
Câmeras revelam vida selvagem em corredor ecológico goiano
Projeto Bandeiras no Corredor traz registros inéditos e conflitos entre animais selvagens e domésticos
Um dos registros é de um tamanduá-bandeira fêmea com o filhote, que aprende a ser independente (Imagem: Reprodução)
Luiz Felipe Fernandes
O projeto Bandeiras no Corredor, uma iniciativa de monitoramento da fauna silvestre, acaba de divulgar novos dados de suas campanhas de campo realizadas em fevereiro e maio de 2025. Coordenado por pesquisadores da Universidade Federal de Goiás (UFG), em parceria com a Aliança da Terra e a Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (Semad), o projeto revisou 74 câmeras instaladas nos Parques Estaduais da Serra de Caldas Novas (Pescan) e da Mata Atlântica (Pema), bem como no corredor que os conecta.
Trata-se de um monitoramento inédito e sistemático da fauna de mamíferos e aves terrestres, que ocorre desde julho de 2023 e abrange os biomas Cerrado e Mata Atlântica na região Sudeste goiana. Os registros mais recentes mostram interações sociais e comportamentos curiosos da vida selvagem, o que é possível porque os pesquisadores utilizam o modo vídeo e não somente fotografia para os registros.
Entre os destaques, foram flagradas duas jaguatiricas (Leopardus pardalis) adultas simultaneamente em uma área florestal, às margens de um riacho, sugerindo uma possível interação entre elas. A espécie é um importante predador na comunidade de mamíferos nos biomas Cerrado e Mata Atlântica. Outro grande felino, a onça-parda (Puma concolor), foi capturada desfilando tranquilamente durante o dia em frente a uma das câmeras.
Os tamanduás-bandeira (Myrmecophaga tridactyla) também foram protagonistas dos registros. Uma câmera documentou uma fêmea com seu filhote, que já está crescido e andando ao lado da mãe, aprendendo a ser independente.
Em outra ocorrência, na região do corredor, um vídeo mostra um tamanduá-bandeira bebendo água em um fio d'água, um registro que, segundo os pesquisadores, mostra a importância da manutenção desses cursos nas matas das propriedades rurais. Além disso, dois tamanduás-bandeira adultos foram vistos juntos em outra área, o que pode indicar a presença de um casal, já que são animais solitários.
Veja abaixo alguns dos registros:
As amostragens recentes foram ricas em registros com mais de um indivíduo. Os cachorros-do-mato (Cerdocyon thous) também apareceram em casal, e as imagens permitiram observar o comportamento de caça típico da espécie. Os catetos (Pecari tajacu) foram registrados em dupla, demonstrando uma interação social, se esfregando uns nos outros para reforçar os elos existentes em seus grupos numerosos.
Em termos de comportamento individual, um gato-maracajá (Leopardus wiedii) foi visto afiando as garras em um tronco. Uma novidade no monitoramento foi o primeiro registro de um gavião-de-rabo-branco (Geranoaetus albicaudatus) pelas câmeras do projeto.
Pesquisadora ajusta armadilha fotográfica; 74 câmeras estão instaladas no corredor no Sudoeste goiano (Foto: Divulgação)
Conflitos
No entanto, o monitoramento também revelou interações preocupantes e impactos negativos sobre a fauna nativa. Em um dos vídeos (abaixo), a mesma câmera que registrou a fêmea de tamanduá-bandeira com seu filhote capturou um grupo de cachorros domésticos atacando um tamanduá-bandeira adulto, que tentava fugir enquanto era perseguido e cercado. Era uma fêmea, que estava com um filhote de menos de um mês nas costas.
A pesquisadora do Programa de Pós-Graduação em Ecologia e Evolução (PPGECOEVOL) da UFG Alessandra Bertassoni explica que essa interação de conflito é ruim para as duas espécies, pois o potencial de desdobramentos negativos é grande, como levar a fatalidades para ambas as espécies. Registros de outras campanhas mostraram um cachorro-do-mato em estado avançado de alopecia, uma condição de perda de pelos normalmente associada a sarna transmitida por cachorros.
"Esses dados são tão importantes porque demonstram interações conflitivas entre fauna silvestre e animais domésticos e como isso pode afetar a saúde populacional dos indivíduos", alerta Alessandra, que coordena o projeto junto com o professor Paulo de Marco Jr., do Instituto de Ciências Biológicas (ICB) da UFG.
Para os pesquisadores, "o monitoramento contínuo da fauna nesta região abre diversas possibilidades de investigação científica, aumentando o conhecimento sobre as espécies e entendendo melhor sua ecologia e comportamento, bem como os impactos aos quais elas podem estar expostas". Além disso, subsidia a Semad com informações científicas de alta qualidade para o estabelecimento futuro do corredor ecológico entre Pescan e Pema.
Do ponto de vista acadêmico, o projeto já treinou mais de 15 estudantes da UFG para as práticas de campo e uso da tecnologia das armadilhas fotográficas, seis estudantes realizam iniciação científica com esses dados e há uma tese de doutorado em desenvolvimento.
Voluntária Marisa Novaes, pesquisador Cristiano Machado, estudante de IC Mariana Pereira e pesquisadora Alessandra Bertassoni (Foto: Divulgação)
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Fonte: Secom UFG
Categorias: Conservação Ciências Naturais ICB Destaque