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Universidade Federal de Goiás
suicídio

Na prevenção ao suicídio, a escuta sem julgamentos é um bom começo

Em 11/09/20 17:13. Atualizada em 11/09/20 17:13.

Considerado um problema de saúde pública, professor relata o que é possível fazer para evitá-lo

Produzido por Ana Flávia Santos (Rádio Universitária)

Transcrição (Kharen Stecca)

Ilustração: Ingrid Costa

suicídio

Todos os anos mais de 1 milhão de pessoas no mundo e cerca de 12 mil no Brasil morrem por suicídio. Para a maioria das pessoas é muito difícil compreender e acolher o indivíduo que manifesta o desejo ou tenta matar a si mesmo. Até mesmo falar sobre esse tema continua sendo tabu. Apesar do comportamento suicida ser assustador este é um problema de saúde pública e precisa ser discutido abertamente partindo do entendimento que os suicídios podem ser evitados, que pessoas com comportamento suicida precisam ser ouvidas e amparadas sem julgamentos morais.
Com o objetivo de divulgar com mais amplitude ações que possam ajudar a prevenir o suicídio, desde 2014 a Associação Brasileira de Psiquiatria em parceria com o Conselho Federal de Medicina organiza nacionalmente a campanha Setembro Amarelo salva-vidas. O mês de setembro foi escolhido porque no dia 10 deste mês é o dia mundial de prevenção ao suicídio. Entretanto o médico psiquiatra Murilo Ferreira Caetano professor de psiquiatria da Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Goiás e chefe da unidade de atenção psicossocial do Hospital das Clínicas da UFG faz a ressalva de que é preciso falar sobre suicídio, é preciso ouvir a pessoa com comportamento suicida, mas isso é diferente de relatar casos de suicídio o que pode induzir principalmente adolescentes a comportamentos por imitação.
“É importante que fique claro que falar abertamente sobre suicídio, sobre morte ou perguntar para alguém se ela tem vontade de se matar, não leva as pessoas a terem maior risco de suicídio ou isso não traz o risco da pessoa começar a pensar sobre suicídio depois de uma pergunta depois de algum tipo de comentário ou fala. O que a gente sabe que não pode ser feito é que se comente e se propague na mídia casos específicos de suicídios. Então falar sobre suicídio é uma coisa, relatar o caso de uma pessoa em especial, colocar fotos em redes sociais, fotos em jornais, contar a história de alguém que se suicidou isso já não deve ser feito principalmente adolescente é muito comum comportamento por imitação. Então esse tipo de relato ele acaba aumentando isso porque faz com que outras pessoas repitam esse comportamento.”
Os motivos, segundo o professor de psiquiatria da UFG que levam determinadas pessoas a apresentarem comportamento suicida pode ser muitos e de vários tipos: transtornos psiquiátricos, transtornos por uso de drogas e álcool, problemas financeiros, bullying e solidão são alguns deles. O professor da UFG lembra que em determinados países o número de suicídios está caindo, realidade que ainda não é verificada no Brasil.
“Em vários países as taxas têm aumentado, mas isso não é generalizado. Em muitos países desenvolvidos, na Europa em especial, as taxas de suicídios vem caindo após inúmeras tentativas governamentais de melhorar o acesso à saúde pública em saúde mental e se trabalhar mais essa questão. Alguns fatores podem receber identificados no Brasil, principalmente na última década em que a crise financeira foi muito importante e isso faz com que muitas pessoas percam dinheiro, emprego entrem em uma situação financeira extremamente complicada que por si só já é um fator de risco muito importante. Existe um fator cultural ligado a famílias cada vez menores, mais conectadas, separação conjugal cada vez mais precoce e filhos sendo criados sem contato com os pais, a solidão aumentando, a solidão na terceira idade, solidão na adolescência. Pessoas cada vez mais tendo acesso fácil a drogas altamente potentes. A gente tem visto a quantidade de pessoas com depressão, transtorno bipolar, esquizofrenia que não consegue tratamento adequado. Por que o estado não fornece acesso adequado para essas pessoas.”
O professor Murilo explica que alguns comportamentos podem ser o prenúncio de que a pessoa deseja se matar.
“Quando estamos falando em comportamento suicida estamos falando de uma série de outros fenômenos que vão anteceder a ação final. Vai desde o desejo de estar morto sem se matar, passando pelo desejo de se matar, o planejamento suicida e a tentativa de suicídio em si que pode resultar no suicídio consumado. Diversos sinais podem acontecer quando a pessoa começa a se isolar, quando ela começa a falar que não aguenta mais sofrer, quando ela fala essa fala de que a vida se tornou um sofrimento constante, que a vida é muito difícil, que ela prefere sumir, tem vontade de desaparecer ou mais ainda quando ela fala que quer se matar.”
Ouvir essa pessoa sem julgamento é o primeiro passo para evitar a morte por suicídio, segundo o professor da UFG: “É nosso papel tentar construir com a pessoa outras formas de lidar com esse sofrimento. Ela pode passar a entender que aquilo que o que ela vê como única saída não é efetivamente a única saída para que isso realmente seja possível. Uma das coisas mais importantes é que este profissional de saúde, seja um familiar, seja o líder religioso ou professor ele consiga escutar a pessoa sem fazer julgamentos morais, nada atrapalha mais nesse momento de sofrimento do que uma frase moralista, crítica e não empática. Escutar sem fazer esse julgamento é uma das coisas que mais trazem alívio imediato. Muitas pessoas deixam de cometer um suicídio justamente por se sentirem escutadas. Não que isso vai resolver o problema dela para o resto da vida mas já é um começo, um começo muito importante.”
E como explica o professor, no caso de pessoas com comportamento suicida não vale a ideia de que cão que late não morde: “Diferente do que muitas pessoas acreditam, quando a pessoa fala que quer cometer o suicídio isso não é necessariamente um alarme falso, aquele mito de que cão que ladra não morde não vale aqui. A maioria das pessoas que cometem suicídios acabam falando uma vez, duas vezes, três vezes ou mais sobre aquele desejo para outras pessoas e com frequência isso acontece com seus familiares ou profissionais de saúde, com o qual a pessoa se consultou nos últimos tempos. Então ficar atento a esses sinais, ter muita atenção com quem já tentou suicídio uma vez, ainda que essa tentativa para algumas pessoas, até mesmo pareça ridículo pela baixa letalidade da escolha, é importante ficar consolidado na cabeça de todo mundo que toda tentativa de suicídio é uma ação que acontece em meio a uma dualidade entre o querer parar de sofrer, o querer viver e a vontade de abortar o sofrimento através da morte.”
Contar com atendimento especializado também é fundamental para evitar o suicídio, lembra o professor da UFG.
“Além da escuta empática é fundamental uma avaliação profissional com psiquiatra, psicoterapeuta, psicólogo, porque a maior parte das vezes a gente não está a frente de uma situação casual aguda ou desimportante, em geral há transtornos psiquiátricos associados, há abuso de álcool e drogas, há quadros depressivos, ansiedade patológica, isso só para citar alguns exemplos. Então diagnóstico correto da situaçãoda pessoa, um tratamento bem feito com profissional experiente faz toda diferença.”
Na Universidade Federal de Goiás há dois serviços de atendimento em Saúde Mental voltado também a pessoas em risco de suicídio. O professor Murilo explica:
“Um dos serviços é voltado para população em geral por meio do SUS, que é o serviço do Hospital das Clínicas da UFG. Lá nós temos serviço de Psiquiatria e Psicologia que faz atendimento por consultas ambulatoriais e psicoterapias e nós temos o serviço chamado Saudavelmente que faz um trabalho interno voltado para a saúde do estudante e do servidor da universidade e que tem feito um trabalho fenomenal há alguns anos. Infelizmente a demanda tem sido cada vez maior e a quantidade de profissionais nem sempre é capaz de atender todos os casos.”
Sobre a possibilidade da pandemia do novo coronavírus estar aumentando os casos de suicídio o professor acredita que ainda é cedo para essa conclusão, mas segundo ele há motivos para acreditar que isso pode ocorrer em especial pelo isolamento social, perdas de empregos, aumento da ansiedade, insegurança e medo.

Confira o áudio da entrevista:

Fonte: Secom UFG

Categorias: setembro amarelo FM Saúde