
Novo modelo EaD traz desafios às licenciaturas
Exigência de 50% de carga horária presencial pode prejudicar estudantes
Modalidade EaD terá um limite mínimo de 20% de atividades presenciais e/ou síncronas mediadas (Foto: MCTIC)
Piter Salvatore
O governo federal instituiu, em 19 de maio de 2025, a nova política para a Educação à Distância (EaD) por meio do Decreto 12.456/2025. A medida estabelece novas regras para a oferta de cursos, cria o modelo semipresencial e veda a oferta de certas graduações na modalidade à distância. Para a Universidade Federal de Goiás (UFG), as mudanças são pontuais, mas podem afetar alguns perfis de estudantes que dependem do ensino remoto.
Na UFG, a transição será gerenciada pelas unidades acadêmicas e pelo Centro Integrado de Aprendizagem em Rede (Ciar), que atuará no suporte, orientação e capacitação de servidores envolvidos nesse processo.
A nova política redefine as modalidades de ensino. O formato presencial permite até 30% da carga horária em EaD. O semipresencial deve ter, no mínimo, 30% de atividades presenciais físicas definidas pelos docentes e ao menos 20% em atividades presenciais ou síncronas mediadas. Já a modalidade EaD terá um limite mínimo de 20% de atividades presenciais e/ou síncronas mediadas, com provas obrigatoriamente presenciais, com exceção das licenciaturas, que passam a ter a exigência de 50% de atividades no formato presencial, o que não era obrigatório anteriormente.
O decreto também uniformiza as definições de atividades síncronas e assíncronas. As síncronas ocorrem com professores e alunos em locais diversos, mas em tempo coincidente, enquanto as assíncronas acontecem em tempos e lugares distintos, sem a obrigatoriedade de estar em sala de aula ou em companhia com o docente.
O diretor do Ciar, Wagner Bandeira, acredita que as demandas em relação à nova política serão baixas, e que a UFG já possui um histórico positivo com a EaD. "Nós não chegamos a ter, necessariamente, uma demanda tão grande de cursos que queiram ser semipresenciais. Na verdade, é um trabalho que a gente pretende fazer para orientar e, de repente, tornar isso uma opção viável para cursos que enxerguem isso como uma possibilidade".
Cursos restritos
Algo novo que a política implementa é a proibição da oferta totalmente à distância para determinados cursos. Graduações em Medicina, Direito, Odontologia, Enfermagem e Psicologia deverão ser, exclusivamente, presenciais. Além disso, os cursos da área da saúde e as licenciaturas não poderão ser ofertados em EaD, apenas nos formatos presencial ou semipresencial.
A decisão é vista criticamente pelo representante do Ciar. "A gente questiona esses cinco, ou por que só esses cinco. O que determina que eles sejam tão diferenciados assim? Subjacente a essa decisão, está a ideia de que a EaD não tem qualidade, o que é algo que a gente vem combatendo há muito tempo".
As instituições terão um período de dois anos para a adaptação ao novo modelo. Os estudantes já matriculados em cursos EaD poderão concluir a graduação no formato em que ingressaram.
Impacto na UFG
Segundo o diretor do Ciar, a UFG nunca teve a modalidade semipresencial, o que exigirá uma adaptação nos Projetos Pedagógicos de Curso (PPCs) que optarem por este modelo. O Ciar estará à frente para mediar as adaptações dos PPCs, "seja no formato, seja na definição do sistema de avaliação, dos encontros presenciais, do material pedagógico e principalmente do uso do ambiente de aprendizagem", comenta Wagner.
O diretor ainda avalia que o decreto traz mais clareza aos parâmetros de qualidade da EaD, que antes não eram tão explícitos. "O decreto deixa muito claro que essa categoria [100% EaD] não é permitida", afirma, ressaltando que a UFG já seguia essa filosofia antes mesmo da nova legislação.
Wagner Bandeira, diretor do Centro Integrado de Aprendizagem em Rede (Foto: Gusthavo Cardoso)
Desafios das licenciaturas
Um ponto de preocupação destacado pelo diretor do Ciar é a situação das licenciaturas. Uma resolução de 2024, anterior ao novo decreto, determina que esses cursos tenham 50% de sua carga horária em atividades presenciais, o que corresponde a 1.600 horas. "Você praticamente inviabiliza a sua caracterização como EaD", comenta Wagner, defendendo que a principal vantagem do ensino remoto é a interiorização.
"Você dá acesso a pessoas que moram em regiões muito afastadas e que não teriam condições, por exemplo, de estar em Goiânia regularmente para estudar presencialmente", argumenta. Para o gestor, uma presencialidade de até 30%, como no novo modelo semipresencial, seria mais viável às licenciaturas, pois poderia incluir estágios, pesquisas e atividades de extensão realizadas nos próprios territórios municipais dos alunos.
Ainda de acordo com o diretor, o perfil dos discentes que podem ser afetados pela política é singular. "Estamos falando de moradores de regiões bem distantes, como Uruana, Itumbiara e outros estados. Como é que eles viajam para Goiânia toda semana para ter aula? Ou como é que você vai ficar um mês morando em Goiânia? Não dá. Para muitas pessoas, não dá".
Em alguns casos, mesmo para os alunos que residem em Goiânia, a educação à distância significa o único acesso possível ao nível superior. "Algumas mães de família não têm condições de sair de casa", aponta Wagner, chamando atenção para a estrutura machista de alguns núcleos domiciliares. O gestor também menciona aqueles estudantes ativos em negócios próprios que não podem fechar, assumindo o EaD como opção.
Mediador pedagógico
A nova política cria a figura do mediador pedagógico, que substitui o antigo tutor. No entanto, a implementação desse novo cargo é vista como um desafio. O diretor do Ciar aponta que não há clareza sobre como essa contratação ocorreria na prática, já que a categoria profissional sequer existe no quadro da Universidade. "É uma lacuna que a gente precisa preencher", diz.
Atualmente, nos cursos EaD institucionalizados, o mediador pedagógico é o próprio professor da disciplina ofertada, que ocupa duas funções. Esse perfil pode esbarrar em alguns impasses, como aponta Wagner.
"Vamos imaginar que a gente tivesse um polo em Caldas Novas e um polo em Cidade Ocidental. As duas cidades estão significativamente distantes entre si. É muito difícil para um professor, que esteja sediado em Goiânia, acompanhar as atividades presenciais desses cursos".
Do ponto de vista do diretor, o decreto é também uma resposta do Ministério da Educação (MEC) à precarização do ensino à distância por parte de algumas instituições privadas, que adotam um modelo "totalmente massificado", com uma carga abrangente de aulas gravadas, provas on-line e textos.
"Quando se fala em EaD, as pessoas sempre associam à ideia de que é 100% remoto, como foi na pandemia, e não é assim", pontua. Ele ainda cita como exemplo o curso remoto de Licenciatura em Artes Visuais, cujas atividades práticas, como escultura e desenho, ocorrem nos ateliês da Universidade.
Além desse curso, a UFG conta com os cursos do programa da Universidade Aberta do Brasil (UAB), criado pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes). Nesta última modalidade, encontram-se várias graduações, que estão listadas aqui.
Comissão interna
Para se adequar à nova legislação, a UFG montou uma comissão interna com representantes de diversas Pró-Reitorias e Câmaras, sob a coordenação do Ciar. O grupo tem a tarefa de discutir e propor as novas diretrizes da EaD na Universidade à luz do decreto.
Os trabalhos estão em fase inicial e uma das pautas será definir se as licenciaturas migrarão para o modelo semipresencial ou se manterão o formato a distância, adaptando-se à exigência de 50% de carga horária presencial. Outro ponto será a atualização das políticas internas da educação à distância na UFG.
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Fonte: Secom UFG
Categorias: educação Institucional Ciar Notícia 1