Lei dos resíduos sólidos ainda é descumprida
Publicação da Assessoria de Comunicação da Universidade Federal de Goiás
ANO VII – Nº 67 – Setembro – 2014
Lei dos resíduos sólidos ainda é descumprida
A ausência das práticas previstas em lei evidencia obstáculos à destinação adequada do lixo. Em Goiás, a UFG atua na elaboração de planos ambientais e em projetos de inserção social
Texto: Silvânia Lima | Fotos: Caslos Siqueira, Thamara Fagury e divulgação
Em dezembro de 2010, o Brasil comemorou a regulamentação do Decreto-Lei 12.305, que estabelece as diretrizes para a Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS). Resultante de mais de 20 anos de discussões, o desafio posterior tem sido fazer valer a lei, que inova em sua concepção e abrangência, da qual se destacam quatro exigências básicas: a erradicação dos lixões, a elaboração do Plano Municipal de Resíduos Sólidos, a inserção social dos catadores de lixo e a logística reversa, que impõe à indústria o aproveitamento das sobras e dos resíduos.
Eraldo Henriques de Carvalho
Algumas medidas dessa natureza já eram previstas em outras leis e instruções normativas, como a Lei do Saneamento Básico, mas havia necessidade de uma lei própria que abrangesse toda a cadeia que envolve os resíduos sólidos. De acordo com o professor Eraldo Henriques de Carvalho, coordenador do Núcleo de Resíduos Sólidos e Líquidos, ligado à Escola de Engenharia Civil da UFG, “a Lei 12.305 é mais específica e contempla políticas do primeiro mundo, seguindo uma tendência mundial das políticas dos resíduos sólidos”.
Fim dos lixões? A questão política
Ao ser aprovada a PNRS, foi estabelecido o prazo de quatro anos para que os municípios brasileiros dessem fim aos depósitos de lixo sem tratamento adequado, sob pena de responderem por crime ambiental. Esse prazo foi encerrado no último dia 3 de agosto. Esse e outros assuntos relacionados aos resíduos sólidos em Goiânia motivaram o Café com Políticas Públicas, evento da Faculdade de Ciências Sociais (FCS), realizado no mês de julho. Entre os palestrantes estava Pedro Henrique Baima Paiva, analista ambiental da Agência Municipal do Meio Ambiente (Amma), com larga atuação em fóruns ambientais no município e fora dele, como na Câmara Técnica de Qualidade Ambiental e Resíduos Sólidos, do Conselho Nacional de Meio Ambiente (Conama), que destacou os entraves à aplicação da lei. “Apesar de possuirmos tecnologias suficientes para a destinação adequada do lixo, poucos municípios conseguiram eliminar os lixões, a maioria sequer possui um Plano Ambiental”, afirmou Pedro Henrique Baima, apontando esse como um dos reflexos da falta de políticas públicas para o setor. Ele salientou ainda o despreparo das administrações públicas, geralmente providas de poucos técnicos e que não ocupam os cargos de decisão.
Pedro Henrique Baima
Entraves e soluções – Pedro Henrique Baima foi enfático ao afirmar que os “resíduos sólidos constituem uma questão estratégica de saúde pública para qualquer governo”. Mas isso ainda não condiz com a realidade brasileira, cuja ínfima parte dos cerca de 5.500 municípios possui aterro sanitário. Em Goiás, dos 246 municípios, apenas oito possuem licença ambiental: Anápolis, Aparecida de Goiânia, Bonfinópolis, Catalão, Campo Alegre de Goiás, Hidrolândia, Itarumã e Turvânia. Eraldo Henriques de Carvalho também ressaltou o entrave político: “Em geral, observa-se que ocorre um descaso, além da falta de técnicos, alguns municípios alegam falta de recursos para as medidas necessárias, denunciando a falta de planejamento”.
Perguntado sobre o que deve ocorrer com os municípios que não cumpriram o prazo para dar fim aos seus lixões, Eraldo Henriques de Carvalho opina que prorrogar o prazo para a aplicação da lei não adiantaria. Ele acredita que “tem que haver ações mais efetivas para mudar o cenário – que permanece o mesmo – do tratamento dado aos resíduos sólidos no Brasil”.
Fernando Bartholo
A atitude – O coordenador da Incubadora Social da UFG, Fernando Bartholo, ressalta outro obstáculo importante às soluções do descarte do lixo: o fator cultural, traduzido por crenças, comportamentos e atitudes presentes em todos os segmentos sociais. Segundo ele, a “cultura do lixo” vigente considera que lixo é tudo que deve ser descartado, sem maiores preocupações, o importante é se livrar dele, o que leva e reforça a cultura da terceirização, em que “o problema” é delegado a outros, eximindo responsabilidades. Em verdade, toda essa discussão em torno do lixo envolve também o abastecimento de água, a drenagem das águas pluviais e o tratamento do esgoto, questões imprescindíveis às políticas públicas ambientais.
Cata Sol contribui para a inclusão
Antecipando-se à lei e buscando oferecer um suporte técnico aos municípios interessados na inclusão dos seus catadores de lixo, desde 2012, a Incubadora Social da UFG mantém o projeto Catadores Solidários (Cata Sol). Com o apoio da Secretaria Nacional de Economia Solidária, do Ministério Público e da própria UFG, em parcerias com as prefeituras, o projeto contribui na implantação e no assessoramento da coleta seletiva, da incubadora social local e de cooperativas de catadores nos municípios. Atualmente, o Cata Sol assiste oito municípios da região metropolitana de Goiânia, a previsão é que sejam 16 até o final de 2016. Com metodologia de trabalho diferenciada, privilegiando a prática dos envolvidos, sua realidade e seus interesses, o projeto é executado por docentes e acadêmicos da UFG.
UFG e o Plano Estadual Ambiental
Os planos ambientais, da União e dos Estados, previstos na Lei 12.305 estão em construção. A UFG cuida do Plano Estadual de Resíduos Sólidos do Estado de Goiás, sob coordenação dos professores Simone Pfeiffer e Eraldo Henriques de Carvalho, com o envolvimento do núcleo de estudos da área, na Escola de Engenharia Civil, e da Secretaria Estadual do Meio Ambiente e Recursos Hídricos. O documento, de caráter orientador, reúne uma série de propostas integradas de gestão e gerenciamento de resíduos sólidos em todo o Estado. Para Eraldo Henriques de Carvalho, o Plano Estadual irá ajudar muito os municípios goianos, ao traçar o panorama geral, apontando as áreas mais críticas, orientando e sugerindo medidas, como os aterros consorciados, que permitem o compartilhamento entre municípios quanto ao destino adequado de seus resíduos.
Goiânia no contexto do lixo
Nos últimos meses, a capital goiana – que ainda não possui a licença ambiental prevista na PNRS – tem sofrido problemas com a coleta do lixo. A coleta seletiva também foi prejudicada pela falta de recolhimento dos materiais que abastecem as cooperativas de catadores. Em palestra, realizada no evento da FCS, o professor Francisco Mata (FSC) indagou sobre os investimentos públicos goianos para os resíduos sólidos. Ele lembrou do acidente radioativo com o Césio-137, um dos maiores do mundo, ocorrido em Goiânia, em 1987. “O que aprendemos com o Césio-137? Quanto o Estado tem gasto com políticas públicas para essa área?”, questionou, instigando ainda a plateia acadêmica sobre a existência ou não de mecanismos definidos para avaliação do quadro e de pesquisas.
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Categorias: Lixo Decreto-Lei 12.305 Políticas Públicas Incubadora Social
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