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Universidade Federal de Goiás
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Violência contra as mulheres: tentativas de ressignificação

Em 28/10/16 11:38. Atualizada em 09/11/16 11:04.

Érika Nunes de Medeiros fala sobre pesquisa que realizou sobre o assunto

Érika Nunes de Medeiros Borges

Érika Nunes de Medeiros F. Borges

O problema da violência contra as mulheres é recorrente em diversas histórias de vida, e marca as subjetividades e as memórias como experiências que nem sempre são compartilhadas e ouvidas. Minha pesquisa qualitativa (2016) traz para o espaço público da ciência uma problemática tida como da esfera das relações amorosas e, portanto, de âmbito privado. A violência contra as mulheres tem gênero, cor, raça, etnia e classe. É uma questão de poder, pois a percepção da violência contra as mulheres pelas instâncias da esfera pública como problema social, histórico, cultural e também político é recente, e deve seu percurso às longas e estratégicas formas de luta do movimento feminista e de mulheres.

A partir da análise de histórias de vida focalizadas de cinco mulheres residentes em Goiânia, que tiveram em comum a exposição a situações de violência desencadeadas por seus namorados ou maridos, focalizei os significados subjetivos atribuídos às experiências vividas, com ênfase nas tentativas de ressignificação e de resistência por parte dessas mulheres, que sinalizaram possíveis rupturas com a situação de violência.

O estudo mostrou que por vezes há a negação de que a violência seja socialmente engendrada, sendo percebido, assim, como traço idiossincrático de seus perpetradores, tais como comportamentos explosivos ou ciúmes. Apontou que mesmo mulheres com alta escolaridade e não dependentes financeiramente de seus companheiros tiveram dificuldade de expor, denunciar e buscar ajuda profissional à época (com exceção de uma que processou o agressor). Alguns dos motivos citados para justificar a não denúncia são: não reconhecimento da violência e sentimento de culpa na época, dependência emocional, medo, vergonha, impotência, carência de apoio da família e de relações de amizade e ausência de recursos para contratar um/a advogado/a.

Entretanto, as entrevistadas expressaram em maior ou menor grau, mesmo afetadas pelo medo e traumas da situação pós-violência, ter produzido estratégias de resistência aos mecanismos de poder, sujeição e dominação que têm como objetivo normalizar/normatizar, padronizar, regular, controlar e disciplinar as vidas das mulheres, seus corpos e subjetividades. Reconstruindo a memória do evento traumático, todas afirmam ter tido a possibilidade de romper com o agressor nos primeiros indícios de violência (ciúmes, controle sobre a vida, trabalho, agenda, patrimônio, corpo e estética da mulher), porém, não o fizeram devido à complexidade do problema e ao modo como foram socializadas/educadas para verem o mundo sexista de ódio contra e de sujeição das mulheres como natural.

Assim sendo, a mudança ocorre no seio da própria dinâmica de poder que a constituiu, cada mulher à sua maneira: militância feminista, contato com o feminismo ou movimento de mulheres, pesquisa acadêmica e profissional, inserção pública e política, maternidade, novos relacionamentos amorosos, profissão que tem significado correlacionado com a violência sofrida ou estar em posição reconhecida socialmente. Portanto, as entrevistas permitiram concluir que essas mulheres conseguiram dar um significado novo às suas vidas, apontando o desejo de se reconstruir, algo já – ou próximo de ser – conquistado nas narrativas de todas elas. Suas tentativas de ressignificação apontam para um deslocamento nas relações de poder, tal como ressaltam estudos feministas que se ocupam do tema das violências.

rika Nunes de Medeiros F. Borges é mestra em Sociologia pela UFG (2016)

 

Categorias: artigo Edição 84