Suicídio: conhecer para prevenir
Crescimento do número de jovens que tiram a própria vida preocupa especialistas
Texto: Angélica Queiroz, com informações da TV UFG
Ilustração: Ingrid Costa
Uma jovem de 19 anos, de Rio Branco, no Acre, se enforcou ao vivo pelo Instagram. Alguns dias depois seus pais também se mataram, o que gerou comoção na internet. A tragédia, alarmante por si só, não é um fato isolado. O jogo Baleia Azul, que como desafio final, incentiva jovens a cometerem suicídio, assustou pais e autoridades no início do ano. A série da Netflix “Os 13 Porquês” (do inglês, 13 Reasons Why), na qual a protagonista comete suicídio, também ajudou a trazer o assunto suicídio a tona. Um assunto bastante complexo que precisa deixar de ser tratado como tabu.
A Organização Mundial de Saúde (OMS) estima que, anualmente, um milhão de pessoas morram desta forma, uma a cada 40 segundos, e entre os jovens a situação é ainda mais preocupante: hoje o suicídio já é a segunda causa de morte entre 14 e 24 anos. Mas, também de acordo com a OMS, 9 em cada 10 casos poderiam ser evitados se a pessoa tivesse ajuda e atenção de quem está a sua volta. Mas como e onde buscar ajuda? E como é possível oferecer ajuda?
A sociedade não quer falar disso, mas deveria
“A melhor forma de entender o suicídio não é estudando o cérebro, e sim, as emoções. As perguntas a fazer são: ‘onde dói?’ e ‘como posso ajudá-lo?’”. A frase é do psicólogo, Edwin Schneidman, que estudou por muitos anos o comportamento suicida e a orientação é consenso entre quem estuda o assunto. Especialistas alertam para a necessidade de que todos estejam atentos para identificar pessoas que estejam com pensamentos de morte, para que ações de prevenção possam impedir a concretização do ato.
A psicóloga Célia Ferreira explica que falar de morte ainda constitui um grande tabu na nossa sociedade e, por isso, falar sobre suicídio é também um tabu, nesse caso ainda maior. “Há um estigma social do suicídio. Em muitas culturas ele é percebido como vergonhoso. A pessoa que se suicida é vista como fraca, egoísta, ou manipuladora. Essas crenças são tanto da sociedade como um todo, como daqueles que experimentam pensamentos suicidas. Tudo isso contribui para reforçar o sigilo e o silêncio”, explica. O psiquiatra Rodolfo Campos acredita que o suicídio é um tabu porque vai contra a vida rotineira e as crenças, especialmente religiosas, e, por conta disso, faz que, muitas vezes, a própria família não abra espaço para essa discussão.
E abrir espaço para essa discussão, especialmente em casa e na escola, é a principal aposta, de quem estuda o assunto, para conter o crescimento do número de casos de suicídio. Célia Ferreira afirma que a crença de que falar com uma pessoa deprimida sobre suicídio irá provavelmente fazê-la cometer suicídio é um mito. “Ao contrário, sabe-se que muitas pessoas deprimidas que têm planos ou pensamentos suicidas ficam aliviadas quando alguém toma conhecimento de tais planos e é capaz de ajudá-las quanto a isso”, explica. “Quanto mais próximos os pais ou amigos estiverem dos adolescentes, mais condições de identificar esses comportamentos. O grande problema é um jogo como esse da Baleia Azul passar despercebido até chegar ao seu momento final”, observa Rodolfo Campos.
Contudo, há importantes aspectos que devem ser considerados na interação com uma pessoa potencialmente suicida, como ser empático e ouvir com atenção, sem julgamento. “Isso implica em possuir habilidade na escuta e saber encaminhar essa pessoa para um profissional médico e psicólogo”, orienta Célia Ferreira. “A pessoa vê o suicídio como solução para o desespero em que se encontra, quando o estado de sofrimento é tão profundo que ela acha que morrer é a solução. Quando ela é compreendida no seu sofrimento, ela resgata o desejo de viver”, completa.
Para a psicóloga, o suicídio é uma morte evitável. “Não há como garantir que pessoa em alto risco não chegue a concretizar o ato. Mas uma pessoa que está em acompanhamento, que tem uma família que a ajuda, tem muitas chances de mudar de ideia. Existem vários fatores de proteção que têm que ser ativados para que se evite uma situação mais grave”, afirma. O psiquiatra Rodolfo Campos acredita que, se os fatores de risco determinantes para aquele indivíduo são conhecidos, é possível intervir e diminuir muito as chances de suicídio. “Temos de individualizar quais são os fatores determinantes para aquela pessoa e quais podemos tentar modificar”.
Quando se preocupar?
Embora depressão e ansiedade sejam transtornos muito comuns nos casos de suicídio, é importante pensarmos numa cadeia circular de fatores: existe algo que é do sujeito, mas também algo que é da interação dele com o ambiente, como fatores sociodemográficos, psicológicos, psiquiátricos e étnicos. “Muitos fatores devem ser avaliados. Se conseguíssemos isolar um fator, seria mais fácil. Por exemplo, tem depressão, trata-se a depressão e o sujeito estaria fora de risco, mas não é assim. O tratamento é extremamente importante, mas existem outros fatores que precisam ser observados para um tratamento conjunto, tanto medicamentoso, como psicoterápico”, explica Célia Ferreira.
Por esse motivo, além do tratamento de uma possível doença mental de base que possa levar ao suicídio, é preciso que familiares e amigos estejam atentos a qualquer sinal. “O que temos de fazer é investigar. Pergunte, converse, veja o que está acontecendo, veja se pode ajudar de alguma forma, até mesmo perguntando especificamente sobre suicídio”, orienta Rodolfo Campos. “Além de isolamento e mudanças de comportamento, muitas frases que o sujeito emite quando está com desesperança ou um sofrimento psíquico grande são sinais de alerta. Frases como 'a vida não serve para nada’ ou ‘eu sou um fardo pras pessoas’”, completa Célia Ferreira.
Setembro Amarelo
Setembro Amarelo é uma campanha de conscientização sobre a prevenção do suicídio, com o objetivo direto de alertar a população a respeito da realidade do suicídio no Brasil e no mundo. Ocorre no mês de setembro, desde 2014, por meio de identificação de locais públicos e particulares com a cor amarela e ampla divulgação de informações.
Confira programa da TV UFG sobre o assunto.
Fonte: Ascom UFG