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Universidade Federal de Goiás

Entrevista: Livro propõe ética para o desenvolvimento baseado em sustentabilidade e responsabilidade

Em 12/09/13 11:51. Atualizada em 24/11/14 14:13.

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Publicação da Assessoria de Comunicação da Universidade Federal de Goiás 
ANO VII – Nº 61 – AGOSTO – 2013

Entrevista: Livro propõe ética para o desenvolvimento baseado em sustentabilidade e responsabilidade

Texto: Erneilton Lacerda | Foto: Carlos Siqueira

 

Professora na Faculdade de Informação e Comunicação (FIC) da Universidade Federal de Goiás (UFG), a jornalista Divina Eterna Vieira Marques lançou recentemente o livro Responsabilidade e sustentabilidade: uma ética para o desenvolvimento. Resultado de sua tese de doutorado em Ciências Ambientais pela UFG, o livro enfoca o descompasso entre o desenvolvimento tecnológico e as ciências humanas e, principalmente, a ética. Em entrevista concedida ao Jornal UFG, a autora explica suas motivações e inspirações ao escrever sua tese.

Divina Eterna Vieira Marques

Em seu livro, a senhora afirma que o desenvolvimento tecnológico vivido pelo homem contemporâneo não foi acompanhado pelas ciências humanas, especialmente em relação a alguns conceitos mais difundidos, como a ética. Por quais razões a senhora chegou a tal constatação? Se possível, cite um exemplo.

Podemos citar um exemplo bem simples e atual: a internet e os crimes relacionados ao meio virtual. Os crimes cometidos por meio da internet começaram a ser tipificados recentemente. Pode-se dizer que houve um avanço tecnológico para o qual o Estado não estava devidamente equipado, nem o cidadão devidamente orientado ou amparado. Outro exemplo: os organismos geneticamente modificados (OGMs). Os produtos obtidos com as experiências genéticas na agricultura não vieram acompanhados com a garantia de que não há perigo para o equilíbrio dos ecossistemas, nem há a garantia da segurança alimentar. Um terceiro bom exemplo é a energia nuclear que pode ser usada para fins bélicos ou não. O problema não é a evolução tecnológica, não é o progresso da ciência, isto pode ser uma bênção. O problema é o uso que se faz desse conhecimento e dessa tecnologia.

Caberia dizer que carecemos de uma ética contemporânea? O que seria a ética nesse mundo ou qual o lugar da ética nesse contexto?

A ética é algo prático, que significa respeitar o outro ser, seja ele homem ou natureza. São hábitos que se repetem até tornar-se costumes. Então, quando esse costume passa a ser desrespeitado, a prática de um ato bom, que poderia ser algo natural, passa a ser regida pela lei. De início, as faixas de pedestres eram um hábito de respeito aos pedestres que precisavam atravessar a rua. Na medida em que esse hábito não virou um costume, foi necessária a intervenção da lei por meio das multas aos infratores. Podemos concluir que uma legislação ampla e detalhada é também o sinal de que a lei vem acudir os espaços em que a ética não foi respeitada. Mas, se nem a lei vem sendo respeitada no Brasil – e estou falando de corrupção, de impunidade, da falta de respeito aos direitos do cidadão, da violência –, como é possível falar de ética sem questionar o cumprimento da própria Constituição? Para muitos dos problemas que enfrentamos hoje bastaria uma única frase: “cumpra-se a lei”. Quanto à ética contemporânea, considerando-se as novas tecnologias, continuo defendendo a ética da responsabilidade, conforme conceituada por Hans Jonas, no sentido de “cuidar de”. Mas existem outras que poderiam e deveriam ser praticadas na contemporaneidade, como a ética da solidariedade, proposta por Karl Otto Appel, ou a ética do respeito universal e igualitário, defendida por Ernst Tugendhat.

O aquecimento global é tratado como “ameaça real”, em Responsabilidade e sustentabilidade: uma ética para o desenvolvimento. Porém, nos dias de hoje, já não é mais tão comum se ouvir falar do aquecimento global como há alguns anos. A que se pode atribuir essa suposta diminuição do interesse quanto ao assunto?

Acredito que nos últimos anos, especialmente em 2012, o aquecimento global foi pautado pela mídia por conta das previsões catastrofistas, que renderam filmes, livros, capas de revistas, manchetes, seriados etc. Mas, como o fim do mundo era uma lenda, o aquecimento global voltou a ser pautado apenas pelo meio científico, sendo ainda notícia na medida em que surgem novidades ou novas análises. Uma dessas está sendo aguardada para o dia 25 de setembro, quando o IPCC (Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas) se reúne em Estocolmo, Suécia, para divulgar um relatório parcial que trata dos impactos ambientais provocados pelas mudanças climáticas advindas do aquecimento global. Até agora foram publicados quatro relatórios completos, o último deles em 2007, sendo que o quinto, com a participação de 831 especialistas, 25 deles brasileiros, está agendado para o ano que vem. Criado pela ONU, em 1988, o IPCC reúne cientistas de diversos países para avaliar as investigações existentes. Eventualmente, surgem opiniões divergentes no mundo científico quanto aos resultados apresentados, que geralmente se limitam às proporções dos índices constatados. Ou seja: que o aquecimento global vem sendo intensificado pelas ações do homem é um fato, as proporções das consequências disso é que podem ser questionadas. O Brasil, por exemplo, conforme matéria publicada na Revista Pesquisa da FAPESP, deste mês de agosto, deverá ficar ao menos três graus centígrados mais quente até o final do século.

A senhora afirma em seu livro que “o agir humano na era tecnológica impõe novos limites porque agora as ações do homem têm uma outra dimensão”. Diante disso, qual o papel da bioética, a ética da vida?

Essa nova dimensão está relacionada ao poder ilimitado proporcionado pelo desenvolvimento tecnológico, uma dimensão inclusive planetária que coloca a biosfera sob a responsabilidade do homem. Além das criações que amplificam o poder de destruição, estamos falando do mau uso dos recursos naturais, da poluição, entre outros problemas, que podem ser dirimidos com alternativas viáveis e inteligentes já disponibilizadas e que vem sendo, paulatinamente, adotadas. São escolhas que se faz por conscientização, por questões econômicas e até por medo do que virá acontecer no futuro. Mas, não são apenas os problemas práticos que estão a desafiar o homem, as questões existenciais adquiriram contornos diferentes, inusitados, um desafio talvez ainda maior. A bioética emerge deste cenário como uma ética para o enfrentamento dos problemas emergentes da pós-modernidade, tendo em vista a vida, seja ela do homem, dos animais, da natureza ou a relação entre eles. Isto implica em questionar o sentido e o valor da própria vida. Viver e deixar viver é um bom começo.

Qual é a melhor conclusão/ contribuição do seu trabalho, em nível pessoal e profissional?

No nível pessoal, a satisfação de ver que as reflexões sobre os problemas do meio ambiente estão, cada vez mais, ocupando espaço nas pesquisas e na mídia. No nível profissional, posso dizer que o trabalho vem repercutindo, gerando minicursos e dois núcleos livres, que foram criados e abertos à toda comunidade universitária: Comunicação, sustentabilidade e negócios e Ética em pesquisas com seres humanos. Este último foi inspirado em um curso feito por meio da Fiocruz, como continuação dos estudos desenvolvidos no doutorado.

Fonte: Ascom UFG

Categorias: entrevista ética sustentabilidade

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