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Universidade Federal de Goiás
PORQUE O ESTADO IMPORTA

PORQUE O ESTADO IMPORTA

Em 14/04/21 08:57. Atualizada em 23/04/21 16:00.

Os servidores da saúde

Adriano R. de Oliveira*

Ana Luisa Aragão*

A enfermeira, diante de uma nação apreensiva, alertou: “Acreditem na vacina, não tenham medo”. É com pessoas como Monica Calazans, pertencente ao grupo prioritário para vacinação contra a covid-19, que milhões de brasileiros se encontram, todos os dias, nos hospitais, nos postos de saúde e nas clínicas públicas espalhadas pelo país. Esse encontro é marcado, sempre, por algum grau de tensão, expectativa, mas também pela gratidão de gente humilde.

A história desses encontros pode ser contada por alguns números. Apenas entre janeiro e novembro de 2020 foram realizados, pelo SUS, 2,8 bilhões de procedimentos ambulatoriais e outros 9,6 milhões procedimentos hospitalares. Nos procedimentos de baixa complexidade como curativos, tratamento de pequenas lesões, administração de medicamentos, passando por aqueles mais complexos, como cirurgias, tratamentos oncológicos e transplantes, encontramos as mãos de profissionais de diversas especialidades.

Haviam, em 2020, 2,6 milhões de profissionais atendendo no SUS. Um exército de servidores vinculados administrativamente aos governos municipais, estaduais e ao governo federal. Gente trabalhando na gestão, na manutenção, na limpeza e na segurança dos estabelecimentos de saúde. Enfermeiras, médicos, fisioterapeutas, psicólogos, assistentes sociais, odontólogos, bioquímicos, farmacêuticos, psiquiatras, atendendo, em níveis hierarquizados pela situação clínica, toda e qualquer pessoa que bater à porta de um estabelecimento público de saúde. Apenas no campo da enfermagem, em que se inclui enfermeiros, técnicos em enfermagem e auxiliares de enfermagem, são mais de 922 mil profissionais.

Mas o SUS também promove a mobilidade inversa, preventiva, evitando que muitos problemas cheguem às unidades de saúde. Mais de 280 mil agentes comunitários de saúde, em conjunto com outros profissionais, batem à porta, diariamente, dos brasileiros mais humildes, disseminando informações e colaborando com os diagnósticos precoces. Trabalho silencioso que melhora a vida de mães, de crianças e de idosos.

O desafio de universalizar o acesso à saúde pública exige esforço logístico colossal. O IBGE constatou que, em Roraima, a média de quilometragem para o acesso aos serviços de alta complexidade é de 471 quilômetros e no Amazonas 462 quilômetros. A média de deslocamentos para atendimento de alta complexidade em Manaus é de 418 quilômetros que são vencidos em meio à floresta úmida e aos rios da bacia Amazônica.

As dificuldades dos profissionais de saúde ficam mais evidentes quando constatamos que, em dezembro de 2020, segundo o DATASUS, em 847 municípios havia o registro de presença de apenas um médico. Nos 2.452 municípios de até 10 mil habitantes havia, segundo o Conselho Federal de Medicina, em 2020, um total de 4.826 médicos para uma população total que ultrapassava 12,7 milhões de pessoas.

Nos 847 municípios em que ocorreu registro de apenas um médico existia mais de 17 mil profissionais da enfermagem. São profissionais como esses que atendem, no dia a dia, brasileiros que residem na faixa de fronteira seca que se estende do Rio Grande do Sul ao Amapá. São profissionais como esses que passam dias navegando, em hospitais flutuantes, nos infinitos rios e igarapés da Amazônia. São profissionais como esses que, cotidianamente, lidam com os desafios de atender a gente carente que reside no semiárido nordestino ou mesmo nas comunidades rurais espalhadas por todas as latitudes do Brasil.

Mas o que dá identidade aos profissionais da saúde não é, apenas, a dedicação para vencer os obstáculos da distância. Infelizmente, do Oiapoque ao Chuí, assistimos um intenso processo de precarização do trabalho agravado pela crise sanitária decorrente da covid-19. Essa precarização manifesta-se de duas formas:

  • A primeira forma refere-se às dificuldades relacionadas a infraestrutura nas diferentes rotinas de trabalho. O ambiente arquitetônico, a insuficiência de equipamentos de proteção individual e até mesmo a escassez de insumos para os pacientes são ingredientes de uma exaustiva rotina de trabalho. Os atuais protocolos de segurança, além de tornar mais complexa a rotina diária nos serviços, transferem os riscos do trabalho para os ambientes domiciliares. O ápice dessa situação foi demonstrado pela falta de oxigênio nos hospitais de Manaus.

  • A segunda forma de precarização manifesta-se pela fatigante jornada de trabalho, muitas vezes realizada em dois estabelecimentos de saúde. A baixa remuneração exige a complementação de jornada de trabalho, privando os profissionais da saúde do convívio familiar e pavimentando o caminho para o adoecimento. Em 2019, a remuneração média dos enfermeiros em regime estatutário atingiu 5,6 salários mínimos, a de uma auxiliar de enfermagem 2,9 salários mínimos e a de uma agente de saúde 1,7 salários mínimos. A remuneração para essas funções, em regime CLT, são ainda menores.

A pergunta necessária, diante da crise sanitária e política, é: quem cuidará daqueles que cuidam da saúde pública? Até dezembro de 2020, o Observatório da Enfermagem registrou 525 óbitos entre os profissionais da enfermagem e o Conselho Federal de Medicina registrou 465 óbitos de médicos. Além desses profissionais, fisioterapeutas, biomédicos, psicólogos, assim como aqueles que zelam pela limpeza dos estabelecimentos de saúde, também tombaram nessa batalha. No front, invisibilizados por máscaras, aventais, luvas, protetores faciais, esses profissionais têm colocado em risco, diariamente, a sua saúde e o futuro de seus familiares.

As sequelas dessa guerra, para os profissionais da saúde, serão inevitáveis. Seus nomes, no entanto, não serão eternizados em algum memorial da Pátria Amada Brasil. O slogan ufanista tem o propósito de camuflar a histórica negligencia política denunciada, ainda na década de 1940, por Josué de Castro. A Pátria Amada Brasil, preocupada com a espetacularização, parece regozijar-se diante do estado de calamidade pública que assola o país. A despeito da indiferença de parcela da classe política, os profissionais de saúde tem honrado, cotidianamente, a sina de cuidar dos outros.

A gratidão do Observatório do Estado Social Brasileiro aos profissionais da saúde soma-se ao carinho e reconhecimento da população brasileira que deposita, em cada um desses profissionais, a esperança POR DIAS MELHORES.

 

Para mais informações:

Plataformas de Dados do Observatório do Estado Social Brasileiro

http://obsestadosocial.com.br/

https://observatorio.spatialize.com.br/#/

Canal Porque o Estado Importa

https://www.youtube.com/channel/UCuZDu3jkiPMfxYTmfzVzKWw

 

* Adriano R. de Oliveira é professor Associado do IESA e doutor em Geografia pela UNESP. Email: adriano.oliveira@ufg.br.

* Ana Luisa Aragão é professora do Instituto Federal Goiano – Campus – Posse, doutoranda em Geografia pela UFG/IESA. Email: ana.aragao@ifgoiano.edu.br

 

 

Fonte: Secom-UFG

Categorias: colunistas Porque o Estado Importa IESA