Troca de experiências entre Brasil e Moçambique
Publicação da Assessoria de Comunicação da Universidade Federal de Goiás
ANO XI – Nº 70 – Março – 2015
Troca de experiências entre Brasil e Moçambique
Projeto visa fortalecer o laço de cooperação científica e acadêmica entre os dois países e auxiliar os camponeses da cidade turística Inhambane
Texto: Angélica Queiroz | Fotos: Missão Exploratória AULP
Projeto tenta substituir o turismo em detrimento à produção de alimentos com o manejo agroecológico para favorecer a economia local
Inhambane é uma cidade moçambicana turística, famosa por suas belezas naturais, mas desigual e extremamente pobre. Atentos a essa realidade, pesquisadores do Programa de Pós-Graduação em Geografia do Instituto de Estudos Socioambientais (Iesa/UFG) estão realizando, em parceria com a Universidade Eduardo Mondlane, de Moçambique, o projeto Sementes crioulas, quintais agroecológicos e cooperação popular: troca de saberes e experiências de economia criativa do Cerrado brasileiro e Savanas em Inhambane/Moçambique.
Financiado pela Capes, o trabalho tem como objetivo principal a troca de experiências entre o Cerrado brasileiro e a Savana moçambicana, dois biomas que estão sofrendo os impactos da agricultura extensiva e utilização de agrotóxicos. Além disso, a iniciativa visa consolidar parceria entre a UFG e a Universidade Eduardo Mondlane, propiciando, assim, novas pesquisas e mobilidade de multiplicadores, estudantes e pesquisadores.
Em Moçambique, as mulheres são as maiores responsáveis pela agricultura
“Algo impressionante, reluzente e comovedor é a força da mulher moçambicana. Além de parir muitos filhos, de trabalhar na terra, colher, vender, cuidar das prendas domésticas, ela cuida da vida espiritual. Os deuses por lá não são de brincadeira. Eles são sentinelas da luz e da sombra. As mulheres suam o cheiro da terra e exalam o perfume da vida.”
(Eguimar Felício Chaveiro)
Projeto estimula o uso de sementes crioulas entre agricultores locais
FOME E DESPERDÍCIO
O trabalho de cooperação espera estimular a produção de alimentos a partir do manejo agroecológico, dispensando as sementes transgênicas, os pacotes de agrotóxicos das grandes empresas e ajudando os camponeses locais a encontrarem mercados consumidores para seus alimentos.
“O turismo em Inhambane é elitista e não tem ligação com a produção local. Tudo é importado e praticamente não existe mercado interno. Em um país que passa fome às vezes ocorre desperdício”, relata o coordenador do projeto e professor do Iesa, Eguimar Felício Chaveiro. O professor afirma que espera, com o projeto, contribuir para que os camponeses tenham mais condições de produzir alimentos saudáveis, valorizando a cultura e os conhecimentos locais e buscando mercados consumidores como forma de apoiar a economia solidária.
De acordo com o professor do Iesa, uma das intenções da equipe da UFG é motivar a universidade moçambicana a intervir por meio da pesquisa na criação de alternativas para o desenvolvimento local. “Vamos propor, com base na experiência que possuímos no Brasil Central com populações tradicionais camponesas e quilombolas, com as sementes crioulas e os quintais agroecológicos, intervenções para potencializar a integração entre turismo e produção local sobre mediação da universidade”, detalha.
Momento de confraternização entre brasileiros e moçambicanos em Inhambane
“UMA LIÇÃO DE VIDA”
Em agosto de 2014, duas bolsistas da UFG estiveram em Inhambane/Moçambique: a doutoranda do Programa de Pós-Graduação em Geografia, Ana Carolina Marques, e a graduanda em Jornalismo, Palloma Biasi. O plano de trabalho das bolsistas envolveu a troca de saberes com as comunidades e a coprodução de um documentário com camponesas, já que em Moçambique a agricultura é desempenhada, em sua maioria, por mulheres.
Segundo Ana Carolina Marques, a riqueza cultural do país é contagiante. Moçambique tem mais de 100 línguas locais, praias belíssimas, técnicas vernáculas seculares de construção civil, culinária original e uma grande diversidade religiosa. A bolsista, que também ministrou a disciplina de Turismo Rural na Escola Superior de Hotelaria e Turismo da Universidade Eduardo Mondlane, afirma que essa foi uma oportunidade ímpar, tanto no âmbito pessoal, quanto no acadêmico.
“Uma nação como essa, de tal geografia, história, economia, política, línguas, crenças, rituais e valores nos dá uma lição de vida. Primeiramente, por representar a diversidade tão cara a esse modelo civilizatório que predomina mundialmente; segundo, por causar em seus visitantes o incômodo questionamento sobre o sentido e a sustentabilidade desse mesmo modelo ocidental de desenvolvimento que alimentamos diariamente”, reflete.
Ana Carolina Marques relata que os primeiros dias em Moçambique, junto à equipe brasileira composta por nove pesquisadores, entre professores e estudantes, voltaram-se à realização da pesquisa exploratória que já está gerando artigos e relatórios de pesquisa. “Percorremos vilas, aldeias rurais, cidades, entre elas a capital Maputo e frequentamos feiras, escolas rurais, associação de agricultores, praias e estabelecimentos turísticos”, lembra.
Nessa etapa do projeto, a equipe da UFG também realizou oficinas, minicursos e um estágio de vivência com uma agricultora e feirante do município de Inhambane, dona Albertina, experiência que resultou no documentário O mundo da machamba: produção e gênero em Inhambane/Moçambique, disponível em breve.
“Em Inhambane todos falam do Brasil, dos Estados Unidos e da Europa. Os carros vem do Japão, a maionese da África do Sul, o frango é brasileiro, o café é português e o biscoito é chinês. E nós, brasileiros, o que conhecemos da África? Safari e pobreza. Assim como o Brasil se resume a futebol e carnaval. Queremos contribuir para um Brasil melhor informado, sensível aos problemas do mundo e, sobretudo, um Moçambique melhor”, completa a doutoranda.
Nesta Edição
Fonte: Ascom UFG
Categorias: Moçambique Pesquisa IESA