PAINEL ECONÔMICO
Envelhecimento populacional e seus impactos no Brasil e no Mundo
Edson Roberto Vieira
Antônio Marcos de Queiroz*
O estudo World Population Prospects 2024, divulgado em julho deste ano pela Divisão de População das Organizações das Nações Unidas (ONU) prevê que a população mundial deve continuar crescendo por mais 50 ou 60 anos, atingindo um pico de cerca de 10,3 bilhões de pessoas em meados da década de 2080, ante 8,2 bilhões em 2024. Ocorre que as médias só funcionam bem para explicar uma determinada realidade quando os valores são relativamente uniformes. E as dinâmicas populacionais dos países em geral estão longe de serem uniformes. Os dados da ONU dão conta de que 63 países que concentram 28% da população mundial já atingiram o pico de sua população antes de 2024 e que 48 outros países responsáveis por 10% da população mundial devem atingir o número máximo de habitantes entre 2025 e 2054.
Trata-se de uma dinâmica cujas variáveis explicativas parecem ser cada vez mais comuns entre os países. As mulheres têm tomado sua decisão de ter ou não filhos paulatinamente de forma mais tardia. Ao lado disso, a taxa de fecundidade tem caído a ponto de não ser suficiente para atingir a taxa de reposição populacional em muitos países. Com isso, as bases das pirâmides etárias pouco a pouco têm se tornado mais estreitas, ilustrando claramente o processo de envelhecimento populacional que vem ocorrendo com mais intensidade no período recente. Para muitos dos países no grupo com níveis relativamente baixos de fertilidade, a imigração deve ser o principal impulsionador do crescimento populacional futuro. Esses países incluem Austrália, Canadá, Catar, Arábia Saudita, Emirados Árabes Unidos e Estados Unidos. Na ausência de migração, a população desses países provavelmente atingiria o pico muito mais cedo e em um nível mais baixo.
No caso do Brasil, o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) divulgou recentemente as primeiras Projeções de População com dados do Censo Demográfico 2022. Além dos dados censitários, o estudo utilizou informações da Pesquisa de Pós-Enumeração 2022, nascimentos, mortes e migração, no âmbito do Método das Componentes Demográficas. De forma surpreendente, o Instituto estima que a população brasileira deve iniciar um processo de queda a partir de 2042, um ano depois de ter atingido 220,4 milhões, seu nível máximo, chegando a 199,3 milhões em 2070 – que é o último ano alcançado pelas projeções.
Em linha com o que vem ocorrendo em outros países, a média de filhos por mulher em idade reprodutiva no Brasil, que identifica a taxa de fecundidade, passou de 6,16 filhos em 1940 para 1,57 filho por mulher em 2023. A redução dessa taxa ao longo dos anos no Brasil parece ser explicada, entre outros por fatores, pela mudança de uma sociedade predominantemente agrária – na qual o número mais elevado de filhos era importante para auxiliar muitas famílias que lidavam com a agricultura de subsistência – para um processo de urbanização mais acelerado, sobretudo a partir da década de 1960, que facilitou o acesso das mulheres à educação, ao mercado de trabalho e ao uso de métodos contraceptivos.
O processo de urbanização e os avanços da medicina também parecem estar por trás do envelhecimento da população brasileira, na medida em que oportunizou de forma menos complexa e dispendiosa o acesso ao tratamento de doenças crônicas e de outras doenças que afetam mais diretamente as pessoas com idade mais avançada, como arteriosclerose, mal de Alzheimer, doenças cardiovasculares e enfermidades hipertensivas. Assim, de acordo com os novos dados do IBGE, a expectativa de vida do brasileiro subiu de 71,1 anos em 2000 para 76,4 anos em 2023, podendo alcançar 83,9 anos em 2070. Com isso, a proporção de pessoas com 60 anos ou mais na população do país deve aumentar de 8,7% em 2000 para 15,6% em 2023, com as projeções apontando para 37,8% em 2070.
Assim como entre os países, as projeções de população variam muito entre os 26 estados e o Distrito Federal. As projeções do IBGE sugerem que as quedas das populações dos estados de Alagoas e Rio Grande do Sul devem ter início já em 2027 e a do Rio de Janeiro em 2028. Na outra ponta, o estado do Mato Grosso é a única Unidade Federação que não deve apresentar redução do crescimento populacional até 2070, seguida por Santa Catarina e Roraima, cuja população deve cair a partir de 2064, e depois de Goiás, com queda a partir de 2056, quando sua população deve cair de 8.595.326 habitantes para 8.594.507 habitantes.
Para entender melhor essas dinâmicas, basta ter em mente, por exemplo, que indicadores importantes do estado Goiás utilizados no cálculo das projeções da população, como a taxa de fecundidade e a expectativa de vida ao nascer, são muito semelhantes aos do Brasil. A taxa de fecundidade goiana era 1,62 filhos por mulher e a expectativa de vida de 76,6 anos em 2023. A principal causa da diferença na dinâmica populacional goiana é que o estado atrai muitas pessoas vindas de outras regiões do país, o que torna sua taxa de crescimento populacional superior à nacional. Os cinco estados dos quais Goiás atrai mais pessoas são Minas Gerais, Bahia, Distrito Federal, Maranhão e Tocantins.
Os novos dados disponibilizados pelo IBGE são fundamentais para que sejam planejadas e realizadas políticas públicas mais eficazes que dependem da dinâmica populacional. De imediato, esse processo intensifica as preocupações da sociedade acerca da sustentabilidade dos sistemas de previdência social, haja vista a tendência de se ter no país um número cada vez menor de pessoas ativas vis-à-vis as inativas em um futuro não muito distante. Mas, além da questão previdenciária, outros temas importantes ganham luz a partir das novas projeções populacionais do IBGE.
Há a questão dos recursos que os municípios recebem do Fundo de Participação dos Municípios (FPM), que se alteram quando há mudanças na sua população, podendo restringir ou aprimorar a capacidade de execução de políticas públicas em nível local. Outra questão importante refere-se aos impactos do crescimento populacional sobre o crescimento econômico e, por conseguinte, o mercado de trabalho. Nesse momento, por exemplo, a taxa de desocupação capturada pela Pesquisa Nacional de Amostra de Domicílios Contínua (Pnad-C) está no seu menor patamar para um trimestre móvel terminado em julho da série histórica da pesquisa, iniciada em 2012, e setores como a construção civil, hipermercados e algumas atividades de serviços têm encontrado dificuldade para contratar novos trabalhadores.
Isso tudo nos leva a pensar se a escassez de trabalhadores não vai travar o crescimento da economia brasileira no futuro. Há de se cuidar para que haja aumento da produtividade da mão de obra no país em todos os setores. Também será preciso analisar se, em lugar de se construir novas creches e escolas, não seria oportuno criar lares para cuidar dos idosos, liberando as pessoas cuidadoras em idade ativa para desempenhar outras funções no mercado de trabalho.
Boletim de Conjuntura Econômica de Goiás – N. 172/setembro de 2024.
* Edson Roberto Vieira e Antônio Marcos de Queiroz são professores da Faculdade de Administração, Ciências Contábeis e Ciências Econômicas (FACE) da UFG.
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Fonte: FACE
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