Uso de animais em testes de cosméticos é proibido pelo Governo Federal
Leia a entrevista com a docente do IPTSP e coordenadora do CMPEA do IPTSP, Liliana Borges de Menezes Leite sobre o assunto
Marina Sousa
Resolução publicada no Diário Oficial da União, no dia 1° de março, dispõe sobre a proibição do uso de animais vertebrados como cachorros e ratos, para desenvolvimento e controle de qualidade de produtos de higiene pessoal, cosméticos e perfumes. A normativa foi proferida pelo Conselho Nacional de Controle de Experimentação Animal (Concea), colegiado do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI).
Muitas questões são levantadas sobre o uso de animais em testes científicos, entretanto, o bem-estar animal, transparência ética e o correto manejo dos animais devem ser considerados, como reforça a docente do Instituto de Patologia Tropical e Saúde Pública (IPTSP) e também coordenadora do Centro Multiusuário de Produção e Experimentação Animal (CMPEA/IPTSP/UFG), Liliana Borges de Menezes Leite. Ela explica que na prática o Brasil está implantando o que já era realizado em alguns países em especial da União Européia e atende uma demanda da sociedade e de cientistas, reduzindo significativamente o uso de animais em testes. Acompanhe a seguir a entrevista com a docente, sobre os principais pontos em relação a Resolução n° 58,de 24 de fevereiro, de 2023, que dispõe sobre a proibição do uso de animais vertebrados, exceto seres humanos, em pesquisa científica, desenvolvimento e controle de produtos de higiene pessoal, cosméticos e perfumes que utilizem em suas formulações ingredientes ou compostos com segurança e eficácia já comprovadas cientificamente e dá outras providências.
O que traz de novidade essa resolução publicada pelo Concea?
Anteriormente a utilização dos métodos alternativos eram recomendados pelo CONCEA a fim de diminuir o uso de animais nos testes de desenvolvimento e controle de qualidade de cosméticos, produtos de higiene pessoal e perfumes. Com a lei, o uso de animais vertebrados está proibido tornando obrigatório o uso dos métodos alternativos.
Essa resolução vai mudar as práticas no CMPEA do IPTSP?
A resolução pode impactar no número de animais fornecidos para pesquisa, pois, pesquisadores de outras instituições ou unidades acadêmicas poderiam utilizá-los para testes com esta finalidade. Levando em consideração os pesquisadores que mais frequentemente utilizam animais produzidos no CMPEA que são do IPTSP esta normativa não irá interferir significativamente, uma vez que as linhas de pesquisa não estão voltadas para produção de cosméticos e sim para elucidação de mecanismos de doenças, novos tratamentos e vacinas. Neste caso o uso de animais ainda não pode ser substituído devido à complexidade de resultados que precisam ser avaliados.
Como pode ser definido o uso humanitário de animais no ensino e pesquisa científica?
Partindo do princípio que ainda não podemos substituir o uso de animais em vários testes é incentivado que o uso de animais seja feito da melhor forma possível respeitando o nº 11.794/08 (Lei Arouca) que garante a utilização correta e humanitária de animais. O uso humanitário se refere a necessidade de poupar o sofrimento do animal utilizado em ensino e pesquisa uma vez que são seres sencientes, ou seja, possuem sensações, sentimentos e sentem dor como nós humanos.
O uso de métodos alternativos são validados de que forma? Há muitos relatos?
Ligado ao Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações tem-se a Rede Nacional de Métodos Alternativos (RENAMA) que cria infraestrutura laboratorial e de recursos humanos especializados capazes de implantar métodos alternativos ao uso de animais e de desenvolver e validar novos métodos no Brasil. A rede é composta por Laboratórios Centrais e Laboratórios Associados, inclusive a UFG possui um laboratório associado que está na Farmatec, é o Laboratório de Ensino e Pesquisa em Toxicologia In Vitro (Tox In) coordenado pela Profa Marize Valadares. Dessa forma o RENAMA é responsável por validar os métodos e o CONCEA reconhece estes métodos como válidos e publica em suas normativas, tais como a RN 54 e RN 56 de 2022. Possuem validados mais de 18 métodos alternativos e podem ser encontrados nas normativas do CONCEA. Entretanto, em atendimento a lei que proíbe o uso de animais vertebrados poderão ser utilizados os métodos alternativos validados nacional ou internacionalmente, porém ainda não reconhecidos pelo Conselho Nacional de Controle de Experimentação Animal.
É verdade que a resolução não é ainda o fim do uso de animais para teste no país ?
Isso mesmo! Precisamos ponderar que ainda muitos estudos pré-clínicos precisam ser realizados com o uso de animais para ter respostas mais complexas e assertivas como por exemplo, para avaliar o uso de um novo medicamento em seres humanos, ou nos próprios animais de diferentes espécies. Dessa forma, se não podemos eliminar totalmente o uso de animais em pesquisas, precisamos estar conscientes de fazer esta utilização com o menor número possível e de forma humanitária, a fim de garantir o bem estar dos animais.
Quais são os animais produzidos no CMPEA ?
No CMPEA são produzidos camundongos de diferentes linhagens, tais como C57Bl-6 e Balb-c, além de Zebra fish, o peixe zebra que tem sido muito utilizado em pesquisas diminuindo e, às vezes até substituindo o uso de animais considerados mais evoluídos, tais como os roedores e coelhos. Possui também salas para manutenção de outras espécies animais, tais como ratos e coelhos. Para a criação e manutenção destes animais o CMPEA segue as normativas do CONCEA e conta com médico veterinário responsável técnico que cuida do bem estar dos animais da instalação, além de estar disponível orientar os pesquisadores sobre a utilização destes animais.
À vista disso, é pertinente saber que existem várias razões também pelas quais os animais são usados para pesquisa, como por exemplo no teste de novos medicamentos e tratamentos para uma variedade de doenças, melhorar a segurança de produtos, haja vista que, órgãos, sistemas e processos biológicos de muitos animais são semelhantes aos dos humanos, permitindo que os pesquisadores estudem e compreendam melhor o corpo humano. Não obstante, toda prática que pode amenizar o uso desses animais em laboratório é valioso, levando sempre em conta protocolos que respeitem o bem-estar animal, especialmente quando essas práticas podem causar sofrimento aos animais envolvidos.
Fonte: Secom UFG