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Universidade Federal de Goiás
Oficina quilombola

Poder do alimento para a cultura quilombola é tema de oficina

Em 06/06/23 13:01. Atualizada em 06/06/23 13:01.

Workshop aconteceu durante a Agro Centro-oeste Familiar com a presença da Chef Aline Guedes

Janyelle da Mata

Inhame ralado, sal a gosto e cebolinha, mexer bem para dar liga e depois fritar no óleo quente, essa foi a receita apresentada para nove lideranças quilombolas femininas durante a Agro Centro-oeste Familiar (Acof). A oficina “Saberes tradicionais quilombolas: comida e cultura” foi realizada pelo projeto Sustentare da Universidade Federal de Goiás (UFG) e pela Faculdade de Nutrição (Fanut-UFG). O curso foi ministrado pela chef e pesquisadora da cultura alimentar quilombola, Aline Guedes, e pela professora da Faculdade de Nutrição (Fanut) da UFG, Raquel Cardoso Santiago.  

Oficina quilombola
(Fotos: Júlia Barros)

Aline Guedes é uma mulher negra de 38 anos, natural de São Paulo, que cresceu na periferia da cidade mais populosa da América do Sul, no bairro Tiradentes. Ela conta que o amor que ela tem pela culinária veio de sua mãe. Para ela, o cheiro do alho sendo amassado no pilão e do café são memórias que marcaram sua vida e que sempre a conectou à sua mãe. Ao completar 17 anos, uma das patroas de sua mãe, que trabalhava como empregada doméstica, ofereceu-se para custear sua graduação em Gastronomia no Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial (Senac). 

Foi no mestrado de Hospitalidade pela Universidade Anhembi Morumbi (UAM) que Aline teve a chance de morar fora. Ela escolheu um país Árabe e se encantou com a relação afetiva que ele tem pelo alimento e, ao retornar para o Brasil, sentiu a necessidade de basear sua dissertação nessa afeição. “Eu precisava escrever sobre algo que me conecta com alimento, então pensei em falar sobre a relação dos árabes, que eu achei lindo. Porém, não era a minha relação com o alimento e nem mesmo a minha cultura”, explica. Foi então que um de seus professores a aconselhou a visitar os quilombos remanescentes de São Paulo. Após algumas pesquisas, ela encontrou uma comunidade há 121 km da capital paulista, no município de Salto de Pirapora.

Ao chegar ao Quilombo Cafundó pela primeira vez, Aline idealizou que seria recebida com hospitalidade e alegria, mas teve suas expectativas frustradas, além de perceber que aquela comunidade não vivia sob os moldes aos quais ela esperava. O terreiro, que a chef esperava encontrar, estava queimado, uma igreja protestante estava erguida no centro do local, apenas um morador, já idoso, falava a cupópia - variação do português com a adição de palavras de origem africana - e a cooperação e coletividade que ela imaginava existir estava rachada por questões religiosas. 

Apesar de sua primeira hipótese de unidade do quilombo ter sido derrubada pela realidade, Aline retornou ao território, então acompanhada de sua mãe e seus três filhos. Na nova visita, conheceu Regina, moradora local, que segundo a chef, encontrava-se aflita ao assistir sua cultura ser engolida pelas cidades. Aline, com sua vontade em dissertar sobre a relação com a comida, decidiu se basear no Cafundó. Ela conta que hoje, com os esforços de Regina, as crianças da comunidade falam cupópia, a população construiu uma pousada, uma horta comunitária e um tour gastronômico com a venda de feijoada, - atividades de onde provém o sustento do Quilombo - além de oficinas e brincadeiras típicas para as crianças.    

O relato sobre o Cafundó e a receita - apresentada pela a chef em um Quilombo da região do Vale do Ribeira - ensinada na oficina foram pensados para mostrar às lideranças que é possível reviver os costumes e que o alimento é capaz de auxiliar neste resgate. Aline explicou que nos workshops que ela ministra, ela geralmente cozinha refeições com proteínas de animais de pequeno porte como a galinha ou receitas sem proteína animal. “A grande parte das refeições, nos quilombos que eu visito, baseiam-se em alimentos que provêm da terra”, afirmou. Apesar de não quilombola, ela salienta que a conexão com a terra é importante para o resgate cultural dessas comunidades. “Eu penso que através do alimento nós podemos nos reconectar com África e com nossos antepassados. Nas oficinas que ministro eu procuro sempre trabalhar com alimentos que dialogam com a diáspora - deslocamento e dispersão de um povo de sua terra de origem motivada perseguições étnicas, políticas ou religiosas - africana e é por esse motivo que decidi trabalhar com o inhame que é uma raíz vinda do continente africano”, afirmou.  

Para a chef, o trabalho que ela desempenha hoje é uma ferramenta para o empoderamento não apenas dos residentes dessas comunidades, mas também para todos os brasileiros que têm raízes africanas. “Eu estar hoje falando sobre o que eu falo, é um movimento que foi possibilitado pela luta de pessoas parecidas ou semelhantes a quem eu sou, então eu acredito que o trabalho que realizo hoje, daqui alguns ou muitos anos, vai fazer com que outras pessoas parecidas comigo vivam uma situação ainda mais favorável que a que vivo hoje, essa é a minha motivação”, afirmou Aline. 

Clique aqui para ler o artigo de Aline Guedes sobre o Cafundó.

 

Fonte: Secom UFG

Categorias: Humanidades