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Universidade Federal de Goiás

Antes da docência, a experiência musical

Em 28/05/19 13:03. Atualizada em 29/05/19 12:14.

Entrevista concedida pelo professor Jordão Horta Nunes por e-mail a jornalista Carolina Melo

Como iniciou o seu envolvimento com a música?

Em casa, na infância, escutava programas musicais no rádio e discos (vinil), principalmente a partir da adolescência, quando era comum a troca de LPs e compactos para escutar em casas de colegas. Meus pais não eram músicos e não tinham o hábito frequente de escutar música reproduzida ou ao vivo. Quando chegou a TV em casa esse hábito começou a mudar, com os  programas musicais pela TV e, em 1965 para 1966, a partir do I Festival de Música Popular Brasileira pela TV Record, quando tinha 8 anos de idade. Assim, o que impulsionou meu interesse musical não foi o meio erudito, mas a cultura de massa no mundo da música.

E com o violão clássico? Desde quando toca? Quando surgiu o interesse em aprender a tocar?

Começamos a aprender violão eu e minha mãe, ao mesmo tempo, quando tinha por volta de oito anos. Muita gente queria tocar violão na época, violão de acompanhamento com voz, sob influência de movimentos como a Jovem Guarda, a canção de protesto e a bossa-nova. O interesse pelo rock, pelo menos para mim, foi mais tarde, a partir dos dez anos de idade. Morava na cidade de Campinas, em São Paulo, onde permaneci até mudar para Goiânia, em 1992. Tive aulas particulares por cerca de um ano, aprendendo aquele sistema de cifras com o desenho do braço do instrumento e uma “batida” correspondente a cada música. O repertório era principalmente o de música popular e, no final desse período, os sucessos que vieram a se tornar clássicos da MPB e da bossa-nova, como Corcovado, Bolinha de Sabão, Arrastão, Roda Viva etc. O professor com quem aprendia, no final desse período, estava se iniciando no violão solo, e um dia ele me tocou um trecho de uma famosa peça anônima do sec. XVII ou XVIII, Romance de Amor e em seguida um arranjo de Samba de uma nota só, de Tom Jobim. Aí eu me apaixonei pelo violão solo, não tanto pelo estilo clássico ou romântico, mas pela possibilidade de fazer a melodia e o acompanhamento ao mesmo tempo. Na verdade preferia o violão solo popular, mas, na época, assim como até hoje, o aprendizado do violão solo geralmente envolve o estudo de peças da renascença, do barroco e do período romântico antes de composições pautadas em temas ou gêneros populares.

Depois aprendi violão solo com os professores Sebastião Galante e Milton Nunes, em Campinas, por cerca de um ano. Nunca, porém, estudei em conservatório e não tinha a prática em tocar regularmente em público, mas apenas em casa ou para amigos. Quando tinha cerca de quatorze anos parei de ter aulas de violão, pois ingressara no ensino médio e não havia mais tempo ou recursos para investir numa carreira como instrumentista, pois eu não me distinguia tanto como solista e, talvez não me dedicasse tanto na teoria e na prática musical.

No entanto, não deixei de renovar o repertório de acompanhamento e continuar adquirindo partiras de violão solo, que tentava ler e tocar com certa autonomia. Bem mais tarde, quando ingressei como professor na UFG, em 1992, adquiri um primeiro violão de luthier e voltei a me dedicar ao instrumento. Tive aulas com o professor Eduardo Meirinhos e cheguei a participar, algumas vezes, do Encontro “Violão e Violonistas Goianos”, organizado pela professora Fernanda Vasconcelos Furtado durante 25 anos em Goiânia. Integrava também, juntamente com outros violonistas em Goiânia, uma associação intitulada “Centro de Produção e Expansão Violonística – CEPEVI, criada em 1992 e presidida por Wesdarley Adorno. Organizávamos pequenos recitais e palestras e chegamos a trazer para Goiânia professores e performers famosos, como Henrique Pinto, Edelton Gloeden e Paulo Bellinatti. Quando saí para o doutorado, entre 22007 e 2010 e após o retorno, quando passei a orientar em cursos de pós-graduação, interrompi a atividade

violonística mais séria e as mini apresentações esporádicas que realizava, embora continue a tocar em casa e me interessar pelo instrumento, a título de hobby. Na verdade, ainda que tenha dado aulas de violão particulares em uma escola de música em Campinas, minha dedicação ao instrumento e à música, como melômano, sempre foi amador; considero-me um diletante apaixonado, mas sempre com dedicação e esforço inferiores ao grau que uma profissionalização stricto sensu exige.

Onde normalmente toca o violão clássico?

Em casa e eventualmente em pequenas apresentações em círculos de amigos ou como aluno em grupos de ensino coletivo de instrumentos, como a Orquestra de Violões ou o Grupo de Choro da UFG e o Grupo de Choro da Escola Basileu França.

A música de alguma forma acrescenta a sua prática docente? Se sim, de que forma?

Sim, gosto muito de utilizar exemplos de peças musicais, para ilustrar relações sociais, conjunturas históricas ou práticas culturais, já que sou professor na área de Ciências Sociais. Às vezes toco alguma peça relacionada com o objeto da aula, mas isso é muito raro. No entanto, tenho pesquisador, nos últimos oito anos, o trabalho de musicistas, pois minha linha de pesquisa é a sociologia do trabalho. Nesse foco de pesquisa tenho me aproximado mais de cursos e atividades desenvolvidas por músicos e eventualmente sou convidado para defesas de mestrado de violonistas, na Emac, geralmente por colegas que vieram a saber de meu interesse pelo violão e pelo tema do trabalho musical.

Ou, por outro lado, a música seria uma forma de ultrapassar as exigências do espaço acadêmico?

Sem dúvida a música, ou a atividade musical, constitui um espaço de expressão e usufruto estético e prazeroso que transcende, no meu caso, como diletante não profissional, as obrigações da profissão de docente universitário que se envolve com ensino, pesquisa e extensão. Tenho procurado, no entanto, nesta fase da carreira onde já poderia me aposentar, utilizar o convívio com a música e o violão para intermediar a pesquisa e a análise do trabalho de músicos e artistas, unindo o útil e o agradável. Porém não resta dúvida de que, ao aposentar, terei mais tempo para continuar meu convívio com o violão, seja como aluno ou como arranjador ou compositor, dimensões da atividade artística que requerem mais exclusividade e dedicação e que gostaria de desenvolver quando encerrar minha carreira na UFG.

Gostaria de acrescentar algo mais sobre seu gosto por tocar violão?

O violão é um instrumento bastante querido dos brasileiros, seja no acompanhamento da voz ou para tocar solo, além de integrar bem diversas formações com outros instrumentos. Constitui uma companhia agradável e duradoura, que tem me proporcionado muita alegria, nesses mais de cinquenta anos de convivência. Recomendo muito, a quem não teve ainda a oportunidade, o aprendizado, que não é demorado, e sobretudo a prática no instrumento, que é extremamente prazerosa e gratificante! Confesso que não sou um grande ouvinte do violão, sobretudo do violão erudito, em comparação

com meu consumo de música popular para grupos, principalmente jazz, bossa-nova, choro e as diversas variantes da música étnica. No entanto, gosto muito de manter peças de violão solo e tentar tocá-las e esse instrumento, a despeito de seu tamanho relativamente pequeno, pode assumir a versatilidade de um instrumento de concerto, a exemplo de um piano. Espero que possa continuar a tocá-lo ainda por muitos anos!



Categorias: Eu Faço Arte