Apoio e orientação ao aluno com altas habilidades
Apoio e orientação a alunos com altas habilidades
Projeto de extensão Alfa Azul, desenvolvido no Cepae UFG, oferece atendimento especial e contribui para inclusão de estudantes com capacidade acima da média
Texto: Angélica Queiroz | Fotos: Deley Santos
Sandra* tem 17 anos e é estudante do 2º ano do Ensino Médio no Centro de Ensino e Pesquisa Aplicada à Educação (Cepae/ UFG). Sandra é artista e desde pequena se interessa pelas artes visuais. No Cepae teve a oportunidade de pintar em telas de verdade, com cavalete e tudo. Uma foto da pintura em parede, feita pela aluna como atividade extraclasse foi, inclusive, exposta na Bienal de Arte do Rio de Janeiro. “Fiquei radiante quando soube, foi muito gratificante”, conta emocionada.
Há um ano Sandra participa do Programa Alfa Azul, projeto de extensão desenvolvido no Cepae que oferece ambiente suportivo, carinho e atenção a alunos com alguma capacidade acima da média. Segundo o professor que coordena o projeto, Wanderley Alves dos Santos, estima-se que apenas na escola pública, existam cerca de seis milhões de talentos não identificados, em diversas áreas.
“A presença do estudante talentoso na educação básica é uma realidade. Esse aluno pode e deve desenvolver seu potencial, orientado e incentivado pelos educadores”, explica o professor. Ele lembra que o atendimento especial a esses alunos é um direito garantido por lei, mas que, infelizmente, há uma desatenção por grande parte das escolas e dos docentes. “Muitas vezes por desinformação ou falta de capacitação dos profissionais”, detalha.
Facilidade pode ser confundida com arrogância
Wanderley Alves leciona no Cepae há 18 anos. O especialista em Arteterapia percebeu que o tema altas habilidades recebia pouca atenção dos profissionais da área e, por isso, resolveu pesquisar o assunto. Em 2004, o professor desenvolveu uma pesquisa sobre a Arteterapia como ferramenta de apoio ao portador de alta habilidade no Cepae, trabalho que lhe rendeu uma bolsa internacional para estudar o tema na Universidade de Vigo, na Espanha.
“Há uma incompreensão do objeto de estudo. Muitos acreditam que fazer essa diferenciação é uma forma de preconceito, mas não é. As pessoas são diferentes. Não podemos desperdiçar talento”, opina o especialista. Ele conta que alguns professores confundem o interesse profundo e a facilidade do aluno em determinada área com arrogância. “Acham que o estudante está querendo saber mais que ele e não o ajudam”, lamenta.
Pintura em parede é um das atividades extraclasse
Wanderley Alves, coordenador do Projeto Alfa Azul
Talento pode se tornar problema
Por pensar e sentir de forma diferente, alunos acima da média podem ter dificuldades de sociabilização, sentindo-se deslocados e incompreendidos. O coordenador do programa explica que, na maioria das vezes, por não se sentirem incluídos, estudantes talentosos acabam isolando-se e têm maior tendência a se envolver com álcool e drogas. “Se não acompanhado e incentivado, o talento pode se tornar um problema para a sociedade”, afirma o professor.
Por isso, Wanderley Alves destaca a importância desses alunos receberem educação inclusiva. “Eles precisam ser compreendidos e ter acesso a uma educação diferenciada e sistematizada para desenvolverem seu potencial. Se você reconhece que o aluno tem um talento e trabalha a autoestima dele, isso reflete também em outras áreas”, explica Wanderley Alves, que acredita que ações como as do Programa Alfa Azul previnem e redirecionam as dificuldades de forma positiva.
Embora alguns autores considerem algumas diferenças entre os termos, Wanderley Alves considera que eles são apenas uma pluralidade terminológica para dizer uma coisa só: que a pessoa tem alguma capacidade acima da média
Alunos com habilidades acima da média participam de atividades de apoio, como monitoria e oficinas especiais
Professor tem papel fundamental
Em algumas situações, a alta habilidade em determinada área, pode significar dificuldade em outras. Para Wanderley Alves, é muito importante que os docentes encarem o tema dessa forma, pois o professor tem papel fundamental no desenvolvimento desse aluno. “A alta habilidade pode estar mascarada no mau comportamento, porque há um descompasso. Por isso o professor precisa estar capacitado para identificar essa capacidade acima da média”, alerta.
Dentro do Programa Alfa Azul, os alunos identificados com alguma capacidade acima da média são observados de perto e participam de atividades de apoio, como monitoria, atividades extras e oficinas especiais organizadas para atender aos interesses específicos. “Assim otimizamos suas capacidades cognitivas diante de novas e criativas oportunidades oferecidas”, relata. Os pais também são contatados, recebendo orientação e material didático de apoio para trabalharem como aliados do professor – o projeto já possibilitou o lançamento de um livro e um vídeo didático.
No Cepae, Wanderley Alves é o único especialista no assunto, mas conta com o apoio de alguns colegas docentes e até de estudantes para identificar alunos com “indicativo” de altas habilidades. Nas áreas de artes visuais, Wanderley Alves presta orientação específica, mas, mesmo nas outras áreas, atua indiretamente, conversando com esses alunos e dando apoio psicológico e emocional que, segundo ele, em grande parte dos casos, é o que eles mais precisam.
A luta do especialista agora é para conseguir ganho acadêmico para os alunos que se destacam, fazendo com que eles possam avançar fases, cursando disciplinas de turmas mais avançadas. Hoje alguns alunos já podem frequentar aulas de outras turmas, mas apenas como ouvintes, tendo que cursar a disciplina novamente depois. Wanderley Alves também almeja fortalecer a discussão e conseguir mais apoio dos colegas, não só no Cepae, mas em outras escolas do país.
Meninas têm mais dificuldades
Wanderley Alves destaca que as meni- nas apresentam ainda mais barreiras que os meninos por causa do machismo ainda predominante que faz com que, muitas vezes, elas se anulem e escondam seu talento. Por isso, o professor dedica várias de suas pesquisas especialmente a elas. “O talento feminino, historicamente desfavorecido, deve ser especialmente atendido”.
Com o talento reconhecido e sentindo-se incluída, Sandra não faz mais parte desse universo de mulheres que mascaram suas habilidades. Ela está desenvolvendo seu talento e já sabe o que quer ser quando crescer: professora de artes no Cepae, lugar onde se sentiu incluída e teve a chance de se aperfeiçoar e crescer.
Comissão de Inclusão
O Cepae tem uma Comissão de Inclusão que desenvolveu e desenvolve importantes trabalhos, como a aquisição de um elevador de acessibilidade, rampas e projetos de apoio para alunos com Síndrome de Down e dificuldades de aprendizagem. Atualmente, os esforços do grupo estão focados em montar uma sala de recurso para atendimento em educação especial.
Quando era membro da Comissão, Wanderley Alves dos Santos desenvolveu o trabalho de orientação para professores e interessados em Altas Habilidades. Na ocasião, cerca de 400 professores da rede pública participaram da capacitação em um minicurso sobre o tema Altas Habilidades, com a professora da Universidade Federal de Lavras, Zenita Guenther, autoridade mundial na área.
* Sandra é um nome fictício.
Nesta Edição