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Universidade Federal de Goiás
Artigo Psicologia

O uso de telas na primeira infância: desafios e recomendações

Em 09/09/24 14:24. Atualizada em 26/09/24 17:07.

Aumento é preocupante pois pode estar relacionado a prejuízos para o desenvolvimento e comportamento infantil

Mariana Cunha Rosa*
Ana Julia Feitosa Stival*
Maíra Lopes Almeida**

Cotidianamente, é possível observar várias crianças de diferentes idades utilizando smartphones, tablets e outros dispositivos móveis em espaços públicos. Nota-se também que, cada vez mais, esse uso tem começado em momentos mais precoces na infância. Assim, o uso de mídias digitais por bebês tem ganhado forte atenção de mães, pais e profissionais de saúde e educação nos últimos anos. As mídias digitais referem-se ao conjunto de dispositivos, formatos e métodos de comunicação que veiculam conteúdo por meio de sinais digitais, como na internet, televisão e redes de computadores e telefonia  (American Psychological Association, 2019). Esses dispositivos móveis, como tablets e smartphones, tornaram-se parte da rotina das famílias, e observa-se até mesmo bebês conectados às telas.

O uso excessivo de telas na primeira infância é preocupante, pois pode estar relacionado a prejuízos para o desenvolvimento e comportamento infantil. Estudos prévios mostraram que o uso excessivo aumenta os riscos de atrasos no desenvolvimento motor, psicossocial, cognitivo e de linguagem da criança, além de reduzir a qualidade das relações interpessoais. Também foi observado que, quanto maior o uso de telas na primeira infância, mais dificuldades surgem nas habilidades de atenção, autocontrole, autorregulação emocional e na qualidade do sono.

Diante desse cenário, diversas sociedades de pediatria ao redor do mundo se propuseram a fazer recomendações para o melhor uso das mídias digitais por bebês e crianças. Em geral, essas recomendações focam na restrição do tempo de tela, incluindo as diretrizes da Sociedade Brasileira de Pediatria (2019), que defendem que não haja nenhuma exposição às telas até os dois anos de idade. Dos dois aos cinco anos, esse limite é de uma hora por dia, sob a supervisão de um adulto (Sociedade Brasileira de Pediatria, 2019). No entanto, evidências mostram que essas recomendações podem não alcançar os resultados esperados, uma vez que a maioria das crianças brasileiras entre dois e quatro anos excede o limite de tempo estabelecido pela Sociedade Brasileira de Pediatria (Nobre et al., 2019). Por isso, a seguir serão apresentadas algumas sugestões de como fazer o melhor uso possível das telas pelas famílias, considerando a tríade: tempo de tela, conteúdo e contexto de uso.

Ao pensar no tempo de tela, é fundamental reconhecer a importância dos momentos sem telas para o desenvolvimento infantil. As vivências com outros adultos e pares ajudam a criança a construir habilidades cruciais, como, por meio de brincadeiras compartilhadas, aprender a seguir regras e tolerar frustrações. Por isso, é necessário estabelecer momentos livres de tela na família e que os cuidadores monitorem os próprios tempos de tela, uma vez que as crianças modelam seu comportamento em relação ao uso de mídias a partir dos exemplos dos cuidadores. Além disso, existem momentos em que se recomenda fortemente evitar a presença das mídias digitais, como antes de dormir, na hora da alimentação, durante a troca de fraldas e ao administrar remédios.

Em relação ao conteúdo, é importante assegurar que ele esteja de acordo com a faixa etária. Assim, os cuidadores podem verificar se a idade da criança está dentro da recomendada pelo aplicativo antes de permitir seu uso. Para ter mais segurança quanto ao conteúdo, o ideal é que os cuidadores assistam previamente, no caso de desenhos ou filmes, ou testem os aplicativos antes de autorizar o uso pela criança, para garantir que se trata de material adequado. Nesse sentido, também é recomendado evitar conteúdos violentos ou que contenham superestímulo, como cores e sons muito intensos, e muitas cenas (frames) por segundo. Sugere-se que os cuidadores optem por conteúdos educativos.

Outro ponto-chave para um uso adequado é priorizar a interação com a criança durante o uso de telas. Quando o adulto assiste ou utiliza a tela juntamente com o bebê, é possível promover a mediação, ou seja, ajudar a criança a compreender o que está fazendo ou vendo naquele momento. Um exemplo disso é quando se assiste a um filme e o adulto pausa o vídeo para conversar com a criança sobre o que acabaram de ver. Esse é um momento importante para fazer perguntas sobre o conteúdo e questionar como a criança percebe os sentimentos das personagens, entre outras possibilidades. Assim, as mídias tornam-se um recurso para a interação e a aprendizagem. Além disso, é contraindicado o uso de mídias digitais para acalmar a criança quando ela chora ou faz birras, ou para reforçar comportamentos, como por exemplo: "Se você fizer o dever de casa, poderá usar o celular".

Diante do exposto, entende-se que, embora diversos estudos mostrem que o uso de telas está relacionado a prejuízos para o desenvolvimento infantil, as mídias também podem ser um meio para momentos de diversão e potencial aprendizagem. Segundo pesquisas, as orientações que focam na restrição do tempo de tela não têm sido seguidas pelas crianças brasileiras. Por isso, é crucial estabelecer diálogos com as famílias para que as recomendações sejam adaptadas às suas realidades e necessidades. Assim, é possível pensar no melhor uso das mídias digitais, visando promover o desenvolvimento e o comportamento na infância.

Para mais informações sobre uso de telas na infância, acesse o Instagram do Grupo de Estudos e Pesquisa em Psicodiagnóstico Infantil da Universidade Federal de Goiás (@geppi.ufg) ou nos envie um e-mail (geppi.ufg@gmail.com).

 

* Mariana Cunha Rosa e Ana Julia Feitosa Stival são estudantes de Psicologia da UFG.

** Maíra Lopes Almeida é professora do curso de Psicologia da UFG.

 

Artigo Psicologia

Mariana Cunha Rosa, Maíra Lopes Almeida e Ana Julia Feitosa Stival (Foto: Arquivo Pessoal)

 

Referências

American Academy of Paediatrics. (2016). Media and Young Minds. Pediatrics, 138(5). https://doi.org/10.1542/peds.2016-2591

Almeida, M.L. & Frizzo, G.B. (2021). Mídias digitais e qualidade da interação mãe-bebê: revisão de literatura. Saúde e Desenvolvimento Humano, 9(3), 1-10. https://doi.org/10.18316/sdh.v9i3.7513

Azevedo, E. C., Riter, H. da S., Pieta, M. A. M., & Frizzo, G. B.. (2022). Digital Media use on Interactions Between Mother and Child: Differences in Infants’ Early Years. Paidéia (ribeirão Preto), 32, e3210. https://doi.org/10.1590/1982-4327e3210

Fitzpatrick, C., Binet, M. A., Cristini, E., Almeida, M.L., Bégin, M. & Frizzo, G. B. (2023). Reducing harm and promoting positive media use strategies: new perspectives in understanding the impact of preschooler media use on health and development. Psicologia: Reflexão e Crítica, 36(19). https://doi.org/10.1186/s41155-023-00262-2

Nobre, J. N. P., Santos, J. N., Santos, L. R., Guedes, S. da C., Pereira, L., Costa, J. M., & Morais, R. L. de S.. (2021). Fatores determinantes no tempo de tela de crianças na primeira infância. Ciência & Saúde Coletiva, 26(3), 1127–1136. https://doi.org/10.1590/1413-81232021263.00602019

Sociedade Brasileira de Pediatria. (2019). Manual de Orientação #MenosTelas #MaisSaúde. Recuperado de https://www.sbp.com.br/fileadmin/user_upload/_22246c-ManOrient_-__MenosTelas__MaisSaude.pdf

 

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Fonte: FE

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