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Universidade Federal de Goiás
Painel Econômico

PAINEL ECONÔMICO

Em 27/05/24 14:05. Atualizada em 27/05/24 14:05.

Indicadores sugerem atividade econômica acima do esperado em 2024

Os indicadores relativos ao primeiro trimestre de 2024 sugerem que o resultado da atividade econômica do país pode ficar acima do esperado pelos analistas neste ano. Muito embora as estimativas para a produção de grãos no país feitas pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) apontem para uma queda de 5,0% na comparação com o ano passado, o Instituto mostrou que os setores de comércio, indústria e serviços tiveram resultados positivos no primeiro trimestre de 2024, avançando, respectivamente, 5,9%, 1,9% e 1,2%. O saldo da balança comercial do país caiu em relação ao observado no primeiro trimestre de 2023, mas continua positivo, batendo em US$ 5,3 bilhões no primeiro trimestre de 2024.

Ao menos até agora, essa dinâmica parece ter sido suficiente para compensar a redução da produção agrícola. O Índice de Atividade Econômica elaborado pelo Banco Central (IBC-Br) indica que a economia brasileira cresceu 1,08% no primeiro trimestre de 2024 e 1,68% no acumulado em 12 meses. Com esses resultados, houve ajustes das expectativas dos agentes relativas ao crescimento da economia brasileira captadas pelo Relatório Focus do Banco Central. No início do ano, tais expectativas apontavam para um aumento de cerca de 1,5% e agora indicam um crescimento superior a 2,0% do PIB doméstico.

No caso de Goiás, seus indicadores econômicos para o primeiro trimestre de 2024, em geral, estão acima dos nacionais. O Índice de Atividade Econômica do Banco Central (IBC-Br) sugere um crescimento da economia goiana cerca de 30% superior ao da economia brasileira no período. Os dados do IBGE dão indícios de que a principal razão para tanto é o desempenho da indústria, que avançou 10,9%, puxada notadamente pela produção de veículos (72,6%), biocombustíveis (46,7%) e alimentos e bebidas (12,9%).

Historicamente, a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PNADC) mostra que a taxa de desocupação do estado de Goiás é inferior à nacional, o que voltou a ocorrer no primeiro trimestre de 2024, quando registrou 6,1%. Mas, de qualquer modo, com a dinâmica econômica acima do esperado, a taxa de desocupação nacional do primeiro trimestre desse ano (7,9%) está no menor patamar para um primeiro trimestre desde 2014 – quando atingiu 7,2%.

Essa dinâmica do mercado de trabalho é uma excelente notícia para os trabalhadores, mas causa preocupação acerca da possibilidade de que eventuais aumentos reais dos salários sejam repassados para os preços dos bens e serviços finais, pressionando a inflação doméstica. Contudo, o que se tem é que, pelo menos até agora, a inflação oficial medida pelo Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), do IBGE, encontra-se em 3,69% no acumulado dos últimos 12 meses e, portanto, dentro do intervalo perseguido pelo Banco Central para 2024 (meta de 3,0%, com tolerância de 1,5% para mais ou para menos). Uma análise mais detalhada do indicador evidencia ainda que houve melhora dos núcleos (usados para apurar a tendência dos preços, sem levar em conta as variações decorrentes de choques temporários na economia) e redução dos índices de difusão (que aferem a proporção de bens e serviços que tiveram aumento de preços), o que sugere haver consistência da trajetória de estabilidade dos preços no país.

Na sua última Ata (publicada em 14/05/2024), o Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central destaca que os bancos centrais das economias mais relevantes do mundo continuam buscando estabilizar os preços no bojo de mercados de trabalho aquecidos. Mas o fato é que em muitos desses países a taxa de desocupação também têm permanecido baixa e a inflação relativamente comportada, como no caso do Brasil. Na Zona do Euro, a taxa de desemprego voltou à sua mínima histórica (6,4%) em agosto de 2023 e tem permanecido em torno desse patamar, conforme mostra a Eurostat, que é a agência oficial de estatísticas da União Europeia. A mesma agência mostrou que a inflação tem se mantido estável em 2024, girando no nível de 2,4% ao ano. Nessa mesma linha, a taxa de desocupação dos EUA tem ficado seguidamente abaixo do nível de 4,0% (algo que havia ocorrido apenas entre os anos de 1967 e 1970), ao tempo em que a inflação teve sua primeira queda de 2024 em abril, depois de ter aumentado nos primeiros três meses desse ano.

Uma possível explicação para esse processo pode estar no aumento da produtividade. Ocorre que está em curso uma nova revolução causada pelos avanços da tecnologia da informação. O uso da inteligência artificial e de equipamentos com tecnologias embarcadas com dispositivos de rastreamento, navegação, comunicação, sensores, softwares de gerenciamento, entre outros, aumenta não apenas a produtividade, como também a eficiência e a eficácia dos processos produtivos. Ao mesmo tempo que destrói empregos em uma área, os cria em outras.

É claro que o processo não é isento de críticas do ponto de vista do mercado de trabalho, haja vista que muitos dos empregos gerados a partir dessas novas tecnologias, por vezes, não requerem significativa qualificação dos trabalhadores, como é o caso dos chamados empregos por aplicativos. Esse é um processo que merece uma abordagem específica, dada a sua importância. O ponto aqui é o aumento da produtividade decorrente do uso das novas tecnologias, algo que eventualmente pode estar contribuindo para manter os preços mais comportados em economias com mercados de trabalhos aquecidos.

No caso do Brasil, além dos avanços da tecnologia da informação, o aumento da produtividade pode estar relacionado à qualidade dos empregos gerados no período recente. Um trabalho conduzido por pesquisadores da Fundação Getúlio Vargas, e detalhado em matéria publicada no Valor no dia 21/05/2024, sinalizou que a recuperação do mercado de trabalho brasileiro ocorrida após a pandemia da covid-19 foi calcada no aumento do emprego formal e na elevação do nível de escolaridade dos trabalhadores contratados, ao contrário do que se verificou na recuperação que se deu após as crises econômicas de 2015 e 2016. Esse processo pode estar elevando a produtividade do trabalho e compensando os aumentos reais dos salários.

Evidentemente, essa é uma hipótese que precisa ser analisada por meio de estudos mais detalhados e robustos do ponto de vista metodológico, mas é importante que seja considerada na análise acerca dos impactos do aquecimento do mercado de trabalho sobre a inflação. Isso porque o aumento da produtividade do trabalho pode redundar em um, dois ou três resultados não excludentes: pode ser repassado para os preços dos bens e serviços finais, reduzindo-os na mesma proporção da redução observada nos custos de produção; capturado pelos trabalhadores, na forma de aumentos dos seus salários; apoderado completamente pelos empresários, com lucros maiores; ou dividido entre os consumidores, trabalhadores e empresários. Pode ser que, após os aumentos não desprezíveis dos preços observados em 2021 e em 2022, essa relação de forças esteja mais favorável aos consumidores nesse momento, contribuindo para manter a inflação mais comportada.

Alguns dados recentes podem dar certa sustentação à hipótese levantada aqui. O editorial do Valor do dia 20/03/2024 teve como foco as informações do Observatório da Produtividade do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getúlio Vargas, mostrando que a produtividade por hora efetivamente trabalhada no Brasil cresceu 1,9% em 2023. Por sua vez, os dados apurados pela PNADC mostram que o rendimento real médio do trabalho no Brasil teve aumento contínuo desde segundo trimestre de 2023 até o primeiro trimestre de 2024, passando de R$ 2.915,00 para R$ 3.033,00 nesse período. Do ponto de vista da inflação, considerando cada um desses trimestres citados, observa-se que, no acumulado dos últimos 12 meses, inicialmente o IPCA aumentou na passagem do segundo semestre de 2023 para o terceiro trimestre do mesmo ano (de 3,16% para 5,19%) e depois começou a cair, atingindo 4,62% no quarto trimestre de 2023 e 3,93% no primeiro trimestre de 2024.

Além do mercado de trabalho, outros fatores têm gerado debates acerca de seus possíveis impactos sobre a inflação do país, destacando-se a direção da política monetária dos EUA, a política fiscal doméstica e os efeitos da tragédia verificada no Rio Grande do Sul sobre os preços dos alimentos. Mas é importante que se considere os possíveis aumentos de produtividade ocorridos no período recente, muitas vezes não percebidos pelas métricas comumente utilizadas. O entendimento mais acurado desse processo pode contribuir, sobretudo, para calibrar a dosagem de juros utilizada para controlar a inflação no país.

 

Boletim de Conjuntura Econômica de Goiás – N. 168/maio de 2024.
Equipe Responsável: professores Edson Roberto Vieira e Antônio Marcos de Queiroz (FACE/UFG)

 

* Os artigos publicados são de inteira responsabilidade de seus autores e não refletem, necessariamente, a opinião do Jornal UFG.

Fonte: Face

Categorias: colunistas Face