

A médica ginecologista e obstetra do HC-UFG/Ebserh, Ana Carolina Bosh Ximenes, falou sobre como deverá ser o atendimento às mulheres vítimas de violência sexual. “O atendimento deverá ser acolhedor, sensível, sem julgamentos prévios. O profissional deverá ter uma postura de empatia com a paciente, fazer uma escuta com ou sem acompanhamento, conforme a vontade dela, em um local reservado e ficar atento à comunicação não verbal dessa mulher, observando os gestos e a postura da paciente”.

Sobre os exames clínicos e ginecológicos, Ximenes destacou que deverão ser observados pelo profissional os sinais e sintomas, como edemas, lesões, feridas e fraturas nos membros e na face, bem como as lacerações nas regiões genital e anal da mulher. Com base nos sinais apresentados pela mulher e na anamnese feita pelo profissional, a equipe médica deverá proceder à conduta terapêutica, que pode ser a anticoncepção, prescrição de antibióticos para combater possíveis infecções sexualmente transmissíveis e o vírus HIV, além da profilaxia contra a Hepatite B. A mulher será acompanhada por 28 dias pela equipe médica após o uso dessas medicações. Nos casos de interrupção de gravidez, Ximenes levantou que ainda haverá muitas discussões a respeito, pois envolve questões éticas e religiosas tanto da paciente como dos profissionais e a legislação vigente, podendo, em algumas situações, a paciente ser encaminhada para um serviço de referência para a interrupção da gestação nas situações previstas em lei. Após esse período, a paciente será encaminhada para acompanhamento ambulatorial no HC-UFG e na Rede de Atenção e Proteção às Mulheres em situação de violências.

De acordo com Marta Silva, haverá educação permanente para os profissionais de saúde conheçam o protocolo e saibam como agir diante destes casos. “A ideia é trabalhar com a educação permanente dos profissionais, trazendo questões específicas de cada área e sempre com uma abordagem da humanização e da qualidade no cuidado em saúde”.

Já o monitoramento do protocolo, segundo Marta Silva, será feito por meio das notificações e de análises pela equipe de Epidemiologia do HC-UFG/Ebserh. “Se não tivermos nenhuma notificação, podemos ficar atentos, pois ou a instituição não está vendo estes casos ou eles não estão sendo registrados”, salientou.

 

Legislação

Marta Silva disse ainda que existe uma legislação brasileira que dá respaldo jurídico a essas mulheres, entre as quais destacou a lei que trata da notificação compulsória da violência contra a mulher (Lei 10.778/2003), que torna obrigatória a notificação dos casos de suspeita de violência contra a mulher pelos profissionais de saúde, a Lei Maria da Penha (Lei 11.340/2006), que foi um marco em relação às ações de proteção da mulher, integrando diversos órgãos e instituições para a proteção e o cuidado dessas mulheres (Judiciário, segurança pública, saúde, assistência social e outros), e a Lei do Feminicídio (Lei 13.104/2015).   

Em relação às ações de saúde, Marta Silva citou os Decretos nº 7.508/2011 (Redes de serviço de atenção para pessoas em situação de violência sexual) e nº 7.958/2013 (estabelece diretrizes para o atendimento humanizado às vítimas de violência sexual pelos profissionais de saúde e segurança pública) e a Lei nº 12.845/2013, que torna obrigatório, integral e imediato o atendimento às pessoas em situação de violência em todos os hospitais integrantes do Sistema Único de Saúde.

Marta Silva destacou também três portarias do Ministério da Saúde que regulamentam a lei que trata do atendimento às vítimas de violência sexual: Portaria n° 485, de 1° de abril de 2014, que cria os Serviços de Referência para Atenção Integral às Pessoas em Situação de Violência Sexual; Portaria nº 618, de 18 de julho de 2014, que define a habilitação dos serviços de referência de atenção às pessoas em situação de Violência Sexual; Portaria 2.415, de 07 de novembro de 2014, que institui o procedimento “Atendimento multiprofissional para atenção integral às pessoas em situação de violência sexual; e a Portaria Interministerial nº 288, de 25 de março de 2015, que envolve saúde, justiça e políticas para as mulheres, e diz respeito ao atendimento humanizado, com o registro de informação e coleta de vestígios.

 

Fluxo de atendimento no HC-UFG

O Protocolo traz o fluxo de atendimento que deverá ser seguido por todos os profissionais de saúde do HC-UFG, quando uma mulher der entrada no hospital, seja pela via ambulatorial, pelo setor de urgência e emergência ou quando vem encaminhada para internação. E, se a mulher tiver alta hospitalar, o Protocolo diz à quais órgãos ela deverá ser encaminhada para continuar sendo acompanhada pela Rede de Atenção e Proteção às Mulheres em situação de violências, como conselhos tutelares, delegacias, serviços do Sistema Único da Assistência Social (SUAS), e outros serviços do Sistema Único de Saúde (SUS), como serviços de referência para violências, Centro de Atenção Psicossocial, Centros de Saúde da Família, dentre outros.

O segundo fluxo do Protocolo é o de procedimentos que devem ser seguidos por cada área profissional do HC-UFG, ou seja, como deve ser a conduta de cada equipe: médica, de enfermagem, psicologia, serviço social e demais áreas. “A conduta comum a todas as áreas é a notificação. O Protocolo contém a ficha de notificação compulsória de violências do Ministério da Saúde, que deve ser preenchida pelo profissional e encaminhada para o Núcleo de Vigilância Epidemiológica do HC-UFG, o qual se encarregará de encaminhá-la para a Secretaria Municipal de Saúde. Já a comunicação externa sobre a suspeita de violência contra a mulher deve ser feita pelo profissional, por meio de um relato sucinto, conforme as situações previstas em lei (crianças, adolescentes, mulheres idosas ou com deficiência) para que sejam tomadas as devidas providências pelos órgãos de proteção e de responsabilização da Rede (Conselho Tutelar, Ministério Público, delegacias especializadas). Quando necessária rapidez nessa comunicação, pode-se fazê-la por telefone para posteriormente ser enviado o relatório sucinto sobre a violência”.

 

Serviço de referência

“Este é um passo para a concretização do nosso projeto de tornar o Hospital das Clínicas um serviço de referência para o Estado de Goiás no atendimento de mulheres em situação de violência, inclusive como instituição de porta aberta a essas mulheres”, afirmou Marta Silva. Segundo ela, o HC-UFG pode vir a receber incentivo do Ministério da Saúde para se tornar um serviço de referência.

A implementação do Protocolo Clínico de Atenção às Mulheres em situação de violência é a primeira etapa para que o HC consiga se tornar um serviço de referência. “As outras etapas são de médio e longo prazos e envolvem a pactuação com outros serviços, como o de segurança pública”, pontuou Marta Silva.

Categorias: Saúde Ebserh HC