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Universidade Federal de Goiás
Painel Econômico

PAINEL ECONÔMICO

Em 28/11/23 09:31. Atualizada em 28/11/23 09:33.

Novo governo da Argentina precisa buscar cooperação, não conflito

Algumas ideias lançadas pelo presidente eleito da Argentina, Javier Milei, durante a campanha eleitoral não são de implementação trivial. A dolarização da economia, por exemplo, requer a substituição do peso pelo dólar como moeda oficial e não se sabe ao certo de onde sairão os dólares para tanto. As reservas cambiais do país estão em queda e existem bilhões de dólares em pagamentos de importações ainda não realizados. Busca-se imprimir ao mercado monetário argentino a estabilidade da moeda americana para combater a alta dos preços, que ultrapassa 140% ao ano. Por outro lado, caso ocorra, a medida fará com que as condições de liquidez e juros do país passem a ser ditadas pela política monetária dos Estados Unidos e a Argentina perderia a capacidade de utilizar a política monetária para estimular sua economia no caso de crises. Além disso, eventuais movimentos que valorizem a moeda norte-americana perante as moedas dos seus parceiros comerciais reduziriam a competitividade das empresas locais, dificultando suas exportações.

O descontentamento demonstrado por Milei com as relações da Argentina com Brasil e China dificilmente pode ter efeitos práticos, haja vista que pode redundar em custos econômicos não desprezíveis para a economia argentina, cujos principais parceiros comerciais são justamente os brasileiros e os chineses. O Brasil e a China são, respectivamente, o primeiro e o segundo maiores destinos das exportações da Argentina. As exportações do país para o Brasil foram de cerca de 14% do total em 2022 e aquelas que tiveram como destino o mercado chinês representaram outros 9%. Esses dois países são também os maiores fornecedores de produtos para a Argentina, só que, nesse caso, embora seja seguida de perto pelo Brasil (19,6%), a China tem a maior participação (21,5%).

Outra questão é que muitas empresas que se instalaram na Argentina o fizeram considerando a totalidade do mercado formado pelo Mercosul, que envolve originalmente Argentina, Brasil, Paraguai e Uruguai. Tal mercado abrange cerca de 260 milhões de pessoas, mas, desse total, o Brasil possui 78,2% e a Argentina, 17,8%, seguidos pelo Paraguai (2,6%) e pelo Uruguai (1,3%). No caso do PIB, os números são parecidos. O PIB brasileiro representa 72% do PIB do Mercosul, o da Argentina 23,7%, o do Uruguai 2,7% e o do Paraguai 1,6%. Assim, se a Argentina e o Brasil tiverem conflitos irreconciliáveis, dificilmente o Mercosul continua viável economicamente, havendo possibilidade de algumas empresas deixarem os mercados dos países que compõem o bloco.

Do ponto de vista do Brasil, também não parece ser interessante a imposição de obstáculos às suas relações com a Argentina. O país ainda é seu terceiro maior parceiro comercial, ficando atrás apenas da China e dos Estados Unidos. Para o mercado argentino, são enviados pelo Brasil principalmente produtos manufaturados e, por conseguinte, de maior valor agregado, como veículos de passageiros, motores, peças automotivas e tratores. Das 27 unidades da federação do país, apenas Amapá e Roraima não exportam para a Argentina. São Paulo, Minas Gerais e Paraná são os estados brasileiros que mais exportam para o mercado argentino, nessa ordem. No caso de Goiás, a Argentina não é um mercado muito relevante, representando apenas 0,33% de suas exportações. Apesar disso, a Argentina também é destino de produtos goianos que possuem maior valor agregado, como medicamentos, máquinas e equipamentos para colheita.

A participação da Argentina no total das exportações brasileiras no início da década de 2000 era cerca de três vezes maior do que a registrada em 2022. Se ao invés do conflito houvesse intensificação das relações comerciais entre os dois países, ambos ganhariam. O resultado desse jogo está longe de ser de soma zero e não parece haver melhor caminho que não o da cooperação.

Boletim de Conjuntura Econômica de Goiás – N. 162/novembro de 2023.
Equipe Responsável: professores Edson Roberto Vieira e Antônio Marcos de Queiroz (FACE/UFG)

 

* O Jornal UFG não endossa as opiniões dos artigos e colunas, de inteira responsabilidade de seus autores.

Fonte: FACE

Categorias: colunistas Face Boletim Econômico Painel Econômico