Acelerar vacinação infantil poderia evitar mais de 400 óbitos em crianças
Total estimado supera o número de óbitos nesta faixa etária ocorrido de março de 2020 até fevereiro de 2022 durante a pandemia, que foi de 308 óbitos
Kharen Stecca
Se a vacinação infantil no Brasil tomasse um ritmo acelerado de 1 milhão de doses por dia sendo aplicadas nos 3 próximos meses, ou seja, praticamente quadruplicar o ritmo de hoje (250 mil doses por dia), a estratégia teria o potencial de evitar um total de cerca de 14.000 hospitalizações e 3.000 óbitos por COVID-19 em todos os grupos de idade. Esse ritmo mais acelerado já aconteceu em muitas campanhas anteriores. A comparação teórica dos dois cenários de vacinação (lenta e acelerada) mostra que uma campanha mais acelerada reduziria em cerca de três vezes as hospitalizações e os óbitos pela COVID-19 estimados no período avaliado. Deste total, apenas em crianças de 5-11 anos, estima-se que seriam evitadas cerca de 5.400 hospitalizações e 430 óbitos por COVID-19.
Essas são as estimativas de uma nota técnica organizada pelo Grupo de Modelagem Dinâmica do SaRS-CoV-2 no Brasil, coordenado pela professora da Universidade Federal de Goiás, Cristiana Toscano, que estimou o impacto da vacinação contra COVID-19 em crianças de 5 a 11 anos sobre a redução das internações e óbitos por COVID-19, além dos custos evitados de internações hospitalares no Brasil. As hospitalizações evitadas também resultam em uma redução de custos em todas as faixas etárias da ordem de R$ 146 milhões, sendo, deste total, R$ 56 milhões decorrentes de hospitalizações de crianças de 5-11 anos.
Para o trabalho foi utilizado um modelo epidemiológico tipo SIR para as diferentes faixas etárias, modelando a nova onda da ômicron a partir de dezembro 2021/janeiro 2022, e projetando para os próximos 3 meses, considerando os parâmetros de expansão rápida da ômicron e a situação atual da população em termos de vacinação;
Para o cenário atual, estima-se que a vacinação infantil já evitou no total mais ou menos 1000 mortes e quase 6000 hospitalizações (efeito indireto) em todas as faixas etárias e, para a faixa de 5-11 anos, já evitou mais ou menos 180 mortes e aproximadamente 2600 hospitalizações.
Só na faixa etária de 5 a 11 anos, o número de mortes evitáveis com a aceleração da vacina seria da mesma ordem de grandeza que o número total de óbitos (n=308) e de hospitalizações (n=6.877) por COVID-19 que ocorreram nessa faixa etária durante toda pandemia da COVID-19, desde março de 2020 até fevereiro de 2022, no Brasil.
A nota também reforça que neste momento epidemiológico com a variante Ômicron em destaque, a preocupação é ainda maior com as crianças. Estas usualmente tem apresentando doença leve ou assintomática. No entanto, as crianças têm um papel importante na dinâmica da epidemia, já que elas entram em contato com suscetíveis de diversas faixas etárias. No contexto da Ômicron e sua alta transmissibilidade, tem se observado alta transmissão viral em crianças, e em alguns locais já foi demonstrado um grande aumento de hospitalizações por COVID-19 nessa faixa etária, superando os piores momentos da pandemia, como nos EUA e Rio Grande do Sul, por exemplo.
Por outro lado, a nota também destaca a alta efetividade das vacinas nos estudos já apresentados: inúmeros estudos evidenciaram efetividade de mais de 90% na redução de hospitalizações e mortes por COVID-19 em crianças de 5-11 anos.
Problemas estratégicos na vacinação
Após liberação do registro pela ANVISA da vacina de mRNA da Pfizer (BNT162b2) para uso em crianças de 5 a 11 anos, o grupo aponta que houve intenso debate e circulação de inúmeras notícias falsas. Em contrapartida, inúmeras sociedades especializadas se manifestaram a favor da vacina. Em janeiro de 2022 foi iniciada a vacinação de crianças deste grupo etário, em meio a muitas dificuldades operacionais e, principalmente, envolvendo poucas estratégias de mobilização e comunicação sobre a importância da vacinação neste grupo de idade.
Com esse cenário, em 7 de fevereiro de 2022, menos de 20% das crianças na faixa entre 5 a 11 anos tomaram a primeira dose da vacina. Ressalta-se que há variação importante de cobertura vacinal entre os Estados brasileiros, com alguns deles apresentando coberturas extremamente baixas, em torno de 4% apenas. No cenário global, vários países que iniciaram a vacinação contra COVID-19 em crianças já demonstraram impacto importante desta estratégia na redução de hospitalizações, óbitos e complicações relacionadas à COVID-19 nesta população.
Pesquisadores
O Grupo de Modelagem Dinâmica do SaRS-CoV-2 no Brasil é financiado pelo CNPq e coordenado pela professora do Instituto de Patologia Tropical e Saúde Pública (IPTSP-UFG), Cristiana Toscano, com a participação do professor do Instituto de Ciências Biológicas da UFG, José Alexandre Felizola Diniz Filho, além de vários pesquisadores da UFG, Universidade Estadual Paulista, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Universidade de São Paulo, Universidade Estadual Paulista e Universidade Federal do ABC.
Para saber mais:
Vacinação infantil para Covid-19: o que é preciso saber
Fonte: Secom UFG