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Universidade Federal de Goiás
Melhor trabalho do 20º Congresso Brasileiro de Toxicologia em 2017

Brasil e EUA concedem patente de fitomedicamento desenvolvido na UFG

Em 26/04/21 20:17. Atualizada em 27/04/21 14:12.

O Fitoprot auxilia pacientes de câncer acometidos de mucosite durante o tratamento

Luciana Santal

O ano de 2021 começou com novidades para as Faculdades de Farmácia e Odontologia da Universidade Federal de Goiás (UFG): o pedido de registro de patente de um medicamento para tratamento de uma condição comum em pacientes em tratamentos quimioterápico/radioterápico: a mucosite. O medicamento denominado Fitoprot teve sua patente concedida, em janeiro, nos Estados Unidos e, em março, no Brasil. A coordenadora do projeto de pesquisa que criou o medicamento, a professora de Toxicologia da Universidade Federal de Goiás (UFG), Marize Campos Valadares, conta que, a ideia era buscar uma solução para o tratamento da doença, que é uma reação adversa ao tratamento quimioterápico/radioterápico que atinge quase 100% dos pacientes em tratamento. A proposta surgiu das inúmeras discussões sobre a ausência de terapias medicamentosas efetivas para esta condição, que, quando se agrava, diminui a qualidade de vida e as chances de tratamento dos pacientes com câncer. 

fitoprot

A professora relata que, nos estudos clínicos, a forma farmacêutica investigada foi a de um enxaguatório bucal, que possui propriedade mucoadesiva, ou seja, fica por mais tempo no local de ação, a mucosa. Ela explica que outra apresentação também foi formulada e estudada: a pomada. “A patente protege e nos dá o privilégio de exclusividade na exploração comercial do Fitoprot, que pode compreender diversas formas farmacêuticas, incluindo soluções e pomadas. O Fitoprot é um fitomedicamento inovador, 100% idealizado e desenvolvido por pesquisadores e indústria goiana com sua eficácia cientificamente demonstrada para tratar a mucosite oral”, pontua.

De acordo com a professora, “a mucosite é uma inflamação dolorosa e debilitante de todo o trato gastrointestinal que pode variar de leve vermelhidão da mucosa até ulcerações graves. Isso acontece porque, geralmente, os medicamentos para o tratamento do câncer não são específicos contra as células do tumor, ou seja, destroem as células tumorais, mas também lesam células normais. As células normais de renovação constante, como as gastrointestinais, sofrem a ação desses medicamentos/radioterapia, o que ocasiona o surgimento da mucosite”. Essa condição pode causar ao paciente a incapacidade de se alimentar, má nutrição, perda de peso e desidratação, além de aumentar a chance de ele adquirir uma infecção oportunista. A mucosite pode limitar a eficácia do tratamento do câncer, aumentar os custos de hospitalização, e pode até levar à interrupção dos protocolos quimioradioterápicos, o que reduz as chances de cura e sobrevida dos pacientes.

Produto inovador goiano – A patente do Fitoprot começou a se tornar realidade a partir de uma chamada pública de abril de 2010 da Financiadora de Estudos e Projetos (Finep), empresa vinculada ao antigo Ministério de Ciência e Tecnologia. Mas as pesquisas antecederam a publicação do edital: as Faculdades de Farmácia e de Odontologia, por meio de um grupo de pesquisadores formado pelos professores Marize Campos Valadares, Aline de Carvalho Batista, Elismauro Francisco Mendonça, Ricardo neves Marreto e Eliana Martins Lima, que pesquisavam temas em fisiopatologia do câncer, farmacologia/toxicologia e tecnologia farmacêutica, uniram forças com o objetivo de desenvolver soluções medicamentosas de maior eficácia e mais seguras para o tratamento de diversas condições patológicas, como a mucosite. No caso em questão, a estratégia dos pesquisadores consistia na obtenção de um produto natural com inovação radical (fitomedicamento inédito), com tecnologia agregada (mucoadesivo), eficaz (proteger e/ou reduzir a gravidade da mucosite), seguro (sem reações adversas), com potencial de obtenção de registro junto à Agencia Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), ou seja, desenvolvimento do produto alinhado com os requisitos regulatórios da Anvisa.  O grupo viu então, na chamada pública, uma oportunidade para desenvolver os estudos, já que o edital previa uma cooperação entre instituições públicas e empresas, papel desempenhado aqui pela FBM Indústria Farmacêutica.

Marize contou que a cooperação com a FBM foi essencial para a conquista. “Buscamos a parceria com a FBM, na pessoa do Marcelo Perillo, que acreditou na ideia e investiu recursos financeiros e know-how para o desenvolvimento do projeto que culminou nas patentes. Importante destacar que a área farmacêutica é extremamente regulada e a cooperação interdisciplinar juntamente com indústria foi determinante para a condução dos estudos. Estudos clínicos do porte dos executados neste projeto demandam a produção de lotes pilotos do medicamento utilizados nos pacientes do estudo que devem ser produzidos conforme os requisitos regulatórios de qualidade e boas práticas de fabricação mandatórios da Anvisa”.      

O desenvolvimento de um medicamento pode levar vários anos, como é o caso do Fitoprot. A partir da aprovação da pesquisa pela Finep em 2010, foram desencadeadas algumas fases para se chegar ao produto patenteado. Para obter o alinhamento científico com o regulatório, ação essencial para o êxito da pesquisa, a equipe se reuniu algumas vezes com representantes da Anvisa e, juntos, definiram o planejamento e execução das etapas pré-clínicas e clínicas. O estudo precisava provar que as plantas utilizadas juntas na formulação possuíam baixo potencial de toxicidade: tanto a Bidens pilosa quanto a Cúrcuma longa já faziam parte da Relação Nacional de Plantas Medicinais de Interesse ao Sistema Único de Saúde (ReniSUS) porque são plantas de longa data de uso, com muitas informações sobre elas já reunidas. Então, isoladas, já apresentavam baixa toxicidade.

Melhor trabalho do Congresso Brasileiro de Ciências Farmacêuticas do Brasil Central em 2013
Melhor trabalho do Congresso Brasileiro de Ciências Farmacêuticas, em 2013

Nos anos de 2011 e 2012, foi realizada a etapa pré-clínica com a investigação dos efeitos da Bidens pilosa, onde verificou-se que o efeito predominante sobre a mucosite era o antiinflamatório. Entre 2012 e 2013, foi a vez de investigar a ação dos curcuminóides da Cúrcuma longa, que teve o efeito de proliferação celular/mucosa e amenização de perda de peso. A associação da Bidens pilosa e dos curcuminóides da Cúrcuma longa apresentou melhores resultados do que cada planta analisada isoladamente. Assim, foi possível somar os efeitos antiinflamatórios e proliferativos e criar o Fitoprot, medicamento fitoterápico capaz de conferir maior proteção contra a indução da mucosite. Nessa etapa, que ganhou o prêmio de melhor trabalho apresentado no Congresso de Ciências Farmacêuticas do Brasil Central em 2013, também se identificou a dose terapêutica para os estudos clínicos que vieram a seguir.

O próximo passo, estudo de fase I, foi realizado em indivíduos saudáveis para se atestar a ausência de toxicidade clínica. Em 2017, esta fase da pesquisa ganhou o maior prêmio do 20º Congresso Brasileiro de Toxicologia. Entre os anos de 2014 e 2018, já na etapa clínica, foram realizadas análises em pacientes com câncer de cabeça e pescoço que recebiam tratamento no Hospital Araújo Jorge. Os resultados de eficácia mostraram que o Fitoprot reduz o aparecimento da mucosite grave, com aumento da qualidade de vida dos pacientes. Esses dados também foram premiados: a apresentação dessa etapa em 2017, no 34º Congresso da Sociedade Brasileira de Pesquisas Odontológicas, rendeu o prêmio de melhor trabalho da área.

Melhor trabalho do 20º Congresso Brasileiro de Toxicologia em 2017
Melhor trabalho do 20º Congresso Brasileiro de Toxicologia em 2017

A professora Marize explica que a UFG abrigou todas as etapas de desenvolvimento da formulação, provas de conceito, investigações mecanísticas, etapas pré-clínicas e avaliação das amostras biológicas de pacientes. Já a etapa clínica de fase 2 foi realizada em cooperação com o Hospital Araújo Jorge. À FBM Indústria Farmacêutica, coube a elaboração de documentação regulatória, o depósito das patentes, o escalonamento da formulação, a produção de lote piloto e o controle de qualidade da formulação. “Após essa concessão da patente, o próximo passo é apresentar à ANVISA toda a documentação para a obtenção do registro do produto, que inclui os dados de segurança, eficácia e qualidade de fabricação. Esta etapa está em curso e esperamos concluí-la em breve. Com o registro na ANVISA, a empresa adquire a autorização sanitária para a comercialização do produto. O mercado é estimado em US$ 1,2 bilhões, já que quase 100% de pacientes que se tratam com radio/quimioterapia desenvolvem mucosite”, anuncia.

Pesquisa e Inovação na UFG – A professora Marize aponta que o sucesso do projeto se deve à cooperação de pesquisadores de conhecimento e experiências sólidas em diversas áreas, aspectos importantes para a solução buscada. “O projeto teve investimento federal e investimento privado, parcerias entre instituições públicas consolidadas, como a UFG e o Hospital Araújo Jorge, que atende majoritariamente pacientes do SUS. O projeto em si é a aplicação do conhecimento gerado em instituições públicas para sanar os problemas e dores da sociedade brasileira e mundial. A realização deste projeto foi ainda uma oportunidade de formação de recursos humanos: três mestres e dois doutores se formaram com recursos deste projeto”, defende.

A cooperação entre universidades e empresas para o desenvolvimento de medicamentos como o Fitoprot é considerada essencial pela gestão da UFG. “A interação universidade-empresa é uma das atividades sociais de grande relevância da UFG e que pode gerar grande contribuição para o desenvolvimento econômico e social de Goiás e do Brasil. Eventos como a concessão da patente do Fitoprot reafirmam esse fato geral e, em particular, enfatizam a grande contribuição que as Faculdades de Farmácia e de Odontologia da UFG podem dar, e de fato têm dado, para o desenvolvimento do setor farmacêutico brasileiro. Parabéns aos pesquisadores envolvidos”, enaltece o pró-reitor de Pesquisa e Inovação, Jesiel Carvalho.

Núcleo de Inovação Tecnológica - O Núcleo de Inovação Tecnológica (NIT-UFG), instituído em 2005, é o responsável pelo depósito de patentes e registro de outras Propriedades Intelectuais. Após a criação da Pró-reitoria de Pesquisa e Inovação (PRPI), estabeleceu-se dentro do NIT, o Escritório de Propriedade Intelectual e Transferência de Tecnologia, com o objetivo de tratar especificamente dos pedidos de registros de patentes. Atualmente, após uma reestruturação, ele passou a ser denominado Setor de Propriedade Intelectual e Transferência de Tecnologia (SPITT). No caso da patente do Fitoprot, o depósito foi feito pela empresa parceira na pesquisa, a FBM Indústria Farmacêutica; constam como inventores os professores da UFG e figuram, como titulares, a UFG e a FBM.

De acordo com a diretora de Transferência e Inovação Tecnológica e pró-reitora adjunta de Pesquisa e Inovação da UFG, Helena Carasek, muitas ações têm sido desenvolvidas para fomentar os pedidos de registro de patentes. Além de estruturar o SPITT com profissionais altamente qualificados e promover palestras, oficinas e cursos sobre patentes, a UFG, em parceria com a Funape, criou uma ferramenta inovadora para apoiar as atividades relacionadas à propriedade intelectual e transferência de tecnologia. Essa ferramenta visa também dar maior visibilidade às tecnologias desenvolvidas pela universidade, como as patentes. “Nós estamos lançando a Plataforma PITT. Trata-se de uma plataforma inovadora que entrará em operação a partir de maio deste ano. A plataforma, além de conter uma Vitrine das Tecnologias, permitirá a solicitação, acompanhamento e controle financeiro de processos de registro de Propriedade Industrial junto ao INPI, bem como a gestão da transferência de tecnologia (com elaboração de instrumentos contratuais para formalização das parcerias)”, anuncia. A plataforma ainda contém um Catálogo de Laboratórios e Equipamentos e um módulo de Depósito de Obras Intelectuais com certificação digital (Registro de Direito Autoral).

Curso de especialização - Para capacitar servidores e pesquisadores para o processo de patenteamento, a instituição criou, em 2018, um curso de especialização em Propriedade Industrial – Patentes. “Esse curso também é uma iniciativa pioneira da UFG, pois é um curso de formação técnica”, afirmou a coordenadora do curso, Tatiana Duque. A professora ainda informa que a segunda turma do curso terá seu processo seletivo divulgado em maio de 2021, com início das aulas em julho. 

 

Fonte: Secom UFG

Categorias: pesquisa FO FF patente Saúde destaque