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Universidade Federal de Goiás
PORQUE O ESTADO IMPORTA

PORQUE O ESTADO IMPORTA

Em 17/11/21 11:05. Atualizada em 19/11/21 16:51.

COP26: a frustração e a ampulheta

*Camilo Pereira Carneiro 

Ocorrida na cidade de Glasgow, Reino Unido, entre 31 de outubro e 12 de novembro de 2021, a 26ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas, Conferência das Partes (COP26), reuniu representantes de 195 países e expôs interesses conflitantes que podem explicar o clima de frustração em meio a negociações travadas e a sensação de que o tempo está passando e as medidas necessárias para garantir a sobrevivência de gerações futuras não estão sendo tomadas.

Segundo o IPCC (sigla em inglês para Painel Intergovernamental das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas), o planeta está a caminho de um aquecimento de 2,4 graus Celsius em relação à era pré-industrial (1850-1900), o que aumentará o risco de secas extremas, incêndios florestais, inundações, tempestades de poeira, aumento catastrófico do nível do mar, desaparecimento de espécies vegetais e animais e escassez de alimentos.

Não obstante, este quadro poderia ser evitado com reduções rápidas, profundas e sustentadas nas emissões globais de gases de efeito estufa, uma vez que os impactos das mudanças climáticas serão muito menores no aumento da temperatura de 1,5º C em comparação com 2º C.

Não obstante, assim como em outras edições da Conferência das Partes (COP), que ocorre anualmente desde 1995, o fracasso das negociações é resultado de manobras de países produtores de energias sujas e de poderosas multinacionais, grandes emissores de gases de efeito estufa, que agem para sabotar as soluções sugeridas por ambientalistas e cientistas. Segundo o IPCC, carvão, petróleo e gás são os maiores contribuintes para a crise climática de origem humana. O desmatamento completa a lista das atividades humanas que contribuem para o aquecimento global.

Cabe destacar que Estados Unidos, China, Índia, Rússia, Japão e Alemanha são os maiores emissores de gases de efeito estufa, sobretudo por meio das indústrias e da queima de combustíveis fósseis. O Brasil está entre os quinze países deste ranking, em função do desmatamento (entre 2020 e 2021 o desmatamento aumentou em 46% na Amazônia brasileira).

No tocante ao impacto causado pelas empresas produtoras de energias sujas, um estudo publicado no jornal britânico The Guardian apontou que 90 empresas (a maioria atuante na exploração de petróleo, gás e carvão) são responsáveis por ¾ de todos os gases de efeito estufa lançados na atmosfera desde a Revolução Industrial (período entre 1850 e 1900). Esta contribuição se acentuou nos últimos 25 anos e entre os principais atores estão algumas gigantes do setor como Exxon Mobil, Chevron-Texaco, British Petroleum, Shell e Petrobras, entre outras.

É importante ressaltar o papel dos lobbies das empresas de energias sujas no fracasso das COP. Há mais de um século elas trabalham na contramão da proteção ambiental. Uma das medidas que deveriam ser tomadas para o combate ao aquecimento global é a substituição dos combustíveis automotivos derivados de petróleo, como a gasolina e o diesel. Solução que tem sido sabotada pelos grandes atores do sistema internacional, cujos governos são influenciados por grandes petrolíferas.

Cabe recordar que o carro elétrico, por exemplo, foi inventado no século XIX (os primeiros modelos datam de 1828 e 1834). Na década de 1920, o petróleo foi encontrado em larga escala nos Estados Unidos, barateando a gasolina, logo, um lobby se formou em torno do petróleo. Os carros movidos a bateria eram mais caros e a falta de apoio governamental inviabilizou a difusão do carro elétrico. No Brasil, em 1974, a fabricante nacional Gurgel lançou o Itaipu, veículo elétrico 100% brasileiro, mas a iniciativa não recebeu o apoio necessário por parte do governo brasileiro.

Nos últimos anos, a preocupação ambiental tem perdido força política nas agendas de diversos governos. Nesse sentido, cabe lembrar que o Canadá abandonou o Protocolo de Kioto em 2011 (e passou a incentivar a exploração de areia betuminosa), a Austrália derrubou, em 2014, o imposto de carbono para empresas poluentes (para impulsionar a exploração de carvão e exportá-lo por um porto próximo à Grande Barreira de Corais), nos Estados Unidos, o governo Trump (2017-2021) desmantelou a política ambiental do país e no Brasil o atual governo faz da destruição ambiental a sua política.

Em meio a este cenário, o texto do acordo firmado na COP26, foi atenuado em relação ao primeiro rascunho, após pressão de produtores de carvão, petróleo e gás. Países como China, Rússia, Austrália e Arábia Saudita trabalharam para remover completamente os trechos que faziam menção aos combustíveis fósseis.

Assim, o interesse imediato de grandes players do sistema internacional tem prevalecido nas conferências sobre mudanças climáticas, o que coloca em risco o futuro das próximas gerações, que sofrerão as maiores consequências do aquecimento global (degelo, aumento do nível dos oceanos, desertificação, alteração do regime das chuvas, inundações, redução da biodiversidade, etc.), que acarretará danos irreversíveis à humanidade.

*Camilo Pereira Carneiro é professor do Instituto de Estudos Socioambientais da UFG (IESA/UFG)

O Jornal UFG não endossa as opiniões dos artigos e colunas, de inteira responsabilidade de seus autores.

Fonte: Secom-UFG

Categorias: colunistas Porque o Estado Importa Iesa