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Universidade Federal de Goiás
Dinossauro caatinga

Nova espécie de dinossauro é identificada na Caatinga

Em 20/08/24 15:07. Atualizada em 21/08/24 13:54.

Titanossauro Tiamat valdecii foi encontrada por pesquisadores da UFG, UFRJ e UERJ

Dinossauro caatinga

Paleoarte ilustra Tiamat valdecii, a primeira espécie de dinossauro descrita encontrada nas rochas da Bacia Potiguar (Arte: Luciano Vidal)

 

Carolina Melo

Uma expedição organizada por pesquisadores e pesquisadoras da Universidade Federal de Goiás (UFG), da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ) numa região inóspita, a 20 quilômetros da cidade de Quixeré (CE), divisa com o estado do Rio Grande do Norte (RN), resultou em um achado histórico: a identificação de uma nova espécie de titanossauro, sendo ela a primeira espécie de dinossauro encontrada na região da Bacia Potiguar. O estudo foi publicado pela revista científica Zoological Journal of the Linnean Society, disponível na plataforma Oxford Academic.

Batizada com o nome Tiamat valdecii, em homenagem a uma deusa das mitologias suméria e babilônica frequentemente descrita como um dragão, a nova espécie é do grupo dos titanossauros, saurópodes conhecidos por terem corpo robusto, cabeça pequena e alongada, pescoço curto e caudas longas. "Antes da ciência, quando se achavam fósseis desses animais, populares acreditavam ser de dragões. Dessa vez, privilegiamos um nome feminino", conta o paleontólogo, professor da UFG e um dos autores da descoberta, Carlos Roberto dos Anjos Candeiro.

"Passamos 15 dias na Caatinga, a cerca de quatro horas de Fortaleza (CE), fazendo a prospecção, enfrentando dias de calor e de chuva. Um dia, em especial, choveu tanto que a escavação foi inundada. É um esforço físico gigante, mas valeu muito especialmente pelos resultados do trabalho", afirma o professor da UFG.

Com o trabalho de campo, os pesquisadores e as pesquisadoras encontraram as vértebras caudais de titanossauro completas e parcialmente preservadas, sendo elas: três vértebras caudais anteriores, quatro vértebras caudais médias e um arco neural parcial. "Um dos pesquisadores, o Paulo Vitor Pereira, primeiro autor do artigo científico que apresentou a descoberta, fez a descrição do material a partir de um intenso trabalho", lembra o professor da UFG.

 

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Dinossauro caatinga

Pesquisadores da UFG, UFRJ e UERJ participaram da expedição a 20 quilômetros de Quixeré (CE), divisa com o RN (Foto: Arquivo Pessoal)

 

Distinção

A nova espécie se distingue de outros titanossauros por apresentar uma proeminência extra bem marcada numa estrutura das vértebras (pré-zigapófises), profundamente cavada tanto na parte da frente quanto na posterior. Ela também tem uma vértebra média curta, com uma área de articulação bem definida para a estrutura óssea chamada arco hemal. "As vértebras de Tiamat valdecii, que têm uma forma côncava na frente, são o registro mais antigo desse tipo conhecido no Brasil", afirma o estudo.

De acordo com os pesquisadores, as estruturas do Tiamat, que ajudam a conectar uma vértebra caudal média a outra, ofereciam maior estabilidade e permitiam ao animal mover a cauda de um lado para o outro com maior liberdade, sem prejudicar as articulações. "Essas estruturas representam uma solução evolutiva para manter a estabilidade da coluna vertebral".

Os fósseis encontrados na Formação Açu, unidade geológica da Bacia Potiguar, no Ceará, agora estão abrigados na Coleção de Répteis Fósseis do Departamento de Geologia da UFRJ. "A UFG tem uma parceria de pesquisa e de ensino com a UFRJ, junto ao Laboratório de Macrofósseis. Fazemos pesquisas em conjunto. O meu foco, nessa parceria, são os dinossauros", conta o professor da UFG.

 

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Dinossauro caatinga

Vértebras da cauda atribuídas ao Tiamat valdecii: estruturas ofereciam estabilidade (Imagem: Reprodução)

 

Avanço histórico

A nova descoberta preenche "uma lacuna crucial" sobre os "estágios iniciais da radiação do titanossauro ao redor do mundo", afirma o estudo. A Formação Açu, onde foram encontrados os fósseis, é uma unidade geológica do início do Período Cretáceo, composta principalmente de arenito, presente em ambientes onde rios e deltas se encontram. Segundo o professor da UFG, Carlos Candeiro, a área mantinha a continuidade territorial entre África e América do Sul.

"Os continentes eram colados. Era a mesma massa de terra. Não tinha o oceano. E o Tiamat tem uma afinidade muito grande com os dinossauros da África e da Argentina. Então ele é um pivô de transição desse parentesco", explica. De acordo com o estudo, a nova espécie apoia a suposição de uma diversificação mais ampla de titanossauros durante o Cretáceo Inferior do Brasil. "Trabalhos futuros com espécimes mais completos da mesma região podem ajudar em nossa compreensão da primeira radiação do titanossauro".

A identificação do Tiamat valdecii na região isolada do Ceará "traz à tona o local para a paleontologia do mundo", afirma Carlos. "E isso também é um fator de transformação social", acredita o professor. "Movimenta o turismo da região e oferece recursos financeiros para a comunidade local, que fortalece seu sentimento de pertencimento".

 

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Dinossauro caatinga

Pesquisador em trabalho de campo na Formação Açu, unidade geológica do início do Período Cretáceo (Foto: Arquivo Pessoal)

 

Expedição

Além da identificação e descrição do Tiamat valdecci, o trabalho de campo ao longo da expedição na Bacia Potiguar também possibilitou o registro de cinco vértebras incompletas dos dinossauros rebbachisaurídeos ("lagartos cortadores de relva"), saurópodes caracterizados por terem pescoços e caudas longas e serem herbívoros. A descoberta, portanto, sugere que pelo menos dois grupos diferentes de saurópodes – titanossauros e rebbachisaurídeos – viveram juntos nesta região.

De acordo com o estudo, a presença de titanossauros e rebbachisaurídeos vivendo juntos nos mesmos ambientes, como na Formação Açu, é bem conhecida e registrada na literatura científica. Isso acontece principalmente em áreas da África e América do Sul que datam do início ao meio do Período Cretáceo. Estudos na Argentina sugerem que essa convivência entre grupos de dinossauros no mesmo local provavelmente ocorreu porque eles ocupavam diferentes nichos ecológicos, ou seja, cada grupo explorava recursos diferentes para evitar competição.

As descobertas, divulgadas na Zoological Journal of the Linnean Society, são resultados do projeto de pesquisa "Prospecção e estudo paleobiologia e sistemático da paleobiota das bacias de Itaboraí e Potiguar", coordenado pela professora da UFRJ, Lílian Paglarelli Bergqvist, e contemplado pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e pela Fundação Carlos Chagas Filho de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro (Faperj).

Acesse aqui o artigo completo "A new sauropod species from north-western Brazil: biomechanics and the radiation of Titanosauria (Sauropoda: Somphospondyli)".

Fonte: Secom UFG

Categorias: Paleontologia Ciências Naturais FCT Destaque Notícia 6