Fazenda incentiva a produção orgânica
Projeto desenvolvido por professor da UFG trabalha na conscientização para a produção e consumo
Luciana Gomides
Os benefícios da produção orgânica vêm sendo amplamente discutidos nos últimos anos. Em artigo publicado no portal Planeta Orgânico, a nutricionista Mara Cristina de Sousa Miranda conceitua como orgânico o produto originado por processos agrícolas que não utilizam agrotóxicos, aditivos químicos ou modificações celulares nas sementes. Esse tipo de cultivo possibilita o manejo equilibrado do solo, preservando-o de contaminações e tornando-se, assim, uma atividade sustentável. Para quem o consome, isenta o organismo dos malefícios causados pela ingestão excessiva de pesticidas usados nas lavouras convencionais.
A Escola de Agronomia da Universidade Federal de Goiás (EA/UFG) desenvolve relevantes trabalhos nessa área. Um deles é o projeto de extensão Conversão para Produção Orgânica, coordenado pelo professor Paulo Marçal, cujas atividades se dividem entre o Câmpus Samambaia e a Fazenda Nossa Senhora Aparecida, onde se encontra a maior parte do plantio. O projeto é uma parceria firmada com a Associação para o Desenvolvimento da Agricultura Orgânica (ADAO) e envolve a participação de alunos e professores da Universidade, além de outras instituições.
A fazenda
Localizada no município de Hidrolândia, a fazenda está na família de Paulo há mais de 100 anos. Dos cerca de 370 hectares de área, 170 estão distribuídos para vegetação nativa e o restante é certificado para a produção orgânica. O pontapé inicial para o segmento foi a orientação de um projeto de mestrado, em 2002, que consistia no manejo de tomates convencionais sem o uso de agrotóxicos. Durante as visitas aos produtores, o professor e seu orientando entenderam que a utilização dos produtos químicos funcionava como uma espécie de “seguro agrícola”, garantindo a permanência da lavoura.
A partir desse entendimento, os dois pesquisadores pretendiam provar a real possibilidade de ter uma plantação de tomates convencionais sem insumos químicos. “Plantamos e levamos a experiência a palestras. Tinha até um ninho de ‘rolinhas’ no tomatal, tiramos fotos dos ovos e tudo. Ou seja, é algo inimaginável animais se aproximarem de uma plantação contaminada”, lembra Paulo. Em 2005, o manejo foi expandido para a produção de tomates orgânicos, além de outras culturas. Atualmente a fazenda tem mais de 30 espécies cultivadas, dentre elas feijão, araruta, amendoim, mandioca, cúrcuma, milho e soja.
O nome do projeto já traduz o seu propósito, que é a conscientização para a produção e consumo de alimentos orgânicos. As ações são voltadas para profissionais da área de Ciências Agrárias, produtores e consumidores, e incluem palestras, visitas e orientações. Nas atividades, o interessado absorve as informações iniciais necessárias a respeito do que o professor Paulo chama de filosofia. “O que fazemos é um trabalho de educação para o consumo, de conscientização para um estilo de vida econômico e sustentável”, afirma. Os princípios dessa prática são evidenciados em todas as atividades desenvolvidas na fazenda.
Os itens são cultivados em plantações abertas e estufas, sendo a última uma importante aliada na lida com a sazonalidade, principalmente na produção de tomate, ainda o carro-chefe da fazenda. Nas lavouras, aplicam-se técnicas de cultivo que estimulam um dos pilares da produção orgânica, que é a independência do agricultor. “Mostramos que, em um espaço só, o produtor pode plantar várias espécies. Por exemplo, fileiras alternadas de tubérculos, bananas e leguminosas. Isso garante produção para o ano todo”, explica Paulo, mostrando uma pequena plantação contendo diversas espécies cultivadas.
As espécies são laboradas no tempo ideal de plantio e colheita de cada uma, alternando as culturas. Para evitar o desgaste do solo e auxiliar no seu enriquecimento, é comum o uso de forrageiros, como o sorgo, antes de um novo semeio. A fertilização também é feita através de adubação natural, com o uso de húmus orgânico, produzido no minhocário da fazenda. Sem nenhum sinal de insumos químicos ou modificados, esse trabalho gera uma produção variada, possibilitando que, em um mesmo espaço, o produtor possa colher, por exemplo, desde o tomate cereja à gigante variação espanhola.
Para preservar toda essa diversidade, Paulo mantém intacto algo que os produtores orgânicos consideram como sagrado: as mudas e sementes. Para eles, não é permitida a comercialização, mas a troca, muito comum em feiras, garantindo a dependência mínima de insumos externos, sejam eles fertilizantes ou sementes modificadas. Porém, nem todos conseguem suas próprias sementes e ainda não há empresas no país que as produzam. Uma lacuna que, na crença do professor, pode ser preenchida à medida em que a demanda por matéria-prima orgânica cresça.
A produção da fazenda é revendida, semanalmente, nas feiras especializadas dos Mercados da 74 e Vila Nova, e a dica é chegar bem cedo, pois tudo é vendido rapidamente. Quem busca maior praticidade pode fazer seus pedidos online através do Orgânicos Pudica, cujo nome é uma homenagem à mãe do professor Paulo. O portal envolve, além da Nossa Senhora Aparecida, outros produtores da região, a fim de atender a demanda da lista de itens ofertados. As solicitações são entregues em domicílio aos sábados pela manhã.
Regulamentação
Para ser enquadrado como orgânico, o produto precisa atender a, pelo menos, um dos requisitos estabelecidos pela Lei nº 10.831, a Lei Brasileira da Produção Orgânica. Em vigor desde 2011, determina três modalidades de garantia ao consumidor, chamadas de certificação. A primeira e mais comum é a certificação por auditoria. Nela, empresas cadastradas no Ministério da Agricultura, como o IBD (certificadora com sede em Botucatu – SP), ficam responsáveis pela inspeção anual dos produtores. Essa auditoria permite que o produtor comercialize seus itens para outros estados.
A segunda é a certificação participativa, que exige a participação de associações. Aqui, os produtores se regulam através de visitas mensais nas propriedades inscritas. Em Goiás, a ADAO se destaca na representação dos produtores já em processo de credenciamento como um Organismo Participativo de Avaliação de Conformidade (OPAC), recomendação que a habilita a selar os produtos como Orgânico Brasil. A terceira e última modalidade é a certificação para venda de produtores locais, tem validade regional, atende aos produtores familiares e é regulamentada por uma Organização de Controle Social (OCS) que, como as OPAC’s, é acompanhada pelo Ministério da Agricultura.