Periódicos predatórios são risco à credibilidade da ciência
Cultura do "Publicar ou Perecer" dificulta o combate a esses periódicos
Kharen Stecca
O Sçavans foi o primeiro jornal científico fundado em 1665 e marca o início das comunicações científicas no mundo. Ele surge com o crescimento da necessidade da ciência de comunicar a outros cientistas seus resultados. De lá para cá esses veículos foram se aprimorando com um grande desenvolvimento a partir da 2ª Guerra Mundial. Com o crescimento também houve a necessidade de filtros e classificações e esses veículos foram ficando cada vez mais complexos. Nesse contexto, surgem também os problemas como periódicos que não estão preocupadas com a qualidade das comunicações científicas publicadas, apenas explorando os pontos fracos de um sistema que exige dos pesquisadores a lógica do “publicar ou perecer”.
Com essa perspectiva histórica até o cenário atual, a pesquisadora Cintia Maria Lanzarini Gouy., Tecnologista do Instituto Nacional de Câncer e doutoranda no tema na Fiocruz, realizou no dia 17 de outubro pela manhã a palestra "Periódicos Predatórios e o impacto da credibilidade da ciência". O evento abriu a manhã de discussões da 5ª edição do Seminário de Integridade Acadêmica da Universidade Federal de Goiás, realizado no Instituto de Patologia Tropical e Saúde Pública (Iptsp-UFG) nos dias 16 e 17 de junho.
O modelo de comunicação científica, como explica a pesquisadora, tornou-se um ativo comercial a partir da 2ª Guerra Mundial. Com o aumento do número de periódicos, os bibliotecários criaram os índices de impacto para auxilar na organização e seleção dos periódicos. A partir dos anos de 1990, com o acesso à internet, o formato de publicação evoluiu para o meio online, impulsionando o movimento da Ciência Aberta, que defende o acesso imediato e transparente ao conhecimento científico, desafiando a barreira das assinaturas pagas (paywalls).
Características Predatórias
Diante desse cenário de lucro, segundo a pesquisadora, os periódicos predatórios prosperam no cenário de alta cobrança por publicação. Ela ressalta que esses veículos são caracterizados por não cumprir os critérios de práticas editoriais nem oferecer a qualidade científica esperada, muitas vezes prometendo, mas não realizando, a revisão por pares.
Eles buscam atender à necessidade do pesquisador de publicar rapidamente. Segundo ela, esses periódicos tentam enganar os autores utilizando nomes de revistas muito similares a publicações já conhecidas ou usando nomes exagerados (como "Jornal Internacional"). “Os sites podem ser tanto muito precários quanto imitações de sites de periódicos renomados. Um sinal de alerta crucial é a promessa de um processo de submissão e revisão extremamente rápido (como 48 horas ou poucos dias), o que é incompatível com uma revisão por pares legítima”, afirmou. Além disso, embora operem em acesso aberto, cobrando taxas de processamento de artigos (APCs), eles exigem que o pagamento dessas taxas seja feito como condição para a submissão, e não no final do processo editorial, como é a prática correta.
Mas porque algumas pessoas cientes desse problema, publicam nesses periódicos? Segundo um artigo apresentado pela palestrante há diversos motivos, entre eles o pesquisador ficar lisonjeado com os elogios que o email traz a sua pessoa ou seu artigo. Outros pela necessidade de publicar de forma rápida para cumprir métricas e manutenção de vínculos empregatícios e para obtenção do diploma (já que este costuma ser critério para programas de pós-graduação).
Termo
O termo "periódicos predatórios" surgiu a partir da iniciativa de um bibliotecário chamado Jeffrey Beall. Beall criou um blog para listar periodicamente aqueles que ele desconfiava não seguirem as boas práticas editoriais. No entanto, devido à ausência de regras precisas para configurar um periódico como predatório e às perseguições sofridas, Beall encerrou sua lista em 2017. Mesmo assim, essas listas ainda são realizadas em outros veículos e podem ser encontradas na internet, afirma Cíntia.
Cuidados
Segundo Cíntia, para evitar cair na armadilha de uma publicação predatória, é fundamental que o pesquisador adote uma postura cautelosa e investigativa, dedicando tempo à escolha do periódico.
- Desconfie de e-mails de convite elogiosos que prometem um processo editorial em pouquíssimos dias;
- Uma ferramenta útil recomendada pelo Comitê de Ética em Publicação (COPE) é o Think Check Submit (Pense, Verifique, Submeta), disponível em português.
- Consulte seu orientador sobre a escolha de periódicos adequados;
- Verifique as informações da revista;
- Confira o email do editor-chefe: se é um email profissional, qual é a sua afiliação institucional e se ele está vinculado a outras revistas;
- Confirme se o periódico possui regras editoriais claras, especialmente sobre alegações de má conduta;
- Verifique o prazo de publicação e como se dá o processo de revisão por pares; prazos curtos (como 4 a 5 dias) são um forte indicador de que a revisão por pares não ocorre de forma correta;
- Confirme a veracidade das informações de indexação e do Fator de Impacto que a revista alega possuir.
- Consulte diretórios de acesso aberto, como o DOAJ, para verificar a indexação do periódico;
Evite revistas que exigem o pagamento da APC no início do processo editorial.
V Seminário de Integridade Acadêmica da UFG
Com o tema “Ética na Comunicação e na Divulgação Científica”, a quinta edição do Seminário de Integridade Acadêmica. A programação foi estruturada para discutir os principais desafios atuais do meio científico. O evento é organizado pelo Comitê de Integridade Acadêmica (CIA) da Universidade Federal de Goiás, órgão colegiado interdisciplinar vinculado à Pró-Reitoria de Pesquisa e Inovação (PRPI). Foi formado em julho de 2015, tendo representação de todas as áreas do conhecimento, das pró-reitorias e dos comitês de ética da UFG. Sua vinculação, composição e competências estão definidas pela Resolução Consuni 10/2018.
Fonte: Secom UFG
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