Síndrome de Burnout em trabalhador-estudante pode ser agravada por fatores domésticos
Pesquisa da UFG desenvolveu um protocolo que contribui para diminuir os níveis de Burnout
Letícia Fiuza
Estresse, esgotamento e ansiedade são alguns dos sintomas que acometem trabalhadores-estudantes diagnosticados com a Síndrome de Burnout. Membro do Programa de Pós-Graduação em Saúde Coletiva (PPGSC/UFG), o fisioterapeuta Vinicius de Almeida Lima realizou uma pesquisa com 159 estudantes de graduação em Goiânia que possuíam vínculo empregatício. O estudo visou correlacionar as características sociodemográficas, estilo de vida e fatores psicossociais com os sinais de Síndrome de Burnout nesses estudantes. Entre as principais constatações da pesquisa estão a associação dos sintomas ao número de filhos dos participantes e a falta de apoio no núcleo familiar, em âmbito acadêmico e profissional. A pesquisa resultou no desenvolvimento de um protocolo que contribui para diminuir os níveis de Burnout de trabalhadores-estudantes.
O interesse em pesquisar o tema surgiu quando, ainda na graduação, o pesquisador vivia na condição de estudante-trabalhador e percebia os impactos desse estilo de vida na saúde física e mental. A Síndrome de Burnout é um processo sindrômico caracterizado pelo esgotamento emocional, descontentamento com o trabalho e comportamento antissocial, provocados por condições de trabalho degradantes para o corpo e para a mente. Embora seja uma síndrome diretamente ligada às dinâmicas laborais, a pesquisa buscou relacionar a influência, positiva ou negativa, de outras variáveis, como o ambiente familiar, a prática de exercícios físicos, tempo gasto no trânsito e até quantidade de filhos.
Para a coleta de dados, o pesquisador utilizou a aplicação do questionário Maslach Burnout Inventory - General Survey, que avalia as três dimensões de Burnout, agrupadas nos níveis leve, moderado e crítico. A primeira delas é a Exaustão Emocional, caracterizada pela falta ou ausência de energia entusiasmo, em seguida a Despersonalização, que diz respeito à coisificação das relações interpessoais e à indiferença aos colegas de trabalho e por último a Realização Profissional, indicada pelo sentimento de infelicidade e insatisfação com as atividades laborais. De acordo com as constatações da pesquisa, não apenas o salário é um fator atenuante para o processo sindrômico, mas também as situações do âmbito doméstico.
Uma das surpresas ligadas ao aspecto doméstico foi a descoberta de que trabalhadores-estudantes com dois ou mais filhos apresentam níveis de estresse mais baixos do que os que têm apenas um. A variável revelou que 56% dos participantes pais de dois ou mais filhos configuraram no nível crítico, contra 71% entre os participantes com filho único. Outras variáveis vinculadas à moradia e ao grupo familiar também foram destacadas, como a constatação de que alunos que residem em casas com quatro cômodos ou menos também registram níveis maiores de exaustão emocional do que os que moram em casas maiores.
A correlação aparece também na quantidade de moradores em uma mesma residência. Nas porcentagens de níveis leve (65,5%) e moderado (16,4%) de realização profissional o trabalhador residia sozinho ou com mais uma pessoa, nos casos de nível crítico (42,3%) viviam no mesmo imóvel duas ou três pessoas além do participante da pesquisa. Em relação à exaustão emocional, os grupos de participantes que moram sozinhos e com quatro pessoas ou mais tiveram quase a mesma porcentagem no nível crítico (63,6% e 65,4%, respectivamente). Segundo o pesquisador, é importante ressaltar que nem sempre o ambiente familiar vai atuar como um agravante.
“Depende muito do ambiente familiar. Se for um ambiente bom, positivo, ele vai ajudar a diminuir os níveis de estresse, mas se for um ambiente familiar sem apoio, sem contribuição para a vida daquele discente, então ele vai somatizar um ambiente de trabalho não saudável, insalubre com um ambiente familiar similar”, afirma. Nesse caso, o trabalhador-estudante tem níveis mais altos de estresse e, consequentemente, de Burnout.
A síndrome é pouco conhecida pela comunidade em geral, já que as primeiras pesquisas sobre Burnout são da década de 1970, o que dificulta seu diagnóstico e provoca a culpabilização da vítima em alguns casos. Para o pesquisador, as novas relações de trabalho e o novo olhar para a saúde mental contribuem para promover a disseminação do conhecimento sobre o processo sindrômico. Segundo ele, “as pessoas agora identificam que o trabalho tem lhes causado danos, por isso a sociedade tem percebido mais o Burnout e também por conta desse pensamento de entender o conceito de saúde vinculado ao bem-estar físico, mental e social”.
Protocolo ajudou na diminuição dos sintomas
A pesquisa possibilitou a criação de um protocolo fisioterapêutico para o enfrentamento da Síndrome de Burnout, desenvolvido no laboratório de cinesioterapia do Centro Universitário Estácio de Goiás, que resultou em publicação internacional no Journal of Athletic Enhancement, com abordagens que prezam pelo relaxamento. São utilizadas técnicas de liberação miofascial, de bandagem funcional, ventosaterapia, caminhadas de baixa intensidade e algumas técnicas de massoterapia clássica. De acordo com o pesquisador, na mostra em que a abordagem terapêutica foi feita, 60% das pessoas apresentaram melhora, portanto, a criação de protocolos como esse nas instituições é uma possibilidade para tornar o ambiente acadêmico e profissional mais saudável a fim de mitigar os riscos psicossociais e os sintomas da Síndrome de Burnout.
Além do protocolo, outro fruto da pesquisa promete ajudar trabalhadores-estudantes no futuro. O pesquisador idealizou um Projeto de Lei que cria o Estatuto do Trabalhador-Estudante, com o objetivo de assegurar os direitos à saúde e à educação dessas pessoas. Entre as propostas do Projeto estão a determinação de que a escala de trabalho deve, sempre que possível, ser ajustada de modo a permitir a frequência nas aulas e o abono de faltas por motivo de prestação de prova de avaliação. Inicialmente, a proposta era mais ambiciosa, mas também tinha pouca praticidade, pois precisaria ir até o Senado Federal pelas mudanças que implicaria nas Leis Trabalhistas. Por ora, o pesquisador está em contato com a Assembleia Legislativa, enquanto a proposta passa por reformulações com o objetivo de tornar o Projeto viável, para que em breve possa se tornar real e promover melhorias na vida dos estudantes.
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Fonte: Secom UFG