Um país melhor se faz com investimento em ciência
Aldo Zarbin, da UFPR, mostrou que destinar recursos para C&T promove desenvolvimento econômico e social
Texto: Luiz Felipe Fernandes
Foto: Evelyn Parreira
"Um país não investe em ciência e tecnologia porque é rico. Um país é rico porque investe em ciência e tecnologia". A inversão não é mero recurso retórico. Em sua palestra no encerramento do 20º Congresso de Pesquisa, Ensino e Extensão (Conpeex) da Universidade Federal de Goiás (UFG), na última sexta-feira (24/11), o professor Aldo Jose Gorgatti Zarbin, da Universidade Federal do Paraná (UFPR), mostrou com dados a correlação entre investimento público em Ciência e Tecnologia (C&T), qualidade da produção científica e desenvolvimento econômico e social.
Membro titular da Academia Brasileira de Ciências (ABC), Aldo abriu sua fala com o exemplo da China, um país que saiu da agricultura de subsistência para a segunda maior economia do mundo. "Não foi mágica", afirmou o professor, se referindo ao investimento maciço do governo chinês em ciência, tecnologia e educação. "É mais que conhecida a estratégia dos governos de se pautar no investimento público em C&T para promover o desenvolvimento econômico", disse Aldo, citando também a Alemanha e o atual governo dos Estados Unidos.
Dados da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco) mostram que as 20 maiores economias do planeta concentram 92% dos investimentos globais em C&T. Entretanto, como alertou o professor, a ciência é feita não só para o crescimento econômico, mas sobretudo para a melhoria da qualidade de vida da população. "Dependemos fundamentalmente de C&T, mas, mais que isso, dependemos de água potável, saneamento básico, energia, fármacos".
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Pró-reitor de Pós-Graduação da UFG, Felipe Terra Martins (dir.), e Aldo Zarbin, professor da UFPR, durante o Conpeex
Mecanismos da ciência
Nesse sentido, é possível dizer que a ciência, segundo o professor, possui três mecanismos: criar algo que não existia, melhorar aquilo que já existe e fornecer respostas a situações emergenciais e inesperadas. Os efeitos práticos estão, por exemplo, no aumento da expectativa de vida, resultado do desenvolvimento de vacinas, de antibióticos, do saneamento básico e da compreensão geral sobre o organismo e as enfermidades.
Em um exemplo recente, Aldo lembrou da pandemia de covid-19. "Absolutamente todas as ciências estiveram envolvidas", ressaltou. Assim, foi possível identificar o vírus e suas variantes e compreender suas formas de transmissão. No aspecto social, a ciência aproximou as pessoas por meio dos avanços tecnológicos na área de telecomunicações, e no aspecto histórico possibilitou aprender com a experiência de crises sanitárias passadas.
Enfatizando que essa ciência de qualidade também é feita em solo brasileiro, o professor da UFPR citou a pesquisa com o etanol e o desenvolvimento do motor flex, a descoberta da relação entre o zika vírus e a microcefalia, a Empresa Brasileira de Aviação (Embraer), a tecnologia de exploração de petróleo no pré-sal, a descoberta do méson pi com o físico César Lattes e o pioneirismo em biologia do solo com a engenheira agrônoma Johanna Döbereiner. "Temos que ter muito orgulho disso".
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"É nas universidades que estão sendo produzidas as bases para o crescimento econômico", afirmou Aldo Zarbin
Investimento
Evidentemente, nada disso ocorre no vácuo. Os números apresentados pelo professor sinalizam o aumento do investimento público em C&T no Brasil, com um claro ponto de inflexão ascendente no orçamento público em 2004. Os frutos dessa iniciativa foram colhidos na década seguinte. Entre 2013 e 2018, a produção científica brasileira em número de artigos publicados cresceu 30% a mais que a média de todos os outros países.
Além disso, Aldo chamou a atenção dos participantes para o protagonismo das universidades públicas: 95% da ciência do país é produzida em universidades ou institutos de pesquisa públicos, sobretudo em programas de pós-graduação. "É na universidade pública que estão sendo produzidas as bases para o crescimento econômico, para a soberania nacional, para a resposta às crises e para a redução das desigualdades", enfatizou.
Paradoxalmente, em 2016 o Brasil viu o orçamento dessas instituições encolherem significativamente. Além disso, as universidades foram alvo de ataques. Para o professor, a tentativa de desmoralização e de desmonte não é recente e integra as investidas que buscam privatizar o ensino superior, como já foi recomendado pelo Banco Mundial. Em 2022, parlamentares também propuseram um projeto de emenda constitucional que permitiria a cobrança de mensalidade em universidades públicas.
Os efeitos negativos já podem ser sentidos. No ano passado, o Brasil registrou uma grande queda na produção científica, maior até mesmo que a da Ucrânia em guerra. Pela primeira vez também houve diminuição na formação de doutores. A guinada política nas últimas eleições são, segundo Aldo, um respiro. Em fevereiro deste ano, por exemplo, o governo federal anunciou o reajuste nos valores e nas quantidades das bolsas de pós-graduação e iniciação científica.
Em tom otimista, Aldo afirmou esperar que o país esteja passando por um momento de retomada dos investimentos públicos em C&T. "Ciência é política de estado, não de governo", pontuou. "Temos que dedicar a vida para lutar por universidades públicas fortes, independentes, soberanas, livres no pensar, plurais e democráticas".
Fonte: Secom UFG
Categorias: Conpeex 2023 Institucional