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Universidade Federal de Goiás
Setembro Amarelo

Psicóloga fala sobre papel da escola e da família na prevenção do suicídio

Em 06/09/24 13:35. Atualizada em 02/10/24 09:34.

Apesar do tabu, assunto precisa ser abordado com cuidado e sensibilidade

 

Setembro Amarelo

Campanha Setembro Amarelo foi criada para aumentar a conscientização sobre o suicídio e as formas de preveni-lo (Foto: Tetiana Soares)

 

Reportagem: Eduardo Bandeira
Edição: Luiz Felipe Fernandes

Em uma das cenas do filme "Barbie", lançado em 2023, a personagem Barbie Estereotipada, interpretada por Margot Robbie, está em uma festa animada com suas amigas, outras Barbies. No auge da diversão e da dança, ela de repente pergunta: "Vocês já pensaram sobre a morte?". A indagação faz com que todos ao seu redor parem, em choque. A cena gerou repercussão nas redes sociais ao ilustrar uma reação comum quando o tema "morte" é abordado.

Apesar do tabu, setembro é o mês em que se vê com mais frequência postagens e mobilizações de pessoas, empresas e instituições em apoio ao Setembro Amarelo, uma campanha destinada à conscientização e prevenção do suicídio. Embora a intenção em compartilhar essas informações seja positiva, é crucial tratar um assunto tão sensível com cuidado.

Por isso, o Jornal UFG preparou a série "Setembro Amarelo: por uma vida que vale a pena viver", com o objetivo de contribuir para a discussão do assunto e seu impacto na vida dos indivíduos e da sociedade. Na primeira reportagem, conversamos com a psicóloga e professora aposentada da Faculdade de Educação da Universidade Federal de Goiás (FE/UFG), Célia Maria Ferreira da Silva, para esclarecer questões sobre o suicídio e a campanha de prevenção.

Setembro Amarelo

Célia explica que o Setembro Amarelo foi criado em 2014 por diversas entidades, em parceria com o Centro de Valorização da Vida (CVV), o Conselho Federal de Medicina (CFM) e a Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP). A campanha visa aumentar a conscientização e a educação sobre o suicídio.

A campanha ocorre em setembro porque o dia 10 deste mês foi escolhido como o Dia Mundial de Prevenção ao Suicídio pela Associação Internacional para a Prevenção do Suicídio (IASP), em colaboração com a Organização Mundial da Saúde (OMS), em 2003.

Para Célia, o suicídio é um tabu ainda mais profundo que a morte, gerando uma série de sentimentos complexos, como culpa, raiva e até mesmo alívio, em alguns casos. Quando um ente querido comete suicídio, os familiares frequentemente se perguntam se poderiam ter feito algo diferente. Esse questionamento pode gerar um isolamento e dificultar o processo de luto.

A psicóloga explica que o luto após um suicídio é particularmente complexo e muitas vezes mais prolongado. A culpa intensifica esse período, levando os familiares e amigos a se questionarem se poderiam ter prevenido a tragédia. Esse processo é frequentemente marcado pela vergonha e pelo estigma, que dificultam a comunicação aberta e o suporte adequado durante o luto.

 

Leia também: Plantão do curso de Psicologia oferece acolhimento gratuito à comunidade

 

Barbie

No filme "Barbie", de 2023, personagem causa constrangimento ao falar sobre a morte em um mundo cor-de-rosa (Imagem: Reprodução)

 

Alertas e prevenção

No contexto da campanha Setembro Amarelo, que visa a prevenção do suicídio, a identificação dos sinais de alerta é crucial para o cuidado de pessoas psicologicamente vulneráveis. Segundo a professora, mudanças de comportamento, como isolamento excessivo e dificuldades para enfrentar tarefas cotidianas, são indicadores importantes de risco.

Além disso, frases preocupantes como "eu sou um peso para os outros" ou "eu gostaria de me livrar deste sofrimento" também podem sinalizar que a pessoa está em sofrimento. "É essencial buscar ajuda médica e psicológica ao observar esses sinais. O tratamento adequado pode incluir medicação e psicoterapia, ajudando a pessoa a desenvolver habilidades de enfrentamento e a lidar com o sofrimento", recomenda Célia.

O ambiente educacional, como a escola e a universidade, assim como a família, têm papéis fundamentais nessa prevenção. Isso porque professores passam muito tempo com os alunos e podem perceber mudanças de comportamento, além de ter uma ponte direta com os pais, com o objetivo de dar o suporte necessário.

Célia explica que "a conscientização e a educação sobre o suicídio são cruciais para que a sociedade possa oferecer o suporte necessário e criar um ambiente de apoio para aqueles em sofrimento e para os enlutados".

Abordagem

Célia comenta que o Setembro Amarelo vem ganhando cada vez mais visibilidade e que, inicialmente, o engajamento das associações médicas e faculdades ajudou na divulgação e no suporte. Contudo, atualmente há uma preocupação com a forma como o tema é abordado.

"Algumas iniciativas, embora importantes, muitas vezes carecem de base científica e teórica sólida. Há uma tendência a tratar o tema de maneira superficial, o que pode ser prejudicial".

Dessa forma, uma questão delicada é a maneira como o suicídio é abordado em produções fictícias. Em 2017, a polêmica em torno do seriado "13 Reasons Why", da Netflix, levantou discussões sobre se esse deveria ser um tema abordado fora da área da psicologia e da medicina.

Sobre isso, Célia acredita que a responsabilidade dessas produções é transmitir o tema de maneira sensível e educativa, evitando glamourizar ou simplificar a questão. "É importante abrir espaço para conversas e educação sobre saúde mental, sem transformar o tema em um tabu ou tratá-lo de forma sensacionalista".

Outro alerta trazido por Célia diz respeito aos riscos do ambiente on-line, que pode causar um grande impacto negativo sobre a saúde mental dos indivíduos, especialmente com a presença de discursos de incentivo.

Por isso, a OMS recomenda evitar a divulgação de detalhes específicos sobre métodos de suicídio e promover campanhas de conscientização contínuas. Também é importante que pais e responsáveis estejam atentos ao que os jovens estão acessando e com quem estão interagindo on-line.

 

 

Psiquiatra explica importância da saúde mental para prevenção do suicídio

 

Na última segunda-feira (2/9), o Hospital das Clínicas da Universidade Federal de Goiás (HC-UFG) deu início a uma programação especial dentro da campanha Setembro Amarelo. As atividades, que vão até o dia 24 deste mês, têm como objetivo promover a conscientização sobre a prevenção do suicídio, incentivando a discussão aberta sobre saúde mental, desestigmatizando o tema e fornecendo informações e recursos que capacitem indivíduos e comunidades a reconhecerem sinais de sofrimento, buscarem ajuda e oferecerem apoio.

Nesta entrevista, a médica residente em psiquiatria do HC-UFG, Isabela Lôbo, fala sobre a importância da saúde mental na prevenção ao suicídio.

 

Qual a importância da saúde mental para a prevenção do suicídio?

Existem inúmeros fatores que corroboram para que a saúde mental seja um componente-chave para a prevenção do suicídio – e isso envolve não apenas o tratamento e apoio para aqueles indivíduos que estão em risco, mas também esforços para promover a saúde mental e o bem-estar para toda a população. Fatores como a identificação de riscos, tratamento e manejo precoce, desenvolvimento de resiliência, redução do estigma, suporte social e educação e conscientização sobre sinais de alerta e comportamentos de risco são alguns dos motivos pelos quais investir na saúde mental é crucial para prevenir o suicídio.

 

Quais as práticas/hábitos que uma pessoa precisa desenvolver/manter para ter mais saúde mental

Para desenvolver e manter a saúde mental em dia é importante adotar práticas que promovam o bem-estar emocional, psicológico, físico e social. Alguns pontos importantes – e já bem conhecidos e estabelecidos – para que isso aconteça são: praticar atividades físicas, cuidar da alimentação, manter uma rotina adequada de sono, desenvolver habilidades de enfrentamento (técnicas de gerenciamento de estresse, como meditação, respiração profunda, mindfulness), engajar-se em atividades prazerosas, manter relações saudáveis, limitar o uso de substâncias e, acima de tudo, buscar ajuda profissional quando necessário.

 

O uso excessivo de tecnologias e redes sociais é um obstáculo à saúde mental? Se sim, por que?

Sim! O uso excessivo de tecnologias, em especial, das redes sociais, pode ser um obstáculo à saúde mental por inúmeros fatores. As comparações incentivadas pelas redes, a ansiedade gerada pela pressão de estar sempre conectado e sempre produtivo, a exposição constante a conteúdos “ansiogênicos”, as perturbações do sono, o isolamento social (apesar de aparentemente paradoxal, já que as redes foram criadas com o intuito de nos aproximar/conectar mais uns aos outros) e o ciberbullying são apenas algumas das várias razões para isso. A autorregulação com a busca pelo equilíbrio entre as interações virtuais e as reais pode ajudar a mitigar esse impacto negativo.

 

O que uma pessoa deve fazer se começar a ter ideações suicidas?

Não preciso e nem posso me delongar nessa resposta: buscar ajuda de um profissional qualificado para lidar com essa demanda – idealmente, de um profissional da saúde mental (psiquiatra e/ou psicólogo).

 

Pesquisadores afirmam que a pessoa que atenta contra a própria vida não quer necessariamente acabar com a vida, mas sim com a dor. Como aprender a lidar com as dores da vida sem chegar a esse extremo?

Buscar ajuda é sempre a melhor escolha, uma vez que o profissional bem capacitado será capaz de indicar estratégias específicas para cada caso, como a terapia e/ou o uso de medicação. Afinal, lidar com a dor da vida sem chegar ao extremo do suicídio é um processo complexo e multifatorial, que envolve desenvolvimento pessoal, apoio social e, muitas vezes, intervenção profissional. Algumas abordagens comportamentais individuais, entretanto, também podem ajudar a lidar com as dores da vida, como desenvolver habilidades de enfrentamento saudáveis (meditação, mindfulness, atividade física e expressões criativas são excelentes para isso); fortalecer o suporte social; desenvolver resiliência; estabelecer propósitos e objetivos; reconhecer sinais de alerta; praticar autocompaixão e evitar o isolamento. Reconhecer que há opções e ajuda disponíveis é crucial para superar os momentos difíceis e encontrar caminhos para uma vida menos dolorosa e mais significativa.

 

Leia as outras matérias da série "Por uma vida que vale a pena viver":

Redes sociais podem vender a ilusão de soluções fáceis
Teatro, atenção plena e educação sexual na regulação emocional
Saúde mental: ficção, fato e algoritmo

 

Se você ou alguém que você conheça estiver se sentindo vulnerável, entre em contato com algum dos serviços:

- Disque 188 (Centro de Valorização da Vida)
- (62) 3209-6243 (Programa Saudavelmente UFG)
- (62) 3209-6298 (Centro de Psicologia da UFG)
- (62) 3434-0496 (Rede de Psicologia)
- psymeetsocial.com (terapia com valores acessíveis)

Fonte: Secom UFG

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