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Universidade Federal de Goiás
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Além da fronteira

Em 01/06/16 12:10. Atualizada em 08/06/16 10:24.

Programa do Governo Federal foi responsável pela intensificação da mobilidade internacional de estudantes de graduação da UFG

Luiz Felipe Fernandes

Responsável pelo envio de milhares de estudantes de graduação brasileiros para intercâmbio em universidades no exterior, o Programa Ciência sem Fronteiras chegou em 2016 prejudicado pela crise econômica e política que se instalou no país e que afeta diretamente programas voltados às instituições de ensino superior. Considerado uma iniciativa surpreendente, há muito o que comemorar em seus cinco anos de existência, ainda que problemas possam ser apontados.

Na Universidade Federal de Goiás (UFG), o Ciência sem Fronteiras deu continuidade ao crescimento da mobilidade internacional de estudantes de graduação. Há pouco mais de uma década, o número de graduandos da UFG em intercâmbio no exterior mal passava de uma dezena. Programas como o Erasmus Mundus, o Bolsas Luso-Brasileiras Santander Universidades, o Capes/Brafitec e o Capes/Brafagri, assim como parcerias como a estabelecida com o Instituto Politécnico de Bragança, alteraram esse cenário. O Ciência sem Fronteiras intensificou ainda mais esse crescimento.

Em 2015, 477 alunos da Universidade estavam em instituições de outros países – a maioria (78%) pelo Ciência sem Fronteiras. Se antes a mobilidade se restringia à Europa e à América do Norte, a partir de 2012 observou-se maior diversificação desses destinos, com intercâmbios para Ásia e Oceania. A UFG, com sua integração à Associação das Universidades Grupo Montevidéu (AUGM) e participação em programas como o MARCA, direcionou ainda mais estudantes para a América Latina.

Estudantes da UFG que fizeram parte do programa do governo federal ou que ainda estão no exterior relatam experiências acadêmicas e pessoais únicas. Em julho de 2013, Pedro Henrique Rodrigues, 23, foi para a Universidade de Toronto, no Canadá. Estudante de Engenharia Química, sua primeira experiência em solo estrangeiro durou um ano e meio. Ele conta que o nível de dificuldade do curso era alto, assim como a exigência dentro e fora da sala de aula. Também teve de enfrentar o rigoroso inverno canadense, com temperaturas abaixo dos 20 graus negativos. “Severo, porém contornável com um aquecedor e um bom casaco”, ameniza.

 

 Pedro Henrique estudou Engenharia Química na Universidade de Toronto, no Canadá

Pedro Henrique estudou Engenharia Química na Universidade de Toronto, no Canadá

 

Pedro destaca como pontos positivos o programa de recepção e acompanhamento da universidade para os estudantes do Ciência sem Fronteiras, além do contato com um país multicultural, o que facilitou a adaptação e o ensinou a respeitar as diferenças e a trabalhar em conjunto. “Foi a experiência que mais marcou minha vida pessoal e profissional. O fato de estar em outro país e sozinho tornou tudo mais difícil, mas a exploração de novas fontes de conhecimento resulta num enriquecimento cultural e profissional único”.
 

 Além da formação acadêmica, Lia Wentzel destaca o crescimento cultural durante intercâmbio na Alemanha

Além da formação acadêmica, Lia Wentzel destaca o crescimento cultural durante intercâmbio na Alemanha

 

Mergulho Cultural

O inverno também foi um dos obstáculos da bióloga Lia Wentzel, 24. Em agosto de 2012, então estudante de Ciências Biológicas, ela foi para a Universidade Técnica de Munique, na Alemanha, onde ficou por um ano e três meses. Na estação em que às quatro da tarde já escurece, Lia conta que se sentiu deprimida nas duas primeiras semanas. Saudade mesmo foi do arroz e feijão diários, da pamonha e do pequi. “Tanto é que quando minha mãe foi me visitar, levou pequi em conserva”, recorda.

Apesar de saber alemão, ela conta que no primeiro semestre sentiu dificuldade para acompanhar as aulas, o que não impediu a compreensão do conteúdo. Além das aulas normais, Lia fez estágio no Laboratório de Ecologia Microbiana da Universidade, conheceu novas técnicas, aprendeu mais sobre Biologia Molecular e viu que era com isso que realmente queria trabalhar. De volta ao Brasil, atualmente faz mestrado em Microbiologia Aplicada. Ela também destaca o mergulho cultural proporcionado pela história do país, pelos museus, pela pluralidade social e por estar no centro da Europa.

 

 Ainda nos EUA pelo Ciência sem Fronteiras, Joyce Mamede elogia a qualidade de ensino, com mais atividades extraclasse

Ainda nos EUA pelo Ciência sem Fronteiras, Joyce Mamede elogia a qualidade de ensino, com mais atividades extraclasse

 

Ainda vivendo a experiência de estudar no exterior, Joyce Mamede, 21, diz que o idioma continua sendo um desafio, especialmente por estudar Biologia e não estar familiarizada com terminologias e pronúncias de alguns termos em inglês. Ela está na Universidade de Washington, nos Estados Unidos, desde junho de 2015. “A qualidade de ensino na minha universidade é muito boa e eles têm um sistema de ensino diferente do que estou acostumada, com menor carga horária de aulas e mais atividades extraclasse. Não vejo mais o curso do mesmo modo e não vejo o mundo do mesmo jeito”.

Além do crescimento como estudante e profissional, Joyce brinca que voltará para o Brasil com o saldo de um namorado e inúmeros amigos. Isso para quem nunca tinha viajado nem para fora de Goiás. Ela afirma que está preparada para enfrentar qualquer desafio, assim como se sente muito mais capacitada como estudante. “Ampliei meus horizontes de uma maneira que jamais aconteceria se eu não tivesse aproveitado esta oportunidade”, comemora.

 

Meta alcançada

Iniciativa conjunta dos Ministérios da Educação (MEC) e da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI), o Ciência sem Fronteiras alcançou a meta de concessão de 101 mil bolsas de estudos entre 2011 e 2014. Deste total, 65.205 foram pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) e o restante pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq). Em 2015 e 2016 não foram concedidos novos benefícios, embora mais de 13 mil bolsas no exterior estejam sendo mantidas atualmente. O Ciência sem Fronteiras disponibiliza mensalidade, auxílio instalação, auxílio material didático, passagens aéreas e seguro saúde.

 

Visibilidade ao ensino superior brasileiro

Para a coordenadora de Assuntos Internacionais (CAI) da UFG, Ofir Bergemann, o Ciência sem Fronteiras proporcionou visibilidade ao ensino superior brasileiro no exterior. “Pesquisadores e estudantes brasileiros já eram bem vistos e a pós-graduação brasileira, muito respeitada, mas com o Ciência sem Fronteiras as universidades do exterior passaram a enxergar o ensino superior brasileiro na sua totalidade e diversidade”, ressalta.

Outro grande mérito do programa, segundo a coordenadora, foi a adoção da internacionalização do ensino como política do Ministério da Educação (MEC). Tanto que outras iniciativas foram criadas para dar suporte ao programa. Ela cita o Idiomas Sem Fronteiras, elaborado com o objetivo de proporcionar aos candidatos a programas de mobilidade oportunidades de acesso a universidades de outros países por meio do ensino de línguas estrangeiras. São oferecidos cursos presenciais e a distância, além da aplicação de testes de proficiência.

Entretanto, a coordenadora não deixa de questionar alguns pontos na execução do Ciência sem Fronteiras. Se por um lado o programa conseguiu disponibilizar milhares de vagas em universidades localizadas ao redor do mundo, por outro não conseguiu promover vigorosamente a consolidação de parcerias bilaterais, uma vez que as negociações dessas vagas são feitas exclusivamente pelo governo federal. Contudo, ela reconhece a dificuldade ou até a impossibilidade que seria, para as instituições, alocar grande quantidade de seus estudantes em boas universidades estrangeiras. Outro problema – corrigido ao longo dos anos – foi a falta de planos de estudo quando os primeiros estudantes foram enviados ao exterior.

Ofir Bergemann cita ainda o problema na formação acadêmica de estudantes que não tiveram a oportunidade de fazer disciplinas em suas áreas ou cujas disciplinas não foram aproveitadas ao retornarem ao Brasil. “Morar sozinho em outro país, o contato com outra cultura, o aprendizado de uma nova língua, tudo isso é muito rico como experiência pessoal, mas não necessariamente do ponto de vista acadêmico”. Ainda assim, o saldo é muito mais positivo. “Quando o aluno retorna, acaba proporcionando novas discussões sobre metodologias e projetos pedagógicos”, considera.

 

 Apesar da dificuldade em aproveitar o estágio, Marcus Forzani reconhece a contribuição do CsF para o ensino superior brasileiro

Apesar da dificuldade em aproveitar o estágio, Marcus Forzani reconhece a contribuição do CsF para o ensino superior brasileiro


Aproveitamento

Em 2012, Marcus Vinícius Forzani, 25, embarcou para os Estados Unidos pelo Ciência sem Fronteiras. Ele estudou na Missouri State University e fez estágio de três meses na Saint John’s University, em Nova York. Ele lembra que, logo ao chegar, teve a primeira surpresa: ele já havia feito todas as disciplinas disponíveis para a graduação em Biologia. Isso porque o edital permitia que estudantes com até 80% do curso concluído participassem do programa. Com autorização da Capes, pegou matérias destinadas ao início da pós-graduação.

Marcus também não conseguiu aproveitar os estágios que fez no laboratório de Fisiologia Microbiana, na Universidade do Missouri, e no laboratório de Genética Microbiana, na St. John’s. “Colegas do primeiro edital me disseram que seria impossível, já que não havia os documentos de estágio em inglês para os professores assinarem”. Por fim, alguns coordenadores de curso no Brasil não aceitaram a disciplina cursada no exterior, ainda que a ementa fosse praticamente a mesma.

Na avaliação de Marcus, o programa deveria eleger suas prioridades e selecionar melhor os candidatos. Ele cita, por exemplo, estudantes que não possuíam o domínio necessário do idioma e, assim, tinham dificuldades nas disciplinas. “O programa deveria observar o currículo dos candidatos e se o aluno do Ciência sem Fronteiras estava de fato cursando as matérias de sua grade curricular”, considera. Para ele, pelos objetivos elegidos pelo governo com o programa, claramente ele se enquadra melhor para a pós-graduação.

Ainda assim, Marcus reconhece a contribuição do Ciência sem Fronteiras para a internacionalização das universidades brasileiras. Pessoal e profissionalmente, ele descreve a experiência como “maravilhosa, indescritível e impagável”. “Um intercâmbio muda a vida de qualquer um”, conclui.

 

Da UFG para o mundo

A mobilidade internacional de estudantes de graduação da UFG deu um salto em uma década. Em 2003, 12 alunos de graduação fizeram intercâmbio no exterior. Esse número chegou a 530 em 2014, auge do programa Ciência sem Fronteiras.

2012
Total de estudantes em mobilidade: 252.
Pelo Ciência sem Fronteiras: 138 (55% do total).
Principais destinos: Portugal, Estados Unidos e Espanha.
Principais cursos contemplados: Engenharia Civil, Ciências Biológicas e Farmácia.

2013
Total de estudantes em mobilidade: 400.
Pelo Ciência sem Fronteiras: 278 (70% do total).
Principais destinos: Estados Unidos, Portugal e Canadá.
Principais cursos contemplados: Agronomia, Engenharia Civil e Ciências Biológicas.

2014
Total de estudantes em mobilidade: 532.
Pelo Ciência sem Fronteiras: 417 (78% do total).
Principais destinos: Estados Unidos, Reino Unido e Portugal.
Principais cursos contemplados: Engenharia Civil, Engenharia Elétrica e Agronomia.

2015
Total de estudantes em mobilidade: 477.
Pelo Ciência sem Fronteiras: 376.
Principais destinos: Estados Unidos, Reino Unido e França.
Principais cursos contemplados: Engenharia Civil, Engenharia Elétrica e Arquitetura e Urbanismo.

Categorias: #Universidade Edição 79