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Universidade Federal de Goiás
Painel Econômico

PAINEL ECONÔMICO

Em 28/03/24 14:50. Atualizada em 28/03/24 14:52.

Em cenários adversos, gastos com Pesquisa, Desenvolvimento e Inovação (PDI) ganham destaque

Tal qual o Brasil, o estado de Goiás atingiu em 2023 a maior produção agrícola da sua história, com uma safra 32,0% maior do que a média registrada nos últimos cinco anos – como mostram os dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Dentre os 26 estados e o Distrito Federal, Goiás ocupou a 1ª posição na produção de sorgo, a 2ª na produção de tomate e a 3ª na produção de soja, milho e cana-de-açúcar. Na pecuária, ocupou a 2ª posição no abate de bovinos, ficando atrás apenas do estado de São Paulo em 2023. Apesar de não ficar no topo do ranking, Goiás também foi importante em nível nacional em relação ao abate de frangos (5ª posição), à quantidade de leite adquirida (6ª posição) e ao abate de suínos (8ª posição).

A despeito disso, pelos cálculos do Ministério da Agricultura e Pecuária (MAPA), o maior Valor da Produção Agropecuária (VPA) da série histórica do estado não foi registrado em 2023 e sim em 2022, quando atingiu R$ 101,2 bilhões, superando os R$ 94,2 bilhões obtidos no ano seguinte. O VPA de Goiás é concentrado em um número relativamente pequeno de produtos agropecuários: soja (35,0%), bovinos (13,2%), cana-de-açúcar (12,5%), milho (12,4%), frango (7,4%), tomate (6,2%) e leite (6,1%) foram responsáveis por 92,7% do seu VPA em 2023. Muito embora tenham tido aumento da produção, soja, milho, bovinos e frango tiveram queda do VPA em 2023. Considerando que o único dos principais produtos agropecuários produzidos em Goiás que apresentou redução da produção foi o tomate, fica vidente que a causa dessa diminuição do VPA goiano foi a redução dos preços dos produtos.

A própria safra recorde colhida pelo Brasil em 2023 foi uma das causas da queda dos preços agropecuários ao longo do ano. Além disso, juntamente com a safra americana que se manteve em condições favoráveis, houve certa normalização do escoamento das produções da Rússia e da Ucrânia, que são importantes players do mercado de commodities agrícolas e estiveram fora desse mercado em alguns momentos mais agudos do conflito entre os dois países. No caso das carnes bovinas, vale chamar a atenção para a paralisação das exportações brasileiras para a China, ocorrida no primeiro trimestre do ano, que, juntamente com o aumento da oferta de animais prontos para abate, atuou para reduzir os preços da carne in natura no ano. Enquanto isso, o aumento da oferta e a redução do custo de produção também contribuíram para reduzir os preços da carne de frango. Como as commodities agropecuárias têm seu preço determinando no mercado internacional, os produtores pouco ou nada podem fazer para alterar um cenário de preços mais baixos.

Assim, com margens apertadas ou até mesmo prejuízos em alguns cenários adversos, os gastos com Pesquisa, Desenvolvimento e Inovação (PDI) ganham destaque. Esses gastos são importantes não apenas para aumentar a produtividade e reduzir custos de produção, como também para gerar diferenciação de produtos, de modo a possibilitar a fuga do alinhamento dos preços dos produtos agropecuários em relação aos das commodities padronizadas negociadas no mercado internacional. Um bom exemplo nessa linha é o chamado ecossistema de "agritech" da Nova Zelândia. Esse ecossistema é composto por empresas de tecnologia que atuam na indústria, em biotecnologia ou em soluções digitais, buscando desenvolver novos produtos, serviços, direitos de propriedade intelectual ou soluções para cadeias de valor na agricultura, horticultura, aquicultura, apicultura e pesca.

O relatório de inteligência sobre o ecossistema de agritech da Nova Zelândia elaborado pela Embaixada do Brasil em Wellington1 e publicado em março de 2023, chama a atenção para algumas das soluções e produtos desenvolvidos por empresas que fazem parte desse ecossistema. Uma delas desenvolveu um aplicativo a fim de apresentar soluções para a apicultura, como o gerenciamento de enxerto, manejo da rainha, inspeções de colmeias, desempenho e lucratividade da colmeia e gestão de inventário. Outra empresa apresentou serviços integrados de irrigação para o setor agrícola, com o uso de nanobolhas que favorecem o crescimento e a resistência a doenças das plantas, bem como a saúde e a retenção de umidade do solo. Para a indústria de carne, foi apresentada uma tecnologia para detecção de contaminação para a indústria de processamento e distribuição do produto, utilizando técnicas de fluorescência e um algoritmo matemático para detectar clorofila e seus metabólitos dentro de material fecal encontrado na superfície da carne. E, para o uso doméstico, uma empresa criou um kit para plantio de sementes de legumes selecionados, que requer que o usuário apenas adicione água e exponha ao sol uma badeja com pequenos colchões de nutrientes nos quais as sementes são acondicionadas, aguardando por cerca de duas semanas para que os legumes estejam prontos para o consumo.

A população de cerca de 5,12 milhões de habitantes de Nova Zelândia é menor do que a de Goiás, a qual, conforme apurado pelo IBGE, está em torno de 7,2 milhões de habitantes. O território neozelandês também é menor do que o goiano: 263.310 km2 contra 340.086 km2. Já a participação de 11,7% do setor agropecuário no PIB (Produto Interno Bruto) da Nova Zelândia em 2021 era muito próxima à desse mesmo setor na economia goiana. Porém, conforme mostram as informações do Banco Mundial, o PIB total do país, de US$ 255,5 bilhões, em 2021, foi muito maior do que o de Goiás, que atingiu US$ 49,4 bilhões2. Ou seja, somente o PIB da agropecuária neozelandesa foi equivalente a 60,5% do PIB total de Goiás em 2021.

Não se pode negligenciar as soluções tecnológicas que têm sido implementadas no setor agropecuário brasileiro nos últimos anos. As ácidas terras do cerrado do país só se tornaram produtivas porque possuem muita tecnologia e inovação embarcadas no processo produtivo. Aos poucos, foram sendo utilizados novos cultivares, novos insumos agrícolas, mecanização e novos processos produtivos que tornaram as terras ácidas do cerrado muito produtivas. E, no período mais recente, tem-se assistido ao uso de agricultura de precisão, drones e de sistemas e aplicativos para acompanhamento da produtividade, verificação do melhor momento para vender os produtos, entre outras tecnologias inovadoras.

Contudo, a despeito de os gastos com PDI realizados em Goiás ao longo dos anos terem sido decisivos para aumentar a produtividade e reduzir os custos de produção, o exemplo neozelandês é algo a ser observado de perto pelos tomadores de decisão públicos e privados que atuam no setor agropecuário do estado. O estímulo às novas soluções digitais para o agronegócio, ao desenvolvimento de novos produtos e serviços e aos direitos de propriedade intelectual, além de reduzir custo e agregar valor à produção, pode contribuir efetivamente para que haja diferenciação de produtos e, com isso, que se possa trabalhar com preços também diferenciados, não necessariamente atrelados à dinâmica das commodities agropecuárias que é estabelecida no mercado internacional.

 

1. Estudo de Mercado: tecnologia agrícola (Agritech) Nova Zelândia. Disponível em: https://x.gd/KiJYi . Acesso em: 21 mar. 2024.

2. O valor em US$ do PIB de Goiás em 2021 foi apurado considerando o valor em US$ do PIB do Brasil em 2021 (US$ 1,92 trilhão) disponibilizado pelo Banco Mundial, multiplicado pela participação de Goiás no PIB brasileiro naquele ano.

 

Boletim de Conjuntura Econômica de Goiás – N. 166/março de 2024.
Equipe Responsável: professores Edson Roberto Vieira e Antônio Marcos de Queiroz (FACE/UFG)

 

* Os artigos publicados são de inteira responsabilidade de seus autores e não refletem, necessariamente, a opinião do Jornal UFG.

Fonte: FACE

Categorias: colunistas Face