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Universidade Federal de Goiás
evento FCS

Corpo, memória e cultura negra são debatidos em palestra do 6° Simpósio Internacional da FCS

Em 12/08/22 16:17. Atualizada em 12/08/22 16:33.

Professora Leda Maria da UFMG conduziu o encontro de abertura do evento

Texto e fotos: Eduardo Borges

 

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Professora Luciene Dias (à esquerda) fez a mediação da palestra da professora Leda Maria (à direita)

"Não vou falar da morte, mas sim do corpo em pé". Com essas palavras, a poeta, ensaísta e professora da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Leda Maria Martins, abriu a palestra "Nas espirais do tempo: poéticas e performances do corpo-tela”. O encontro foi mediado pela professora Luciene Dias e fez parte da conferência de abertura do 6° Simpósio Internacional da Faculdade de Ciências Sociais (FCS) da Universidade Federal de Goiás (UFG). O evento ocorre com atividades presenciais e remotas até o dia 12 de agosto, tendo como tema "A qualquer descuido da vida, a morte é certa", verso do poema Certidão de Óbito, da linguista e escritora Conceição Evaristo.

Leda Maria Martins é doutora em Estudos Literários pela UFMG e atua na área de Artes Cênicas, com ênfase em teatro, dramaturgia, dança, música e performances rituais. A palestra foi inspirada no livro de sua autoria, intitulado “Performances do tempo espiralar, poéticas do corpo-tela”, no qual debate questões que se ligam a corpo, memória e cultura negra.

“O corpo é lugar e ambiente de inscrição da memória, do conhecimento e da história. Por meio de suas múltiplas raízes de saberes, a África engravida as Américas, em particular o Brasil, onde muitos dos princípios basilares das gnoses negras foram reterritorializadas. Eu gosto de dizer que nossos ancestrais não viajaram sós. Se estavam com pertences, bens materiais e roupagem, então estavam vestidos de suas gnoses, que pelos benefícios dos seus saberes, pelas lembranças de seus aparatos técnicos, os permitiam reescrever aquilo que parecia morrer nas travessias diaspóricas”, analisa Leda.

Para Leda, as corporeidades são percebidas em diversas áreas do conhecimento. A professora diz ainda que muito estudiosos se debruçam sobre possíveis outros meios de abordagem dos “saberes encorporados”, propondo teorias com o objetivo de se criar uma compreensão intelectual sobre as culturas. Essa ação é perceptível, sobretudo nas questões que se ligam a oralidades, dança, música e práticas performáticas como um todo.

“O conceito de performance como um comportamento restaurado implica a ideia de uma repetição permanente, mas também efêmera. Estudiosos apontam que as performances, como as práticas ritualísticas, não são anteriores à linguagem, como muitos dos pensadores europeus defendiam, mas sim constitutivas da mesma. Assim, podemos dizer que as performances em si, assim como seus estudos, nos permitem deslocar o foco do escrito para o amplo e significante repertório dos saberes encorporados”, ressalta.

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Palestra foi realizada no auditório da Biblioteca Central da UFG no Câmpus Samambaia

 

De um modo geral, temas referentes a práticas culturais advindas de povos negros, indígenas e minorias sociais são abordados de forma exótica. Leda afirma que este é o modo operador do sistema de exclusão, que trabalha para desqualificar o sujeito e seus modos de produção e vivência. A professora relata que há quase 30 anos, defende que o conjunto de gnoses negras constitui uma “cultura das encruzilhadas”. Isso significa que o tecido cultural brasileiro é formado por diversos processos de cruzamentos transnacionais, multiétnicos e multilinguísticos, unindo conceitos e formando novos. Os povos negros se constituem justamente nas encruzilhadas desses múltiplos e polissêmicos saberes culturais e corpóreos. Já sobre a ideia de tempo espiralado, que está presente em seu livro e no tema da palestra, Leda explica que não a criou, mas sim a propaga.

“Estou retirando [a ideia de tempo espiralado] do processo de pensamento negro-africano que é trazido pelos nossos antepassados para o Brasil. Um tempo que se curva para frente e para trás, muito diferente da temporalidade ocidental que tem uma única direção em sentido a um futuro inexorável. Nessa perspectiva, quando se olha para o passado, é algo já acabado, separado do presente e do que virá. Não é atoa que a ideia de tempo na lógica ocidental é sinônimo de dinheiro, por isso o olhar é sempre para frente. Progresso está relacionado à produção do sistema capitalista. Por isso, nessa lógica de temporalidade, idosos e crianças são desqualificadas por pertencerem ao passado ou por ainda não terem se estabelecido como sujeito produtor”, explica Leda.

Por isso, a noção de tempo deve ser entendida como algo que gira para frente e para trás, simultaneamente como uma espiral, considerando passado, presente e futuro com complementos e não excludentes. Dessa forma, no âmbito cultural e ritualístico, viver é uma dádiva, morrer não é o fim e a violência não está incluída, pois se valoriza o existir, assim como Leda Maria fez ao falar sobre vida e não sobre morte.

 

Saiba mais sobre o 6° Simpósio Internacional da Faculdade de Ciências Sociais clicando aqui.

 

Fonte: Secom UFG

Categorias: Humanidades FCS Fic