Adaptação metabólica pode ser a nova estratégia de combate à esquistossomose
Pesquisa realizada no Iptsp/UFG também propõe modelo de estudo para outras doenças parasitárias
Manipulação do Biomphalaria glabrata no Laboratório de Malacologia do Centro de Pesquisa e Experimentação Animal (Foto: Marina Sousa)
EM SÍNTESE:
- Caramujo Biomphalaria glabrata adapta seu metabolismo para sobreviver em ambientes com pouco oxigênio.
- Adaptação envolve a inversão do ciclo de Krebs, permitindo a produção de energia mesmo em condições adversas.
- Bloquear esse mecanismo pode ser uma nova estratégia para combater a esquistossomose sem afetar o meio ambiente.
Marina Sousa
Caramujos como o Biomphalaria glabrata, quando estão infectados, são causadores de uma doença parasitária chamada esquistossomose, conhecida popularmente como barriga d'água, xistose ou doença dos caramujos. Ela geralmente afeta pessoas em vulnerabilidade que vivem sem saneamento básico.
Um estudo realizado pelas estudantes da Universidade Federal de Goiás (UFG) Luiza Wobeto (Biotecnologia) e Júlia Barreto Radispiel (Biomedicina) revela que o molusco hospedeiro intermediário sobrevive em ambientes com baixa disponibilidade de oxigênio e que isso se dá por meio de adaptação metabólica.
Orientadas pelo professor do Instituto de Patologia Tropical e Saúde Pública (Iptsp), José Clecildo Barreto Bezerra, a pesquisa mostra que normalmente esses moluscos precisam de oxigênio para gerar energia. Porém, em situações de pouca disponibilidade de oxigênio (hipóxia), eles utilizam um "plano B" metabólico chamado de inversão do ciclo de Krebs para continuar produzindo energia e sobreviver às adversidades ecossistêmicas em que se encontram.
Essa adaptação ocorre graças a um sistema de enzimas chamado fumarato redutase, que ajuda a transformar de forma inversa o fumarato em succinato, metabólitos do ciclo de Krebs na respiração celular, permitindo ao molusco gerar energia celular mesmo em condições adversas. A pesquisa identificou essa mudança metabólica com análises feitas em laboratório, mostrando como os níveis dessas substâncias mudam, principalmente em baixas concentrações de oxigênio.
Todos os anos, a esquistossomose afeta milhares de pessoas no mundo. Ela é uma das 20 Doenças Tropicais Negligenciadas (DTNs) presentes nas Américas.
Leia também: Novas espécies de fungos são batizadas em homenagem à UFG e Cora Coralina
Júlia Radispiel e Luiza Wobeto com o troféu de 1° lugar da Mostra de Educação Profissional e Tecnológica do Conpeex 2024 (Foto: Arquivo pessoal)
Estratégias
De acordo com Júlia Radispiel, o molusco aquático de água doce Biomphalaria glabrata é essencial para a sobrevivência do parasito Schistosoma mansoni e entender esse processo de adaptação pode contribuir para desenvolver estratégias para controlá-lo ou até eliminá-lo de forma mais eficiente.
O molusco se adapta muito bem a condições adversas, o que torna seu controle um desafio. As pesquisadoras explicam que se puderem bloquear o sistema fumarato redutase, é possível interromper a produção de energia do molusco e, por consequência, do parasito.
O professor José Clecildo acrescenta que, atualmente, o método disponível para controlar o hospedeiro tem impacto ambiental em outros organismos, prejudicando todo o ecossistema aquático. Por isso, é essencial encontrar alternativas que reduzam a população do molusco sem afetar outros organismos que não são alvos do controle da doença parasitária.
O estudo do mecanismo de inversão do ciclo de Krebs em invertebrados, como moluscos ou parasitos, têm gerado interpretações paralelas na resistência metabólica de células cancerígenas em humanos. Portanto, outro ponto relevante apontado pela pesquisa é a importância de incluir essa adaptação metabólica no conteúdo das aulas de bioquímica, tornando o ensino mais dinâmico, aplicado e alinhado às demandas de saúde pública.
"O objetivo do nosso estudo é levar essa percepção ao ensino técnico e superior, permitindo que ela seja compartilhada com outras pessoas. Dessa forma, esperamos capacitar mais pesquisadores a desenvolver novos insights e métodos inovadores para o controle de doenças que afetam milhões de pessoas", explica Luiza Wobeto.
A pesquisa foi conduzida no Laboratório de Malacologia do Centro Multiusuário de Pesquisa e Experimentação Animal (CMPEA) do Iptsp. O trabalho conquistou o primeiro lugar na Mostra de Educação Profissional e Tecnológica na edição 2024 do Congresso de Ensino, Pesquisa e Extensão (Conpeex) da UFG.
Receba notícias de ciência no seu celular
Siga o Canal do Jornal UFG no WhatsApp e nosso perfil no Instagram.
É da UFG e quer divulgar sua pesquisa ou projeto de extensão?
Preencha aqui o formulário.
Comentários e sugestões
jornalufg@ufg.br
Política de uso
A reprodução de matérias e fotografias é livre mediante a citação do Jornal UFG e do autor.
Fonte: Iptsp
Categorias: Saúde Pública Saúde IPTSP Notícia 1