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Universidade Federal de Goiás
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... enquanto alguns foram à Lua, muitos nunca foram à escola

Em 20/04/11 00:09. Atualizada em 21/08/14 11:45.
Professora da Faculdade de Educação fala sobre letramento digital e aprendizagem em rede

 


 

Patrícia da Veiga


 

O mundo caminha para uma completa digitalização, mas isso não quer dizer que todas as pessoas terão acesso a ela. Os seres humanos vêm fazendo do advento da tecnologia o ápice de sua interação com a natureza, mas isso não significa que o planeta tenha ficado melhor. Esse paradoxo é lembrado pela professora da Faculdade de Educação (FE) Débora Duran, especialista em observar o uso das novas tecnologias nas escolas. Ela lançou, no fim do ano passado, o livro Letramento digital e desenvolvimento: das afirmações às interrogações. Nesta entrevista, que é continuação de matéria publicada no Jornal UFG n° 44, de abril de 2011, a professora rebate a ideia de que a adesão às novas tecnologias da informação e da comunicação (TIC) represente, pura e simplesmente, acesso a um bem-estar coletivo. Muito pelo contrário, diz ela, é preciso observar os seres humanos e suas mediações, tendo em vista as demandas e os paradoxos do sistema econômico.

 

 

Relacionar produção de tecnologia e desenvolvimento humano é um mito?
As TIC podem contribuir para, mas não podem garantir, por si mesmas, o desenvolvimento cognitivo e tampouco o desenvolvimento social. Ao contrário do ideário corrente, não existem garantias de que o letramento digital trará em sua esteira a empregabilidade, a mobilidade social e a solidariedade. Da magnitude dos foguetes à invisibilidade da nanotecnologia, do peso das armas à leveza dos bits (informação digital e genética), estamos imersos num mundo que tende à digitalização. Apesar dos avanços, enquanto alguns foram à Lua, muitos nunca foram à escola. Ainda longe de ser cumprida, a promessa tecnológica de bem-estar social e progresso não é uma realidade para todos os seres humanos, mas um privilégio de poucos. Os desenvolvimentos, em sentido plural, não podem ser reduzidos aos produtos tecnológicos, pois estão atrelados a processos de caráter político.

Que interesses econômicos estão envolvidos na corrida pela “democratização” das novas tecnologias nas escolas?
Apesar de sua legitimidade como compromisso urgente da agenda política, o discurso da denominada inclusão digital (ID) também está atrelado aos interesses do mercado. A infraestrutura informática e telemática aponta para a venda de equipamentos, programas e diversos serviços de telecomunicação, de manutenção e de suporte, entre outros. É por essa razão, muito mais do que pela suposta democratização, que o acesso aos computadores e à Internet tem sido franqueado a um número cada vez maior de consumidores.

De que modo se deve olhar para iniciativas como o projeto Um Computador por Aluno (PROUCA)?
A meu ver, a iniciativa é legítima. Na realidade, o PROUCA prevê a disponibilização de computadores e, mais do que isso, está ancorado num projeto de formação continuada de professores. Contudo, entre boas intenções e boas realizações há uma distância muito grande. A intenção é válida, mas como afirmei anteriormente, o desenvolvimento (em suas múltiplas dimensões) e a tão almejada inclusão social não são uma consequência direta da instrumentalização tecnológica. O uso dos computadores e o acesso às redes pode ser um dos pontos de partida, mas as mediações humanas é que serão as grandes responsáveis pelos rumos que o projeto poderá - ou não - tomar em cada um dos contextos nos quais se insere. Não podemos esperar, a partir de processos diferentes, os mesmos produtos. Na perspectiva do letramento digital, os computadores por si sós não podem ser tomados como os responsáveis pelas transformações na educação. Vale sempre lembrar que revolução tecnológica não é sinônimo de revolução pedagógica.

 

O governo federal tem destinado boa parte do orçamento da Educação para a formação continuada de professores. Nessa ação, um curso que tem recebido atenção especial desde 2006, quando foi criado, é o Programa Mídias na Educação. Como interpretar essa iniciativa, na sua opinião?
O programa Mídias na Educação é uma iniciativa do governo federal, na modalidade a distância, voltado à formação continuada dor professores da educação básica. Em linhas gerais, trata-se de uma proposta que visa a discussão sobre a utilização pedagógica das diferentes mídias na escola. Apesar da legitimidade da proposta, vale lembrar que as questões atreladas às mídias e à educação são muito complexas. Ainda que o uso pedagógico das mídias nos contextos educativos seja uma necessidade em tempos de cibercultura, também precisamos dedicar especial atenção à reflexão sobre a “educação nas mídias”, isto é, os modos pelos quais as questões educacionais são abordadas e retratadas nos diferentes meios de comunicação. Quais são as pautas discutidas nos jornais? Que assuntos comparecem no teor das notícias da TV? E as matérias das revistas, como abordam os problemas da educação? A partir de quais perspectivas? Do mesmo modo, além da “educação com as mídias” e da “educação nas mídias”, também precisamos discutiras questões relacionadas à educação para as mídias. O uso pedagógico das mídias é importante, mas também precisamos pensar na formação de cidadãos que sejam capazes de se posicionar criticamente diante do turbilhão de informações e imagens que circulam em nossos dias.


 

 

Fonte: Ascom/UFG