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Universidade Federal de Goiás
Idosos HIV capa

A solidão e o silêncio de idosos que vivem com HIV

Em 12/12/18 11:59.

Pesquisa apresenta o tema como um debate necessário na esfera pública

Aline Borges

Passaram-se 30 anos desde que a Organização Mundial de Saúde (OMS) instituiu o dia primeiro de dezembro como o Dia de Combate à Aids, visando informar a sociedade sobre o HIV e, sobretudo, combater preconceitos. De lá pra cá, apesar de ter conseguido superar muita desinformação, os desafios de prevenção e combate se mantêm atuais, e muitos contextos sociais das pessoas que vivem com o vírus permanecem desconhecidos. Rompendo o movimento de invisibilidade, uma pesquisa da UFG direcionou o olhar para um desses contextos: a qualidade de vida dos idosos HIV positivos.

Vinculado ao Programa de Pós-Graduação em Sociologia, o estudo investigou o impacto do HIV na trajetória de vida dos idosos. Ao todo, 15 pessoas foram acompanhadas pela pesquisa, sendo 10 homens e 5 mulheres, com idades entre 60 e 78 anos, usuárias regulares dos serviços ambulatoriais do Hospital Estadual de Doenças Tropicais Doutor Anuar Auad (HDT). Alguns dos participantes convivem com o vírus há 20 anos e outros receberam o diagnóstico há um ano e meio.

Ao longo do estudo, a pesquisadora e doutora em Sociologia pela UFG, Márcia Rodrigues, revelou dois tipos de solidão que acometem os idosos que vivem com o HIV: uma causada pela descoberta do vírus e, outra, fruto do envelhecer. Ao interligá-las, a pesquisadora se deparou com um universo de histórias, sentidos e recortes de vidas. “A solidão para as pessoas que vivem com HIV é algo real e cotidiano. Alguns idosos têm de esconder sua condição de pessoa que vive com HIV e isso, muitas vezes, os machuca, devido ao preconceito das pessoas próximas. Para outros, é um meio de libertação”, afirma.

O silêncio agrava o cenário de solidão de alguns idosos. Assumir ser portador do vírus é um desafio e, por isso, “há os que preferem ficar sozinhos, quase como uma consequência”. Segundo a pesquisadora, “os idosos acabam mudando suas dinâmicas de vida em função do segredo que carregam. E esse segredo só existe porque eles não se sentem acolhidos o suficiente para expor a sua condição de pessoa que vive com HIV. A sociedade, infelizmente, não está aberta para isso”. Mas, Márcia Rodrigues faz uma ressalva, o silêncio não é regra. “Na pesquisa observei que nada é fixo. Há idosos, inclusive, que se negam a manter o segredo sobre o HIV e vivem sozinhos por essa escolha”.

Para a pesquisadora, é necessário “refletir sobre o lugar do idoso na sociedade, sobre as diferenças de gênero, sobre os impactos do HIV nas experiências de vida e também sobre a valorização da vida sob novas formas de aprendizado”. Segundo ela, esse é um debate urgente, visto que, a cada ano, a sociedade envelhece mais, ao mesmo tempo em que esses indivíduos vêem-se cercados sob um manto de invisibilidade, do qual não conseguem superar apenas com o repetido e problemático discurso da “melhor idade”.

Prospecções do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) apontam que, em 2060, mais de 190 milhões de pessoas terão mais de 80 anos. Com o envelhecimento populacional, outras problemáticas são trazidas à tona e o principal ponto é compreender se a sociedade como um todo está pronta para discuti-las. Neste sentido, é necessário, conforme afirma Márcia Rodrigues, romper o mito da velhice bem sucedida, “aquela em que os idosos gozam de plenos direitos, tem saúde e uma boa aposentadoria, mas que, infelizmente, não abrange a maioria dos idosos brasileiros”.

Conforme observa a pesquisadora, apesar de as pessoas estarem vivendo mais, isso não significa uma melhoria da qualidade de vida. “A velhice no Brasil acaba mostrando fragilidades com as quais nunca lidamos e temos que pensar agora, por exemplo, a questão da visibilidade, da convivência, do trabalho - e aqui entra a previdência, da saúde, do cuidado, da família”, afirma.

Assim como outros grupos populacionais, as vivências dos idosos são heterogêneas e, por isso, quaisquer generalizações despertam muito mais problemas do que soluções. “Isso traz a falsa ilusão de que o idoso é responsável por sua velhice, gerando um envelhecimento bem ou mal sucedido. Todavia, não verificamos quais as condições que cada idoso teve de vivenciar na vida”, analisa Márcia. Para ela, há a necessidade de compreender esses indivíduos a partir de um recorte de classe, gênero e raça. “A socialização do idoso não pode ficar atrelada a uma mudança de características físicas, como algo imposto. Esses aspectos mostram que, muitas vezes, a doença social pode ser mais devastadora do que a biológica”.

Fonte: Secom/UFG

Categorias: Saúde