Movimentos estudantis do passado e do presente
Publicação da Assessoria de Comunicação da Universidade Federal de Goiás
ANO VII – Nº 60 – JULHO – 2013
Movimentos estudantis do passado e do presente
Texto: Erneilton Lacerda | Fotos: Carlos Siqueira e Arquivo pessoal do professor Romualdo Pessoa
Os movimentos populares que tomaram as ruas de diversas cidades brasileiras nos meses de junho e julho de 2013 expuseram a união de diversos setores da sociedade em busca de resposta para suas demandas. O movimento estudantil foi um dos segmentos da sociedade que mais contribuiu no engendramento de uma mobilização nacional e, ademais de pleitear uma pauta própria, como a reivindicação do passe livre estudantil, foi além e compartilhou as reivindicações da população.
Em entrevista para o Jornal UFG, o professor de Geopolítica no Instituto de Estudos Socioambientais (IESA) da UFG, Romualdo Pessoa Campos Filho, relaciona a sua época no movimento estudantil com os dias atuais. Entre os anos de 1984 e 1986, ele foi diretor da União Nacional dos Estudantes (UNE) e atualmente é membro da Comissão de Altos Estudos do Memórias Reveladas do Centro de Referência das Lutas Políticas no Brasil (1964-1985), vinculada ao Arquivo Nacional. Confira.
De que maneira o senhor avalia a atual conjuntura dos movimentos estudantis dentro da Universidade Federal de Goiás?
O movimento estudantil passou por um período de retração. Natural se considerarmos a conjuntura e quais influências culturais afetaram as gerações nascidas depois da década de 1980 e, principalmente, na década de 1990. A última década do século XX foi marcada pela ascensão de pensamentos conservadores e por uma globalização sustentada ideologicamente por valores neoliberais, individualistas e focados na formação competitiva, tendo em vista a necessidade de se qualificar para o mercado. O momento atual difere substancialmente daquele, porque vivemos uma crise de graves proporções que afeta o sistema capitalista e deixou desnorteados os que se guiaram por valores neoliberais. A juventude não permanece por muitas gerações sem se manifestar fortemente. Mas é necessário considerar que, se aqui no Brasil isso está acontecendo agora, na Europa, Estados Unidos e mesmo na América Latina (Chile) isso já acontece faz muito tempo. A UFG também se insere nesse contexto. O movimento estudantil permaneceu sem bandeiras que convencessem os estudantes a se mobilizarem. O discurso radical de alguns grupos não encontravam espaços em meio à uma geração que tinha outras expectativas. Mas os últimos acontecimentos não significam, necessariamente, uma retomada das características passadas do movimento estudantil. Algumas mudanças que aconteceram nessas últimas décadas moldaram a juventude a outras perspectivas. A despolitização e a aversão a partidos e aos movimentos sociais é a principal delas, demonstrando uma crescente elitização na visão de mundo.
Entretanto, uma reivindicação específica, ligada à uma luta antiga pela qualidade no transporte coletivo, começou lentamente a despertar uma pequena vanguarda que está se reaglutinando em torno das entidades estudantis. Contudo, não significa ainda a retomada necessária do movimento estudantil, porque isso só acontecerá quando os Centros Acadêmicos, base fundamental desse fortalecimento, estiverem devidamente organizados e envolvendo os estudantes de cada curso. Embora o Diretório Central dos Estudantes (DCE) esteja participando nas coordenações e procurando mobilizar os estudantes, não se percebe nisso um fator ligado à força dessas entidades. A presença de grupos, quase sempre oriundos da classe média, com concepções anárquicas, portanto, avessos a aceitar uma direção e submeter-se às organizações, dificultam essa retomada. Tal comportamento, aparentemente avançado, mas em essência conservador, impede o fortalecimento de uma vanguarda, elemento essencial para manter o movimento coeso e ascendente.
O senhor entende que essa conjuntura é sinal de evolução ou de retrocesso?
Inegavelmente, há um retrocesso quando analisamos a capacidade que tínhamos de mobilizar os estudantes com objetivos políticos definidos, reivindicações praticamente aceitas por todos, com raras exceções, e um nível bem mais elevado de politização.
Qual a sua perspectiva quanto ao funcionamento dos Centros Acadêmicos dentro da Universidade Federal de Goiás?
Os Centros Acadêmicos são sustentados pelos alunos dos dois primeiros anos, principalmente. Mas sua politização, que pode dar mais força e coesão nas lutas, será tanto maior quanto for mais fortalecido o movimento nas escolas de ensino médio. Esse fortalecimento será possível quando parte dessa juventude de secundaristas, que se manifesta nas ruas, entrarem nas universidades. É um processo que demanda mais de uma geração e que depende da formação política para que seja concretizada. Se prevalecer a aversão aos partidos e às organizações sociais, o que poderemos ter é a formação de uma geração conservadora que poderá ser envolvida por grupos conservadores e até mesmo fascistas.
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