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Universidade Federal de Goiás
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Da greve ao gosto pelo trabalho

Em 16/06/10 07:40. Atualizada em 21/08/14 11:45.
Veja novos trechos da Mesa-redonda que discutiu as relações de trabalho em três diferentes visões: do Direito, da Filosofia da Educação e da Administração

Por Josete Bringel, Kharen Stecca, Marcela Guimarães e Patrícia da Veiga (Rádio Universitária e Ascom/UFG)

 

A Mesa-redonda do Jornal UFG em parceria com a Rádio Universitária tratou, este mês, das relações de trabalho. Participaram o professor da área de Filosofia da Faculdade de Educação, Ildeu Moreira Coelho, o professor Milton Márcio Heinen, da Faculdade de Direito, e a professora Flávia Regina Czarneski Vieira, da Faculdade de Administração e Ciências Econômicas. Tema controverso e complexo, abrange desde o campo pessoal até a luta de classes. Confira trechos especiais da entrevista em que os professores fazem um panorama das relações do mundo do trabalho:


Aproveitando o fato da paralisação dos motoristas do transporte coletivo ocorrida no dia 26 de abril, dia da entrevista] perguntamos: por que algumas categorias conseguem evoluir nas relações trabalhistas, enquanto outras, como a dos motoristas, têm uma relação tão dura? 

Milton Heinen: É preciso entender que a greve tem uma trajetória histórica: de crime, de proibição é, hoje, uma garantia constitucional. Esse é o princípio básico. É historicamente uma ferramenta para a conquista de direitos mínimos, de dignidade. O 1º de Maio tem exatamente esse sentido, uma construção histórica, que custou o sangue de muita gente para se chegar a condições mais dignas de trabalho. A greve é um instrumento para isso. O fato é que, historicamente, nós temos práticas sindicais em que a forma de atuar das lideranças é muito distinta. Às vezes, em razão do tipo de atividade, é mais difícil haver reivindicações que surtam efeitos. Talvez a categoria não tenha encontrado a forma mais eficaz de fazer sua reivindicação. E cada categoria tem sua forma de fazer a greve. No exercício do seu direito há uma série de condicionamentos, uma decisão coletiva, comunicação prévia, um percentual mínimo de serviços essenciais funcionando, que é o que a legislação estabelece. Mas, ainda assim, há setores que em um ou dois dias de greve conseguem sentar à mesa e, com maturidade é possível negociar aspectos mínimos que levem a um consenso e o retorno ao trabalho. Em outros setores é muito mais difícil. É o caso do serviço público, por exemplo. Às vezes, ocorrem greves de dois ou três meses que não surtem nenhum resultado prático. Por que isso ocorre? Por que não dói no bolso de ninguém especificamente? Não dói diretamente, mas, a rigor, o contribuinte está pagando por isso. Há uma irresponsabilidade também da parte de quem deveria sentar à mesa e negociar, discutir direitos com aquele setor e não senta. No transporte público, há um problema reiterado. Quase todos os anos temos esse movimento e não há mudança. Há uma insatisfação da categoria, em relação à carga horária excessiva, não cumprimento de garantias e na hora da greve, não há maturidade para sentar à mesa e buscar a solução. O transporte coletivo é um serviço público prestado por concessão. O particular não pode apenas visar o lucro. É preciso qualidade para o serviço e dignidade mínima para o trabalhador.


Quem tem esse direito de greve hoje em dia?

Milton Heinen: Todas as categorias têm o direito de greve garantido na Constituição, com exceção do policial militar, que tem uma regra específica que os proíbe de se sindicalizar e de realizar greves. Aí, ele não faz greve, ele fica aquartelado. As mulheres fazem panelaço, mas não há greve. Há outras formas de reivindicar, mas oficialmente é a única categoria que não tem direito de greve. Em outros setores, a greve é uma garantia.

 

Hoje não se ouve falar de greve no setor privado. Por quê?

Flávia Regina: Porque existe uma oferta muito grande de trabalhadores e poucos postos de trabalho. No entanto, existem muitas vagas que não são preenchidas por falta de trabalhadores qualificados. Então, ao mesmo tempo em que faltam vagas de trabalho, existem postos de trabalho sem trabalhadores para assumir. Existe uma discrepância nesse sentido.


Os bancos ainda fazem greve, mesmo sendo privados, não é professora?

Flávia Regina: Sim, no setor bancário há greves. Mas, na verdade, os trabalhadores recuam desse direito, em virtude do medo de perder o emprego.



É possível conciliar trabalho, carreira e satisfação pessoal? É possível gostar de trabalhar todos os dias?

Ildeu Moreira: Em princípio, sim. Mas a sociedade é contraditória e as coisas nem sempre ocorrem assim e cada um responde de acordo com sua classe, sua área de trabalho. É ruim falar de caso pessoal, mas eu tenho paixão pelo magistério, o que não significa que não seja estressante, que não seja muito duro, que não exija mais do que devia e até dificulte a vida pessoal. Vamos criando uma teia de relações com o trabalho, que não é formal, tal como eu entendo. Muitos ex-alunos meus já foram meus chefes. Faço meu trabalho com prazer. Mas, para isso, eu estudo uma média de 50 a 60 horas todas as semanas. Cada um tem uma forma de trabalhar e isso varia de acordo com o tipo de trabalho e de acordo com cada pessoa.


Flávia Regina: Eu acredito que, na vida, a satisfação vem do equilíbrio. Se eu me dedicar só à carreira, o equilíbrio será afetado. Se eu me dedicar só à vida pessoal, será da mesma forma, pois não terei independência financeira. Em administração temos o termo workaholic, para aquele que trabalha em excesso. Isso não traz satisfação para a sua vida. O que traz satisfação é o equilíbrio. Acredito que ninguém gosta de trabalhar todos os dias. Seria até utópico. O problema é estar de mau humor todos os dias. Isso, sim, é um problema. Agora, um dia acordar e dizer, nossa, hoje eu estou com preguiça, não estou com vontade de trabalhar, isso é normal.

 

Confira o conteúdo impresso no Jornal UFG, aqui. 

Fonte: Josete Bringel, Kharen Stecca e Patrícia da Veiga